Analistas do mercado financeiro preveem que a Selic, taxa básica de juros do País, vai terminar 2019 abaixo dos 6% ao ano – há três anos, estava em 14,25%. Uma mudança desse tipo, não importa em qual país, provoca uma migração de ativos, diz Paulo Colaferro, vice-presidente da Associação Brasileira de Planejadores Financeiros (Planejar).

A partir de agora, para ver o patrimônio crescer sem correr risco, só gastando menos do que ganha, afirma. “Daqui para a frente, se exige mais inteligência e mais especialização para ter retornos interessantes.” Leia os principais trechos da entrevista.

O que muda no planejamento do investimento com juros básicos menores?

Quanto menor a taxa de juros, mais se vai exigir técnicas para montar uma alocação. É preciso sofisticar, no sentido de cada vez mais ir para a economia real: ter mais renda variável, ir a fundos com autonomia maior, como os multimercados, olhar para private equity (investimento em empresas fechadas), crédito privado. Isso acontece em qualquer economia. No Japão, se você colocar um juro real bom e sem volatilidade, com o risco do Tesouro japonês, todo mundo tira o dinheiro da Bolsa e vai investir nele. Nos EUA, se você pegar os períodos em que a taxa de juros era de 7%, a maioria dos portfólios estava pouco diversificada. Daqui para a frente se exige mais inteligência, mais qualificação, mais especialização para ter retornos interessantes. O mais importante para o investidor é segurar a ansiedade e entender qual a classe de ativos em que ele vai investir, como funciona, qual a volatilidade histórica. É importante que se perceba que risco e retorno são proporcionais: se posso ganhar muito, também posso perder muito. A grande dificuldade, uma vez que se monta uma estratégia, é se manter nela nos momentos de volatilidade.

É possível fazer o planejamento por conta própria?

Se não contar com um gestor profissional, é melhor ficar o mais conservador possível. A pessoa pode ser muito conservadora e ter sucesso financeiro e patrimonial. Se gastar muito menos do que ganha, pode ter sucesso. E isso depende de três pilares: quanto consumo da renda gerada – se sou consumidor de renda ou gerador de poupança; quanto pago de imposto; e quanto o investimento rende. Se quer fazer uma coisa simples, não quer pensar nem contratar ninguém, tudo bem, não consuma seu rendimento nunca e tenha muito tempo para formar poupança. A maioria das pessoas passa a maior parte do tempo olhando quanto o dinheiro rende, algum tempo quanto paga de imposto e nenhum tempo para quanto está guardando ou consumindo do patrimônio.

Quais são os obstáculos na migração para ativos mais voláteis?

O caminho mais seguro seria buscar uma formação para entender economia e os canais de investimento. Hoje há inúmeros cursos online gratuitos, mas o problema é que as pessoas têm muita ansiedade, vão pegar um tutorial do tipo ‘Fique rico em 24h’. Querer colher os resultados muito depressa não se sustenta no longo prazo.

Ainda é preciso se proteger de uma possível volta da inflação?

É sempre importante, a conta do ganho real tem sempre de ser feita. Parece que devemos ter um longo período de inflação baixa. Mas quanto menor a inflação, menor é a taxa de juros, por isso, é importante acompanhar qual o juro real das aplicações.

É possível fazer um bom planejamento sem renda variável?

É pouco provável que você tenha retornos satisfatórios sem renda variável no portfólio. As pessoas me perguntam há 30 anos onde podem colocar o dinheiro sem precisar se preocupar. Sempre respondo: ‘Não sei, se você descobrir me fala que quero colocar meu dinheiro lá também’. Isso não existe, no Brasil, nos EUA, na Suíça, seja onde for.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.