Vagas especiais para veículos elétricos ocupam a área nobre de um estacionamento próximo ao aeroporto internacional de Guarulhos, em São Paulo. A ideia de deixar o veículo carregando na tomada enquanto o dono que viaja é ótima. Só que as vagas estão vazias. No Brasil, carros eletrificados são bem mais uma promessa que realidade. Menos de 0,2% do total das vendas corresponde aos elétricos, híbridos e plug-in (recarregáveis). Essa proporção muda radicalmente quando se leva em conta apenas a sueca Volvo, agora sob comando da chinesa Geely. O número é 100 vezes maior que a média nacional, e deve dobrar em breve (leia mais sobre elétricos aqui).

“A venda de híbridos da Volvo no Brasil passou de 8% em 2018 para 20% este ano — que era a meta para 2020, quando devemos atingir 40% de eletrificação”, comemora Luiz Rezende, presidente e CEO da Volvo Cars Brasil em entrevista exclusiva à DINHEIRO. Os modelos recarregáveis foram em grande parte responsáveis pelo crescimento da marca no mercado brasileiro, onde a participação quase dobrou no último ano.

Håkan Samuelsson, presidente e CEO do Volvo Cars Group: “Tratemos da sustentabilidade não porque isso é ‘bom’ ou esperado, mas porque é positivo para os negócios” (Crédito:Divulgação)

“O Brasil é um diamante em meu portfólio. É o único nos 22 países que administro onde a Volvo é mais premium que os alemães, do ponto de vista de mercado. Tenho muito orgulho disso. Somos número um em satisfação ao cliente há cinco anos”, comemora Anders Gustafsson, presidente e CEO da Volvo Cars USA, a quem Rezende responde diretamente. Ele recebeu a reportagem em um descolado bairro de galpões e artistas de Los Angeles, Estados Unidos, no lançamento do novo SUV XC 40 Recharge, o primeiro modelo 100% elétrico da marca.

Junto com a eletrificação, já prevista nas novas plataformas dos modelos da marca, toda linha Volvo passou por uma atualização em design e tecnologia, incorporando sistemas semiautônomos capazes de assumir o volante em algumas situações. “As plataformas já foram concebidas para serem eletrificadas. Outras marcas não pensaram assim, e estão gastando muito mais dinheiro na eletrificação”, diz Rezende. A atual ofensiva da Volvo é a dos carros 100% elétricos, dos quais o XC40 Recharge, que estreia ano que vem na Europa e em 2021 no Brasil, será o primeiro – e um novo modelo se seguirá a cada ano.

Com um motor elétrico em cada eixo, fornecidos pela Valeo, a potência total é de 413 cv, fazendo o SUV atingir 100 km/h em 4,9 segundos, marca digna de esportivos como o Chevrolet Camaro. Recharge, por sinal, passa a ser quase uma submarca, definindo todos os modelos eletrificados da marca, sejam os novos elétricos ou os híbridos plug-in que já estão à venda. Eles servem como uma espécie de “transição“ ou “treinamento” para os 100% elétricos. Carregados na tomada, podem rodar algumas dezenas de quilômetros sem usar o poluente e “primitivo” motor a explosão. No caso de distâncias maiores ou da falta de pontos para recarga, combinam o motor a gasolina com o elétrico, que pode ser carregado pelo primeiro e também com a energia das desacelerações e frenagens, garantindo que o proprietário chegue onde quiser, como acontece em um carro “comum”.

CADÊ O MOTOR? Exceto pela ausência da grade dianteira, o XC 40 Recharge é igual ao modelo a gasolina. Ao abrir o capô, a surpresa: em vez de motor, espaço para malas (Crédito:Divulgação)

Apesar de os carros elétricos ainda serem bastante caros no Brasil por causa da tecnologia empregada e das baterias, Rezende acredita que o governo fez sua parte: “Baixar o Imposto de Importação, o mais elevado do mundo, de 35% para 2%, e diferenciar IPI e ICMS foram grandes esforços. Em São Paulo, ainda há isenção de rodízio, outra vantagem: vemos clientes que tinham três carros e agora só têm dois, pelo menos um sendo híbrido.”

A investida da Volvo em veículos que não usem combustível fóssil é definitiva. “Decidimos afastar nossos engenheiros de motores a combustão, que passarão a trabalhar na nova joint venture com a Geely, para que a Volvo foque 100% na eletrificação e avancemos mais rápido. As baterias precisam melhorar e os carros precisam ficar mais competitivos para ganharmos dinheiro. Não basta ter boas ideias, é preciso ganhar dinheiro com elas”, diz Gustafsson. Para ele, a mudança é de responsabilidade de todos: “Se vocês têm filhos ou família, pressionem governos e empresas no caminho certo. De nossa parte, negociaremos com fornecedores, faremos mais elétricos e híbridos e daremos 12 meses de eletricidade grátis para consumidores dos Volvo Recharge. É uma atitude ousada, e sei quantos milhões estamos gastando nela para mudar o comportamento do consumidor. Afinal, da produção aos fornecedores, tudo está ligado. Não somos perfeitos, mas decidimos pagar a conta para seguir nesse caminho e conquistar clientes que ajudem a fazer as coisas do jeito certo.”

Um bonito discurso, mas Håkan Samuelsson, presidente e CEO do Volvo Cars Group, minutos antes, talvez tenha sido um pouco mais sincero quando apresentou o XC40 Recharge: “Tratemos da sustentabilidade não porque isso é ‘bom’ ou esperado, mas porque é positivo para os negócios e nos fará crescer mais rápido e ficarmos mais fortes”.