Uma das imagens mais comentadas nas redes sociais na semana passada é, no mínimo, inusitada – tanto para o noticiário político quanto no campo empresarial. O presidente Jair Bolsonaro publicou na internet sua foto na qual acompanha a partida entre Brasil e Venezuela pela Copa América, transmitida no domingo (13) pela primeira vez no SBT, emissora de Silvio Santos, um amigo assumido do governo. Tão notório quanto o semblante de satisfação de Bolsonaro, que comemorou como final de Copa do Mundo a derrota da TV Globo nos direitos de transmissão das partidas, era a camisa do Brusque Futebol Clube, time patrocinado pela rede varejista Havan, de Luciano Hang. O excêntrico empresário, jocosamente apelidado de Véio da Havan, tem se destacado como um escudeiro incondicional do bolsonarismo e do próprio presidente, aparecendo sem constrangimento até na garupa do chefe do Executivo, sem capacete e, por vezes, com a placa coberta.

O afago de Hang aos eleitores mais efusivos de Bolsonaro poderia não causar desconfiança não fosse o fato de que ele agora acena para os investidores. Assim como faz nas aglomerações presidenciais, Hang sinaliza que vai tentar uma barulhenta oferta de ações na bolsa brasileira. Um vídeo postado no YouTube em que apresenta seu site de Relações com Investidores (RI) atesta a decisão e a pressa. O empresário tem promovido nos últimos meses algumas turnês com gestores e investidores em suas lojas pelo País. “Ele demonstra certa urgência em atrair investimentos agora, com receio de que o clima eleitoral do ano que vem prejudique o desempenho da marca que ele mesmo fez questão de associar ao governo”, afirmou um empresário, em condição de anonimato, que viajou com Hang pelo interior no final de maio. Procurado pela DINHEIRO, Hang não concedeu entrevista.

No vídeo, de cerca de 6 minutos, ele celebra os 35 anos da rede ao lado de seus filhos, Lucas e Leonardo, todos vestidos com camiseta verde com a frase, em letras amarelas, “o Brasil que queremos só depende de nós”. Embora não detalhe o IPO, a companhia protocolou pedido de registro à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em 12 de maio. Oficialmente, a Havan diz que está “se preparando para dar sequência como companhia aberta”. A Havan tem mais de 160 lojas em todo o País e 20 mil colaboradores. No site de RI não está disponível o resultado do primeiro trimestre da empresa, apenas o de 2020. O grupo encerrou o ano passado com faturamento de R$ 10,5 bilhões e um lucro líquido de R$ 1,3 bilhão, resultado 30% maior que 2019.

RISCOS Nos bastidores do mercado, no entanto, há indícios de que o posicionamento político de Hang – que mantém a defesa de Bolsonaro a despeito da pandemia, que matou sua mãe, Regina Modesti Hang, em fevereiro – possa ter contaminado a percepção de risco dos investidores. No ano passado, Hang propagandeou que o valuation da Havan seria de R$ 100 bilhões, cifra que colocaria sua rede mais perto dos R$ 160 bilhões do Magalu. Gestores dizem que o patamar está próximo a R$ 50 bilhões. Na avaliação de Caio Fernandez, CEO da Ivest, sem operação parruda no varejo eletrônico e com a marca ainda não consolidada, não existem fundamentos que justifiquem uma precificação defendida por Hang. “Os donos de companhias sempre tentam estipular o maior preço possível, mas o mercado não comprou os argumentos da Havan.”

Para o analista de investimentos Maurício Moura, da Corretora Plural, mesmo sem força no e-commerce, a Havan tem valor relevante pela capilaridade de suas lojas físicas no interior. “O físico é forte, indiscutivelmente, mas o esforço para estruturar um comércio eletrônico robusto levaria muito tempo para ganhar maturidade, o que amplificaria o risco político se Bolsonaro perder em 2022.”

Por enquanto, não existe qualquer sinal de que Hang cogite perder o presidente-propaganda no ano que vem. Ao contrário, Hang parece querer intensificar sua posição de Robin patriota, ao lado do super-herói Batman das manifestações populares. Prova disso é que, desde o ano passado, a Havan lançou um boneco do empresário Luciano Hang com o nome de Capitão Brasil. O brinquedo é vendido nas unidades da rede por R$ 14,99. Como o personagem não fica na ala infantil das lojas, parece que a intenção é diversificar o público-alvo e pegar carona nas motociatas Brasil adentro.