Nas últimas quatro décadas, o sobrenome Jereissati se tornou sinônimo de shopping center no País, assim como os Feffer estão para o papel e celulose, os Steinbruch para a siderurgia e os Trajano e Klein para o varejo. A partir de 1º de janeiro, no entanto, a família fundadora do grupo Iguatemi, hoje uma companhia de R$ 7 bilhões em valor de mercado, 16 unidades e receita de R$ 3,3 bilhões no terceiro trimestre deste ano, estará fora do dia-a-dia da gestão. Pela primeira vez desde 1979, terá o comando profissionalizado. O atual CEO Carlos Jereissati vai para a presidência do Conselho de Administração e passará oficialmente o bastão para a CFO Cristina Betts. Na prática, ela já tem comandado boa parte da companhia. Nos últimos anos, ajudou a reformular a estrutura financeira e organizacional da companhia. “Temos um planejamento estratégico robusto e muito bem desenhado para os próximos anos”, afirmou Cristina, em entrevista exclusiva à DINHEIRO.

Internamente, a nova empresa está com uma inédita estrutura societária. Desde a segunda-feira (22), a Iguatemi S.A. (IGTI11) opera na B3 de forma unificada. A Jereissati Participações (JPSA3), que tinha investimentos em telecom e outras empresas de varejo, e a Iguatemi (IGTA3), são uma coisa só e negocia na forma de units sob o ticker IGTI11. Com a reorganização, a holding que controla a Iguatemi incorpora 100% da empresa de shoppings. “A estrutura unificada abre espaço para atração de mais capital, sem diluir a fatia de controle da família, e permitirá que a companhia, no mínimo, dobre de tamanho nos próximos anos”, afirmou Cristina. Agrupadas, as units IGTI11, formadas por uma ação ordinária (IGTI3) e duas ações preferenciais (IGTI4), dará mais liquidez às ações e, por consequência, vai aumentar a capacidade de investimento e crescimento da Iguatemi, sem influenciar o endividamento. Mesmo listada no Nível 1, a Iguatemi S.A. pretende seguir todos os parâmetros do Novo Mercado, com exceção do veto à negociação de ações PN. A proporção de ações em livre circulação no mercado, conhecido como free float, também ficará acima dos 25% exigidos pelas regras do Novo Mercado. A operação tende a gerar eficiência de gestão e redução nas despesas porque não há mais a necessidade de manter duas estruturas separadas para atender os acionistas.

RETOMADA JK Iguatemi, em São Paulo, um dos 14 shoppings do grupo em que as vendas estão acima do período pré-pandemia. (Crédito:Divulgação)

Com mais capital, governança aprimorada e embalada retomada da economia, a nova CEO quer sair às compras. A executiva afirma que há boas oportunidades de aquisições em todo o País, que foram suspensas durante os últimos dois anos de pandemia, e que agora serão retomadas. O plano é identificar Brasil adentro polos de consumidores de média e alta rendas, e levar para dentro do País o conceito de experiência de consumo em loja física, associado com a possibilidade de compra também on-line. “Mais do que uma estratégica geográfica, temos foco em estar mais perto do cliente que tem um perfil aderente à nossa proposta e ao nosso conceito”, disse a executiva.

Por isso, segundo ela, em paralelo a potenciais fusões e aquisições, uma outra missão à frente do Iguatemi será acelerar o processo de digitalização da empresa. Além do Iguatemi One, o programa de relacionamento do Iguatemi que permite, via app, acúmulo de pontos e benefícios, foi ela quem ajudou a criar o e-commerce do grupo, o Iguatemi 365 (iguatemi365.com). No ar desde outubro de 2019, com mais de 400 marcas à venda na plataforma, esse marketplace atualmente já responde por uma fatia respeitável dos resultados. Segundo Cristina, 30% das vendas vêm de locais onde a empresa não tem tijolo.

FIM DO CICLO Último da família à frente do negócio, Carlos Jereissati deixa o cargo de CEO e assume a presidência do Conselho de Administração (Crédito:Divulgação)

Todas as mudanças em curso na Iguatemi Empresa de Shopping Centers S/A ocorrem em um momento positivo para o varejo de shoppings. Dos 16 endereços do grupo, 14 estão em patamares de vendas acima de 2019, antes da pandemia. O mais recente balanço da companhia, referente ao no terceiro trimestre, mostra que, por causa da flexibilização das restrições e volta de funcionamento de 100% da operação, a empresa registrou crescimento de 82,7% nas vendas totais, em comparação com o mesmo período do ano anterior, atingindo R$ 3,3 bilhões. Em relação a 2019, o avanço foi de 0,1%. Os aluguéis mesmas lojas cresceram 22,9%, assim como as vendas mesmas lojas (+7,8%) e as vendas mesmas áreas (+4,4%).

Segundo a companhia, o aluguel também ocasionou escalada nas receitas do período, sendo um aumento de 21,9% na receita bruta em comparação com o mesmo período de 2019, totalizando R$ 255,2 milhões, e um crescimento de 16,3% na receita líquida, para R$ 212,2 milhões no terceiro trimestre de 2021. Já o Ebitda registrou queda de 17,5% em relação ao terceiro trimestre de 2019, fechando em R$ 139,1 milhões.

82% de aumento nas vendas totais foram registradas no terceiro trimestre deste ano ante mesmo período de 2019

SUSTENTÁVEL A nova fase é vista com bons olhos pelo mercado. O Bradesco BBI elevou a recomendação de Iguatemi de neutro para compra e estabeleceu o preço-alvo das novas units da companhia em R$ 320, potencial de alta de 56,8% sobre o fechamento da quarta-feira (24). O banco diz que a nova estrutura societária da empresa vai melhorar a percepção do mercado sobre ela. “A reestruturação resolveu um dos principais pontos na tese de investimentos do Iguatemi, que era sua flexibilidade financeira limitada para realizar movimentos estratégicos e mantê-la em um caminho de crescimento sustentável”, afirmou o analista Bruno Mendonça, em relatório coproduzido com Hugo Grassi e Pedro Lobato. Sob o comando de Cristina Betts, o Iguatemi caminha para se tornar uma empresa muito maior, mais agressiva na estratégia de aquisições, financeiramente sólida e longeva.