Se você ainda não ouvir falar sobre ela, provavelmente vai conhecer em breve. A varejista chinesa Shein, com operação 100% on-line, está avançando sobre o mercado fast fashion mundial, inclusive o Brasil. Neste ano, a varejista assumiu a liderança nos Estados Unidos, com uma fatia de 28% das vendas no setor, segundo a Earnest Research, deixando para trás gigantes como a rede sueca H&M e a espanhola Zara. A virada veio com um salto de 160% só entre janeiro e junho. Analistas estimam que a companhia — que não revela seus dados financeiros, como uma típica empresa chinesa de capital fechado — tenha faturado US$ 10 bilhões globalmente em 2020.

Por enquanto, o segredo do sucesso da Shein está na exportação. A empresa não vende nenhuma peça de roupa sequer no mercado chinês, onde perderia competitividade. Toda a produção, feita por uma rede com 300 fabricantes chineses, é integralmente distribuída no mercado externo. Um software de gestão da cadeia garante o acompanhamento de cada etapa. Hoje, a empresa mantém centros de armazenamento em pelo menos oito países, concentrados principalmente na Europa. Os baixos investimentos em ativos e acordos com fornecedores para pedidos de até 30 peças permitem que a varejista faça testagens sem grandes custos. É o que viabiliza o lançamento de cerca de 2 mil peças diariamente na plataforma apenas dentro das categorias carro-chefe — roupas femininas e acessórios. Com esse modelo, o processo de produção, da criação até a fabricação em massa das peças, é de sete dias. Até então, o marco no setor era de três semanas na Zara. Assim se estabelece um novo ritmo para o segmento.

No mercado brasileiro, a mesma fórmula que faz da Shein um sucesso mundo afora, a logística, é o maior desafio da empresa. Mas mesmo como a epítome do “fast” na produção, os extensos prazos de entrega desafiam o crescimento da chinesa em mercados em que as compras on-line têm menos participação. No caso do Brasil, os pedidos pela Shein podem levar mais de um mês para chegar. A operação da empresa, puramente cross border e digital, é refém das barreiras logísticas e aduaneiras dos 220 países aos quais vende — o Brasil, um dos campões mundiais de burocracia, é considerado quase uma Muralha da China. Para compensar, a Shein trabalha com valores muito abaixo da concorrência, principal fator de atração do seu consumidor, e que garante um tíquete médio abaixo de faixas de tributação sobre importados. Alberto Serrentino, fundador da consultoria Varese Retail, explica se tratar de “uma operação mais agressiva que a da própria Inditex [dona da Zara], que sempre foi referência no setor.”

PREÇO DA MODA Outra característica da Shein é ser um reduto de moda para a geração Z, nascidos entre a segunda metade dos anos 1990 e início de 2010. A marca fortalece essa relação essencialmente pelas redes sociais, principalmente na plataforma TikTok, onde tem mais de 2,3 milhões de seguidores. Outro trunfo da chinesa, que usa esses canais para alimentar dados e aplicar essa inteligência em novos lançamentos.

A estratégia garante que a varejista cresça no seio de um público nativo digital, com baixo poder aquisitivo e que demanda dessa indústria intervalos de reciclagem menores. Ainda assim, um grupo com capacidade para consolidar tendências de consumo. Por isso a marca luta pela manutenção da sua base de preços.

O tíquete médio no app da Shein fica dentro do limite nacional de US$ 50 para isenção dos tributos de importação e custos aduaneiros, o que acende discussões sobre a competitividade do mercado. “Em sua maioria, essas redes internacionais não geram nenhum emprego em nosso país, assim como também não têm os altos custos nacionais em termos de carga tributária e trabalhista”, afirmou Edmundo Lima, diretor executivo da Associação Brasileira do Varejo Têxtil. O setor pressiona o governo para aumentar a fiscalização e discute uma tarifa sobre esses produtos na entrada.

No mercado da moda, os custos de importação para empresas com operação no país ainda envolvem adequação a normas, ajustes de modelagem e etiquetagem. “No momento que a indústria se preparava para reposição de estoque, o frete marítimo da China tinha disparado de U$ 1,5 mil para US$ 10 mil por contêiner”, afirmou Fernando Pimentel, presidente da Associação Brasileira de Indústria Têxtil e Confecção. Segundo a entidade, o mercado brasileiro de vestuário é abastecido em quase 85% pela indústria nacional, mas a participação de peças importadas entre os grandes varejistas pode chegar a 30%. O setor já dá como certo o crescimento da Shein nos próximos anos no mercado brasileiro. A questão agora é quais obstáculos devem restringir a expansão da empresa no País e como o segmento deve definir o limite para a chinesa aqui.