Quatro anos após os ataques de radicais islâmicos em Paris, sobreviventes ainda tentam reconstruir suas vidas. Mas para muitos deles, feridos ou testemunhas dos ataques de 13 de novembro de 2015, o julgamento previsto para 2021 será um novo teste.

Cada caso é diferente, dizem os especialistas. Mas “qualquer pessoa que tenha estabilidade psicológica, sem antecedentes traumáticos, especialmente na infância, terá conseguido ou conseguirá seguir em frente, ou seja, 70% das vítimas”, garante Gérard López, presidente honorário do Instituto de Vitimologia da França.

Esta instituição já atendeu 180 pessoas desde os atentados jihadistas que deixaram 130 mortos e mais de 350 feridos.

Fabrice, que estava no Bataclan, a famosa sala de shows de Paris onde ocorreu um dos tiroteios, é uma delas. “Precisei de um ou dois anos para digerir as coisas”, disse à AFP.

Segundo o presidente da associação de vítimas Life for Paris, Arthur Dénouveaux, a “grande maioria” superou uma “etapa”. “Quando eles se encontram é para falar sobre seus projetos”, assegura.

No entanto, quatro anos depois, novas vítimas continuam a sair do silêncio. “Cerca de cinquenta se aproximaram da associação este ano”, afirma Dénouveaux.

Para Julien Rencki, diretor-geral dos Fundos de Garantia das Vítimas de Atos Terroristas (FGTI), são pessoas que “durante muito tempo não se consideraram como vítimas mas depois de três anos, eles percebem que não podem lidar com isso sozinhos”.

Jean-Baptiste, um jovem de 26 anos, levou muito tempo para se considerar uma vítima. “Saí do Bataclan após 15 minutos”, relata. “Para mim era inconcebível fazer qualquer queixa”.

– Ponto final? –

O julgamento dos ataques de 2015, previsto para 2021, poderia oferecer a eles um “ponto final”, aposta a psicóloga Géraldine Million.

“A maioria espera muito deste julgamento porque é nesse momento que a sociedade dirá publicamente ‘que não é normal o que ocorreu'”, explica.

É o que pensa Stéphane, ferido em 13 de novembro, que espera que o final do julgamento marque também o final de sua recuperação.

Depois disso, “o atentado vai se converter num evento histórico”, “já não será parte da atualidade imediata”, confirma Alexis, presente no Bataclan na noite dos atentados.

No entanto, para o presidente honorário do Instituto Francês de Vitimologia, o julgamento não pode acabar com o “sentimento de vítima”. “É um mito, já que esse tipo de trauma permanece por toda a vida”, diz.

Alguns encontram um tipo de libertação emocional nas comemorações, como Olivier, outro ferido do Bataclan, e sua namorada. Na véspera do primeiro aniversário dos ataques, eles viajaram para a Alemanha, para ficar o mais longe possível de Paris. Mas mal desembarcaram no território alemão, decidiram voltar para casa.

“Quando vimos as imagens do show de Sting no Bataclan na noite de 12 [de novembro de 2016] falamos um para o outro ‘Mas o que estamos fazendo aqui?’, recorda Olivier, de 37 anos. Dirigiram a noite toda “para chegar a tempo das homenagens” do dia 13. “Nos ajudou muito fazer parte das homenagens em Paris, foi catártico”.

Desde então, não perderam nenhuma das cerimônias. “Eu preciso estar com as outras vítimas neste dia em particular”, explica Olivier. “A comunidade precisa manter o apoio antes do início do julgamento”, estima.

No banco dos réus estarão os membros do grupo que participou na preparação dos ataques e o único atacante que sobreviveu, Salah Abdeslam, que está preso na penitenciária de Fleury-Mérogis, ao sul de Paris.

Na noite de 13 de novembro de 2015, nove homens semearam terror na capital francesa. Bares, restaurantes e uma sala de concertos foram alvo de ataques simultâneos, os piores da história recente da França.