Poucos são os brasileiros dispostos a fazer a escolha de Carlos Wizard Martins. Há 15 meses, o empresário cuja fortuna está estimada em R$ 2,4 bilhões trocou o conforto de sua mansão em Campinas, no interior de São Paulo, para viver em Boa Vista, Roraima, e lá comandar a maior iniciativa privada de ajuda humanitária no País. Com recursos próprios, ele acolhe refugiados venezuelanos que fogem da miséria no país vizinho. “Estou em Boa Vista com minha esposa, Vânia. Ela me ajuda neste trabalho, que terminará em julho do ano que vem”, diz o presidente do Grupo Sforza, que controla no Brasil as redes Pizza Hut, KFC, Taco Bell e Mundo Verde.

Devoto da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, Wizard percebeu na condição dos refugiados a oportunidade de colocar em prática um dos fundamentos da congregação (mais conhecida como Mórmon), que mantém programas de ajuda humanitária em diversas partes do mundo. O projeto liderado pelo empresário recebeu o nome de Brasil do Bem e é pautado na tolerância. “Aceitamos o apoio de católicos, evangélicos, espíritas, pois o importante é ajudar aquelas famílias necessitadas”. explica Wizard, que se mudou para Boa Vista há um ano e três meses, convidado pela Igreja.

Como missionário, Wizard atua em duas frentes. Uma delas envolve seu conhecimento no mundo empresarial. Ele tem contato com empresas em todo o País que oferecem emprego antecipadamente aos refugiados. As pessoas são selecionadas em Roraima e seguem para as empresas onde vão trabalhar, normalmente em outros Estados. “A JBS, por exemplo, começou empregando três famílias e hoje são 500. A CSN emprega outras 500. Recentemente uma transportadora do Paraná contratou 50 motoristas, que fizeram os testes aqui, em caminhões do Exército”, diz Wizard. Nas contas dele, o Brasil do Bem já atendeu e empregou cerca de 6 mil imigrantes.

“Acompanho as famílias durante o processo de embarque. Na hora de pesar a bagagem, é comum colocarem na balança um saco plástico com no máximo cinco quilos. É tudo o que eles têm. Isso me comove muito”

A outra frente de atuação o aproxima mais ainda dos venezuelanos necessitados. Wizard fez acordo com o fundador e chairman da Azul Linhas Aéreas, David Neeleman, fiel da mesma denominação religiosa, para que todos os assentos vagos de voos que partem de Boa Vista sejam ocupados por refugiados. A iniciativa também foi adotada pelas concorrentes Gol e Latam, o que garante a saída de 35 estrangeiros, em média, todos os dias da capital roraimense. Para que os lugares vagos sejam de fato aproveitados em favor dos venezuelanos, Wizard diz que fica no guichê do aeroporto onde é feito o check-in para saber quantos lugares sobraram. “Tenho de ficar mendigando vaga. Acompanho as famílias durante o processo de embarque. Na hora de pesar a bagagem, é comum colocarem na balança um saco plástico com no máximo cinco quilos. É tudo o que eles têm. Isso me comove muito”, conta.

Wizard explica que a meta da ajuda humanitária comandada por ele é a de garantir às famílias autossuficiência para viver. Os acampamentos contam com cerca de 10 mil venezuelanos, mas há em torno de outros 10 mil que vivem fora deles em Roraima. Muitos têm qualificação profissional, já possuíram bons empregos ou empreendimentos próprios no país de origem, mas perderam tudo e buscam um recomeço. Antonio Guevara é um caso emblemático. “Ele é apicultor e tinha criação de abelhas antes de migrar. Pediu para ser enviado a um lugar que tivesse bastante área verde. Consegui enviar ele para Campos dos Goytacazes, no interior do Rio de Janeiro. Três meses depois ele me telefonou agradecendo. Iniciou a criação de abelhas por lá e hoje fornece mel para uma de minhas empresas, a Mundo Verde”.

Acostumado a viajar na primeira classe, a se hospedar nos melhores hotéis e a comer nos restaurantes mais luxuosos, Wizard afirma que o trabalho à frente desta causa humanitária é “uma grande experiência de humildade”. E uma experiência realizada com profissionalismo exemplar que lhe permite ajudar milhares de pessoas sem deixar de dar a devida atenção ao seu grupo empresarial. O empresário também planeja transformar a experiência em uma série de TV. Tanto que já iniciou conversas com produtores e empresas de streaming. Vem novidades por aí.