Roberto Justus mudou. Mas não no estilo. Sim, ele segue elegante, alinhado, com terno impecável e cabelo rigorosamente penteado. A mudança foi maior e bem mais significativa. Um dos maiores nomes da publicidade brasileira decidiu apostar no mercado financeiro. E não só como investidor, mas como dono de empresas de serviços financeiros. O empresário de 65 anos, que atuou por 36 anos no mercado publicitário, de 1981 a 2017, e em programas de TV – o mais marcante é o reality O Aprendiz – trabalha para transportar o mesmo sucesso para o novo segmento. O objetivo é claro: administrar grandes fortunas, como a sua, e investimentos em outras companhias para garantir retorno em um período de cinco anos. Nas quatro empresas que montou nos últimos três anos, ele espera fechar 2020 com gestão de R$ 6,2 bilhões. E chegar, até 2025, à audaciosa meta de R$ 60 bilhões de patrimônio sob gestão e custódia. “Sempre fui muito interessado no mercado financeiro, mas até sair da publicidade não imaginava que poderia atuar no setor e não ser só como cliente”, disse Justus à DINHEIRO. “Nesse mercado, é necessário credibilidade e performance. E é isso que queremos entregar.”

Na semana passada, Justus anunciou a mais recente empreitada, que foi avançar no mercado de criptomoedas. Ele passou a integrar o conselho consultivo da WiBX, uma plataforma de mídia digital com base em uma moeda do tipo utility token para divulgação de campanhas que usa como base usuários de redes sociais para aquisição de novos consumidores (leia mais à página 37). “Estou muito animado com as perspectivas e vou ajudar no varejo e na publicidade para que o modelo decole. E tenho opção de ficar sócio no futuro”, afirmou. Essa é a primeira investida do executivo no segmento de moedas digitais. “Nesse caso, a empresa está muito lastreada e os players são muito sérios”, disse. Com 150 mil usuários, o trabalho de Justus é fazer com a que WiBX chegue, até 2021, a 1 milhão de clientes.

Roberto Justus comandou o reality show o aprendiz durante nove edições. A próxima temporada será em Março, quando o candidato que vencer receberá R$ 1 milhão e a possibilidade de trabalhar por um ano em uma das empresas. (Crédito:Joao Sal)

Para o advogado tributarista Renato Gomes, a chegada de Justus nesse mercado vai contribuir para o processo de consolidação das criptomoedas no Brasil. “Essa é uma demonstração clara de que players importantes estão enxergando esse mercado, que já é realidade”, disse. “O padrão de trocas, como o adotado pela WiBX, vai se fortalecer na medida que amplia rede de usuários. É um caminho sem volta.”

Romero Oliveira, especialista em operações estruturadas da Valor Investimentos, também entende que há caminho para o crescimento de criptoativos no mercado brasileiro. “O modelo de compartilhamento vem crescendo muito. Isso gera mais engajamento e melhora o grau de negociação da moeda”, afirmou. “É positivo ver a entrada de um empresário como Roberto Justus no mercado. Quanto mais pessoas tiverem usando, mais o ativo será valorizado”, disse.

Na prática, Justus entendeu que poderia aumentar seu próprio capital cuidando de outros capitais. E que os clientes também poderiam ter aumento na rentabilidade. A virada de mesa na carreira estava associada a um segmento do qual sempre se envolveu, ainda que apenas como investidor de seu patrimônio. Com exceção da WiBX, em todos os outros negócios Justus integra o quadro societário, mas não ocupa cargos executivos. Prefere atuar na linha estratégica dos negócios. Foi assim em 2017, quando deixou de vez o grupo de publicidade Newcomm, para se associar a Felipe Prata e montar a Nest Asset Management. Na época, 100% do capital investido na empresa era do ex-publicitário. Hoje, representa 25%, o que significa que o volume cresceu com a entrada de clientes. A Nest vai fechar o ano com R$ 500 milhões em fundos administrados. E é em sua sala da Nest, na Avenida Luís Carlos Berrini, um dos principais corredores financeiros de São Paulo, que Justus despacha na maior parte da semana.

Um salto até o início de 2019 e o empresário parte para sua segunda investida entre as empresas de investimentos, a TreeCorp, que é uma private equity (a gestora compra parte de uma empresa para posterior venda, após período de valorização). “Você entra de sócio em empresas, por meio dos fundos, e alavanca os negócios, para sair cinco ou seis anos depois, com três ou cinco vezes mais do que investiu”, afirmou. “Esse tipo de investimento é um sucesso no mundo e está começando a avançar no Brasil.” O diretor-executivo da empresa, que administra hoje R$ 700 milhões, é Bruno D’Ancona, que também é sócio.

Durante a pandemia, Justus tirou do papel duas empresas, que serão as maiores, em termos de capital administrado. A Legend Wealth Management será gestora de grandes patrimônios, com consultoria sobre os caminhos para aplicar os recursos dos clientes. E também vai cuidar do patrimônio de Justus. “Toda vez que eu investi perguntava se os donos tinham capital aplicado. Quando os sócios estão juntos, é um bom sinal”, disse. O CEO da Legend Wealth será Sérgio Marini, que atuou no BTG Pactual e foi fundador da Turim Investimentos. Um dos sócios de Justus é Sérgio Eraldo Salles, que foi do grupo Bozano e ex-sócio do ministro Paulo Guedes na Crescera Investimentos.

ESPECIALISTA Felipe Prata é sócio de Justus desde 2017 e CEO da Nest Asset Management. (Crédito:Divulgação)

A outra empresa é a Legend Investimentos, um agente autônomo associado ao banco BTG Pactual. Pedro Salles será o CEO da companhia. As duas vão funcionar no mesmo endereço, a partir do início de novembro, em um espaço de 800 metros quadrados nas esquinas das avenidas Brigadeiro Faria Lima e Juscelino Kubitscheck, outro importante polo financeiro de São Paulo. Justus, que será charmain da Legend, não revela quanto investiu na aquisição das empresas nem previsão de faturamento. Elas já começam gigantes, com R$ 5 bilhões sob custódia. “Se chegarmos aos R$ 60 bilhões, teremos condições de ser a maior empresa independente, tirando bancos, de administração de patrimônio.”

Uma única inserção em um segmento do qual não domina: associou-se ao filho Ricardo na empresa de produções em realidade virtual Arvore Immersive, que se firmou no mercado global de games e que ganhou Leão de Ouro no Festival de Veneza deste ano, além do Emmy Awards, com a animação A Linha. “Tenho muita fé que a empresa tem grandes chances de virar unicórnio. Vai crescer muito nesse segmento”, disse.

TELEVISÃO O isolamento social impediu Justus de apresentar em 2020, pela décima vez, uma edição de O Aprendiz. O programa ficou para março, quando os candidatos irão concorrer a R$ 1 milhão e uma vaga por um ano em uma das empresas de Justus. “Ainda não sei em qual delas. Vai depender do perfil do vencedor”, disse a estrela do programa. Das 11 temporadas, Justus só não esteve à frente de duas – em 2010 e 2011 –, quando foi apresentar programas em outras emissoras e foi substituído pelo atual governador de São Paulo, João Doria, de quem, aliás, discorda da condução do Estado no auge da pandemia. “Fechou tudo e assustou demais.” Apesar de apontar falhas também na conduta de Jair Bolsonaro, que, segundo ele, “deu mau exemplo e acabou contaminado”, disse ser mais favorável ao que dizia o presidente em relação à abertura da economia.

Em março, envolveu-se em polêmica ao ter áudio vazado em que dizia que o número de mortes pela Covid-19 era pequeno em relação a mortes por outras doenças e em comparação com a população do País. Hoje, com mais de 150 mil óbitos no Brasil, mantém a posição. “Eu estava certo. Abriu a economia e está caindo o número de mortes”, disse.

Para Justus, a retomada da economia trará de volta a confiança de investidores, a partir do momento em que os mercados já entenderam o cenário econômico pós-pandemia. “Temos hoje cerca de R$ 1 trilhão na poupança e essas pessoas precisam entender que vão perder dinheiro se não mudarem de lugar seus recursos. A realocação de investimentos é um fenômeno muito interessante”, disse Justus. “As pessoas tem que buscar a rentabilidade.”

Com a guinada dos negócios após quase quatro décadas no segmento que o fez ser conhecido nacionalmente e o levou para a televisão, Roberto Justus reconhece que ainda é um aprendiz – em referência ao seu programa mais famoso – no mercado financeiro. Mas sabe que pode contribuir para o crescimento desses novos negócios. “Tenho muito a aprender no mercado financeiro. Ainda sou um aprendiz e vou aprender bastante, mas sou um empresário experiente. E isso trago para os novos negócios.”

ENTREVISTA:
“Não serei candidato a presidente da República”

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O Brasil começa a se recuperar da crise, mas ainda registra número grande de desempregados. O que isso impacta na economia?
Mês de agosto foi recorde de vendas no varejo. Estávamos represando compras na pandemia e isso voltou. Outro fator é o auxílio emergencial. Vejo a retomada com otimismo, principalmente após a chegada da vacina. Já se projeta crescimento de 3,5% no ano que vem. Sempre fui árduo defensor de que não poderia ter parado tudo. Se for parar para analisar, eu estava certo quando criticava isso lá no início. Abriu boa parte da economia e está caindo o número de mortos. Precisava tomar cuidado e isolar grupos de risco, mas não todo mundo. Sempre fui contra esse “fique em casa”. Número de mortes é preocupante, mas não é grande. Foram 150 mil óbitos, mas temos 212 milhões de habitantes. E outras doenças causam mais mortes.

O Brasil errou na condução da pandemia da Covid-19?
Os governos se assustaram e exageraram. O meio termo teria sido o ideal. O governador João Doria fechou demais, assustou demais, e o vírus do medo é pior do que a doença. O presidente Jair Bolsonaro exagerou ao sair em público dando mau exemplo e acabou contaminado. Também errou, mas sou mais favorável ao que ele dizia, que era tentar não fechar toda a economia. Podia ir ao mercado, mas não ao restaurante. É uma bobagem grande, que me incomodou bastante.

Qual sua avaliação sobre as reformas?
O Brasil sempre foi hostil ao empreendedorismo, ao empresariado. Se os impostos fossem menores, teríamos produtos mais baratos. O grande problema é o Congresso Nacional. Se fosse uma grande empresa e o Paulo Guedes fosse CEO, o Brasil estaria bem. Mas não dá para dirigir o Brasil como empresa. Privatizações estão demorando, mas se tudo sair, se as reformas avançarem, teremos um grande cenário nas próximas décadas.

Há erros em sua carreira?
Há sim. Eu calculo que um empresário acerta 80% e erra os outros 20%. Eu errei por aí, por isso cheguei com sucesso. O importante é que, quando você erra, não insistir com o erro, olhar para frente e não chorar sobre o leite derramado. Em 2018, aceitei proposta de empresários de montar clínicas médicas particulares. O Brasil tem carência danada e colocar pessoas a consultas médicas a R$ 70 parecia fantástico. Mas perdi um dinheirão, o negócio não deu certo. Saí fora rápido, assumi meu prejuízo. Não dá para se meter em área que você não entende nada. Só vi sucesso de quem era apaixonado pelo negócio.

Ainda há o desejo de ser candidato a presidente da República?
Essa história já passou na minha vida. Antes da eleição de 2018, cheguei a ir a Brasília para conversar com o então presidente Michel Temer. O grupo dele teve ideia de me lançar como o outsider da eleição. Eu não achei que poderia. Como não daria para ser um CEO do Brasil, não conseguiria lidar bem com a política. Mas ajudo do jeito que posso. Não sou candidato a nada e não serei.

Qual a melhor opção para os Estados Unidos: Donald Trump ou Joe Biden?
É uma vergonha para nós que o mundo tenha líderes do nível de Donald Trump e Joe Biden. Trump é fraco, não tem preparo. Biden também é bem limitado. Lamento que os Estados Unidos tenham esses candidatos. Para o Brasil, seria melhor o Trump ficar, por causa da relação com o Bolsonaro. Para o mundo, o equilíbrio do Biden talvez fosse melhor.

WIBX avança no varejo

O tão temido fim do dinheiro não é um prenúncio do apocalipse. Longe disso. Em todo o Brasil, as moedas digitais e a tecnologia embarcadas nelas conquistam cada vez mais espaço no varejo e torna-se uma ferramenta essencial na estratégia das empresas e dos consumidores. Não por acaso, elas atraem cada vez mais os grandes fundos e investidores globais. Um exemplo disso é a WiBX, uma moeda do tipo utility token nacional que promove fidelização entre varejistas e consumidores. A WiBX fechou uma parceria estratégica com fundos de investimento de venture capital e de private equity, como a Squadra Ventures, do gestor Guga Stocco, e a Treecorp Investimentos, que tem Roberto Justus como um dos sócios, bem como com um grupo de executivos ligados ao setor de varejo.

Segundo Justus, que ocupa um assento no conselho consultivo da WiBX, a proposta é auxiliar na aceleração da operação e garantir a escalabilidade do negócio. Assim, o empresário quer contribuir tanto no desenvolvimento de estratégias da empresa quanto no relacionamento com potenciais parceiros.

A WIBX tem um plano arrojado de crescimento e pretende intensificar a prospecção e ativação de novos players em sua plataforma. Atualmente, existem mais de 150 mil usuários cadastrados na empresa.