Um pouco mais de 42 anos de trajetória, a Apple conquistou uma aura de inovação reservada a poucas empresas. Essa fama nem sempre esteve ligada ao fato de a companhia da maçã ter sido a pioneira em seus segmentos. A gigante americana não inventou, por exemplo, o smartphone e o tablet. Mas, com o iPhone e o iPad, levou essas categorias a novos patamares, definindo assim os parâmetros a serem seguidos pela concorrência. Nos últimos anos, sobretudo desde que o lendário Steve Jobs morreu, essa capacidade de ditar os rumos tem sido questionada. Mesmo nesse contexto, a Apple acaba de estabelecer uma nova marca a ser perseguida pelos rivais.

A empresa é a primeira americana a superar um valor de mercado de US$ 1 trilhão. A proeza foi alcançada na quinta-feira 2, por volta das 13 horas (horário de Brasília), quando as ações da empresa estavam sendo negociadas a US$ 207. Pouco tempo depois, os papéis tiveram um ligeiro recuo. Mas tudo indica que é uma questão de tempo para que a companhia ultrapasse e consolide, definitivamente, essa posição. Não se trata, porém, do primeiro caso no mercado mundial de capitais. Em 2007, a chinesa Petrochina atingiu esse feito, na Bolsa de Xangai. O que se sustentou por poucas semanas. Hoje, o grupo está avaliado em US$ 205 bilhões.

A jornada que levou a Apple ao primeiro trilhão em Wall Street ganhou velocidade na terça-feira 31 de julho, depois da divulgação dos resultados de seu terceiro trimestre fiscal, encerrado em 30 de junho. As ações da companhia fecharam o pregão do dia seguinte com uma alta de 5,89%, cotadas a US$ 201,50, o que avaliou a empresa em US$ 973 bilhões. Para se ter dimensão da marca de US$ 1 trilhão, apenas 16 países registraram um Produto Interno Bruto (PIB) superior a esse montante (veja mais no quadro abaixo).

Em alta: a venda de dispositivos mais caros ajudou a Apple a impulsionar suas margens no período

O desempenho da Apple entre abril e junho ajuda a explicar esse cenário. “Estamos felizes por divulgar o melhor trimestre encerrado em junho da Apple e o quarto trimestre consecutivo de crescimento de dois dígitos na receita”, afirmou, em comunicado, Tim Cook, CEO da empresa. No período, a receita líquida da companhia cresceu 17%, para US$ 53,3 bilhões, na comparação com igual período, um ano antes. O lucro líquido, por sua vez, teve um salto de 32%, para US$ 11,5 bilhões.

Carro-chefe do portfólio da Apple e responsável por 56% da receita da companhia, o iPhone é um dos pontos cruciais nesse contexto. A empresa vendeu 41,3 milhões de unidades do dispositivo no trimestre. O número ficou um pouco abaixo dos 41,6 milhões estimados por analistas. O preço médio de US$ 724 do produto, no entanto, compensou a queda e impulsionou as margens e o lucro no período. O volume também chamou a atenção, pelo fato de a Apple, tradicionalmente, apresentar novos modelos do aparelho todo mês de setembro, o que, em muitos casos, freia o ímpeto dos consumidores, que preferem esperar pelos lançamentos. Nem mesmo a perda do segundo lugar no ranking mundial de vendas para a chinesa Huawei nesse intervalo pareceu abalar a confiança na companhia. Há sete anos, a Apple estava acostumada a dividir as duas primeiras posições com a sul-coreana Samsung.

A abertura de novas frentes para reduzir a dependência do iPhone também parece ter perspectivas mais positivas. No trimestre, o segmento de serviços, que engloba frentes como a loja virtual iTunes, o Apple Pay e a Apple Music, faturou US$ 9,55 bilhões, alta de 31% sobre um ano antes. E já representa 18% da receita da companhia. “Hoje, a empresa tem uma estratégia sólida e comprovada para 74% de seus negócios”, escreveu, em relatório, Sejuti Banerjea, analista da corretora americana Zacks. “Os números indicam que o foco em lançar dispositivos mais caros e capitalizar a base instalada de usuários está em alta.”

Se alcançar um valor de mercado de US$ 1 trilhão já é um feito, sustentar essa posição é um desafio. “Para atender as expectativas cada vez mais altas de Wall Street, a Apple precisará entrar em mais mercados, como, por exemplo, o segmento automotivo”, diz Patrick Moorhead, presidente e principal analista da consultoria americana Moor Insights & Strategy. Rob Enderle, analista-chefe da consultoria americana Enderle tem uma visão mais cautelosa do que parte do mercado. “A Apple está em uma bolha e haverá uma grande correção nessa precificação em breve”, afirma, ressaltando uma questão que ainda permeia muitas das análises sobre a companhia, especialmente depois da morte de Steve Jobs. “Eles precisam de mais um produto de sucesso, o que não acontece, de fato, desde o iPad. Mas parecem incapazes de criar um.”