Durante sua visita à China, oficialmente iniciada na segunda-feira 20 com a participação em um seminário na Bolsa de Valores de Xangai, o vice-presidente Hamilton Mourão sinalizou o interesse do Brasil em integrar a iniciativa bilionária do governo Xi Jinping para estimular o comércio mundial, apelidado de Nova Rota da Seda. Segundo o próprio general Mourão, “o Brasil não pode ser só uma loja onde a China vai comprar itens”. Não pode, mas tudo indica que continuará a ser.

O projeto lançado pela China em 2013 com o nome “One Belt, One Road” (em português, um cinturão, uma estrada) e depois encurtado para Belt and Road, prevê conectar a China com o resto do mundo a partir de uma rede de telecomunicação, ferrovias, estradas, portos e aeroportos. Daí a referência à Rota da Seda, o longo caminho que viabilizou as trocas comerciais e culturais entre o Oriente e o Ocidente desde a Antiguidade.

Segundo o governo chinês, já existem acordos de cooperação com cerca de 150 países e organizações internacionais. Uma vez concluída, a nova rota da seda tornaria a China hegemônica no comércio global, uma possibilidade que assusta os Estados Unidos e motiva a guerra de tarifas anunciada com alarde e números colossais por Donald Trump. A China é o maior parceiro comercial do Brasil há uma década e o volume de trocas vem crescendo.

Em 2018, as exportações brasileiras para lá somaram US$ 64,2 bilhões (cerca de R$ 262 bilhões, se o câmbio fosse o da semana passada). O número traduz uma alta de 35% sobre o ano anterior. O problema não é o quanto e sim o que a China compra do Brasil. Do total exportado em 2018, a soja respondeu por 43%, seguido de petróleo (22%) e minério de ferro (17%). Ou seja, apenas três commodities somam 82% das exportações brasileiras. Acrescentar novos itens a essa cesta é estratégico para o Brasil.

Só que não na cabeça de Jair Bolsonaro. Ainda candidato à presidência, ele postou na rede social Twitter um comentário que incomodou Xi Jinping: “A China está comprando não NO Brasil, mas O Brasil”, afirmou referindo-se aos investimentos chineses em terras, frigoríficos, hidrelétricas e portos brasileiros. Daí a importância da visita de Mourão e de seu discurso ambicioso. “As coisas que vêm do Brasil têm que ter o mesmo valor que as que vêm da China”, afirmou o general. Ampliar a participação de itens de maior valor agregado é urgente, mas o vice quer mais: “A economia do século 21 é a economia do conhecimento, esse é o passo adiante que temos que dar nessa relação”.

Entre os compromissos da agenda do general estava presidir a quinta reunião da Cosban, Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação, instituída em 2004. Para Mourão, está claro que, apesar do fanatismo que a família Bolsonaro nutre pelo chefe da Casa Branca, é com a China que o Brasil precisa se entender se quiser sair da estagnação econômica. Parte desse entendimento envolve provar aos investidores asiáticos que há oportunidades de lucro por aqui, especialmente no setor de infraestrutura. Mourão fez bem ao recusar a imagem de Brasil como uma lojinha para a China. Até porque há produtos nessas prateleiras que não estarão em estoque para sempre. Mas, se queremos exportar conhecimento, como sugere o vice-presidente, precisamos primeiro investir em conhecimento e não levá-lo a um apagão, como ameaça fazer o governo.