Na metade dos anos 80, a Qualcomm não passava de uma empresa discreta instalada na pacata cidade americana de San Diego, na Califórnia. Fazia dinheiro, pouco, vendendo um sistema de rastreamento e gerenciamento por satélite de frotas de caminhão. Seu sócio-fundador, Irwin Jacobs, um discreto engenheiro e ex-professor de computação, experimentava uma nova forma de transferência de dados e voz sem a utilização de fios. Em pouco mais de três anos a Qualcomm começou a mudar. Jacobs e um time de engenheiro adaptaram a tecnologia de comunicação sem fio usada pelo exército americano para comunicação celular, e viraram a mesa. Hoje, dona de um faturamento anual de US$ 3,9 bilhões e com 7 mil empregados, a Qualcomm quer ser a Intel das comunicações móveis, transformando seus chips para a comunicação celular em componentes obrigatórios na nova e bilionária geração de aparelhos digitais móveis.

?O mundo todo vai para o CDMA?, exagera Marco Aurélio Rodrigues, presidente da subsidiária brasileira, referindo-se à tecnologia criada pela Qualcomm, que será adotada como padrão mundial para a nova geração de celulares e licenciada para uma multidão de fabricantes de engenhocas no mundo inteiro. ?A Qualcomm pretende receber royalties de todos os fabricantes de celulares?, diz Rodrigues. Com cerca de 400 mil celulares no Brasil, a companhia está mudando o foco de sua ainda apagada operação no País. A empresa está longe de ter aqui o dinamismo que exibe nos Estados Unidos. Recentemente vendeu a sua operação de fabricação de celulares para a japonesa Kyocera e concentrou os investimentos na Vésper, operadora de telefonia fixa em São Paulo e Rio de Janeiro, onde detém pouco mais de 16% do capital. A participação na Vésper foi uma forma de compensar a derrota na disputa pela Banda B. Mas a Qualcomm não desistiu de se associar a uma operadora de telefonia celular no País: ?Vamos participar de alguma forma nas próximas licitações da Banda C?, garante Rodrigues. Essa parece ser uma variação radical da mesma estratégia adotada pela companhia nos EUA.

A idéia de se tornar um vendedor de tecnologia para celular foi o detonador do processo de extinção de fábricas próprias de celulares e equipamentos de infra-estrutura para CDMA. No ano passado, suas operações de estações rádiobase e outros componentes foram transferidas para a Ericsson, num acordo que selou o fim de anos de briga com a empresa sueca em torno de patentes de CDMA. Agora a empresa quer se dedicar à expansão do CDMA e entrar de cabeça na era da Internet móvel.

O cérebro para o salto da Qualcomm cabe na cabeça de um alfinete. O microchip que carrega a tecnologia CDMA (Acesso Múltiplo por Divisão de Código) é a chave do sucesso da companhia. No ano passado, as vendas dessa tecnologia produziram US$ 420 milhões de lucro ? e as ações da companhia tiveram uma das maiores valorizações do mercado acionário americano: bateram nos 2.621%. O motivo desse sucesso? A venda de licenças da tecnologia e, claro, dos chips que carregam o código do CDMA. Só o negócio de chips rendeu à empresa US$ 1 bilhão em 1999. Desenhados pelos engenheiros em San Diego e fabricados por terceiros, entre eles a IBM, os chips têm uma margem de lucro fantástica: 40%.
Em 1995, quando o CDMA foi apresentado como uma opção comercial às duas tecnologias digitais já existentes no mercado ? a americana TDMA e a européia GSM ? ninguém arriscava um centavo no seu sucesso. Hoje, ela é a que mais cresce no mundo ? no ano passado expandiu 118% ? e é a maior fonte de receitas da Qualcomm. Os royalties do CDMA, que chegam a 4,5% sobre o valor da venda de cada aparelho celular que utiliza a tecnologia, respondem por mais de 50% do faturamento da companhia. Mas o melhor está por vir. Com o licenciamento maciço do código para a terceira geração, a Qualcomm espera faturar US$ 20 bilhões em 2010. Até lá, pretende popularizar uma nova tecnologia, chamada de HDR, que vai permitir a qualquer equipamento acessar a Internet sem fio a uma velocidade 10 vezes superior a conseguida nas transmissões dos celulares atuais.