A carestia vai se transformando no novo vilão do governo (e para o governo) com grandes chances de influenciar no tabuleiro da disputa eleitoral. E o motivo é simples: qualquer brasileiro consultado vê aí o maior mal da economia do País. Pesquisa da XP/Ipespe, recém-divulgada, constatou: ao menos 97% dos entrevistados dizem estar com medo da inflação em disparada e reclamam que os preços subiram demais. A sensação de perda do poder de compra é fator determinante para a análise da conduta de um governo. Em outro levantamento, o DataFolha mostra que 75% dos eleitores culpam diretamente o presidente da República pelo retorno do dragão inflacionário. É um número surpreendente. Na prática, sendo esse o desafio principal identificado pela maioria e não tendo ele sido superado pelo mandatário, a chance de punição nas urnas é alta. O Palácio do Planalto acendeu a luz vermelha de perigo nesse sentido. Sabe que os índices degringolaram de vez. O Banco Central foi a público dizer que não sabe mais o que fazer para conter a inflação. Admitiu a possibilidade de ela passar de 11% ao longo do ano e sugeriu um remédio — por demais amargo — que aniquila com qualquer chance de recuperação do PIB no curto prazo: juros e mais juros. Pelas contas da instituição, uma Selic na casa de 12,75% daria conta do recado, trazendo as taxas inflacionárias de volta à meta — na casa de 4,5% ao ano, como pretendido. Difícil garantir isso em meio a um cenário que é, também, influenciado pelos preços externos. A alta dos combustíveis, invariavelmente, pesa de maneira preponderante na conta. Para contê-la, o governo busca intervir, na marra, jogando às favas a autonomia da Petrobras. Bolsonaro trocou o comando da estatal e demitiu o general Silva e Luna por ele simplesmente não atender aos seus clamores de controle dos preços. A saída do general não resolve diretamente o assunto, mas reforça na mente do capitão a ideia de poder meter a mão na companhia como bem entender. Os preços dos papéis da empresa, por conta disso, entraram logo a seguir em ritmo de queda. Manipulação artificial de preços é o pior dos remédios em uma economia que se pretende de mercado. As agruras decorrentes dos preços em órbita não emanam, de todo modo, somente daí. As contas públicas estão em pandarecos com o festival de gastos federais, com as benesses em emendas parlamentares, fundo eleitoral e quetais. Bolsonaro vai torrando dinheiro público como se não houvesse amanhã, distribuindo bondades em troca de votos e transmitindo aos investidores a percepção de que uma bolha pode estourar a qualquer momento. O risco fiscal é motor a alimentar uma inflação que já está confirmando o segundo ano consecutivo com números fora da meta. Desde o advento do Plano Real, na década de 90, nada tão dramático nesse campo era visto. Bolsonaro parece estar fazendo o impossível para ressuscitar o fantasma do dragão e pode, ele mesmo, ser devorado por esse incendiário dos preços.

Carlos José Marques Diretor editorial