A crise do coronavírus aqueceu o debate em torno das pautas ligadas ao grupo LGBTI+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transsexuais, Intersexuais e outros). Segundo levantamento da empresa de pesquisa Kantar, apenas em mensagens publicadas no Twitter nos cinco primeiros meses deste ano, houve um aumento de 100% em relação ao mesmo período de 2019, saltando de 2 milhões para 4 milhões de posts. Vale ressaltar, ainda, que outros temas relevantes à sociedade também são tratados com destaque nesses grupos. “Este ano, notamos a vontade do movimento LGBTI+ de se unir e reforçar as pautas das lutas das mulheres e da população negra”, observa Elder Munhoz, diretor de Operações da Divisão Insights da Kantar. “A pandemia também reforçou o apoio a marcas que são responsáveis, que olham além das vendas para atender melhor às comunidades internas e externas por meio de comportamentos positivos”, declara Munhoz.

As causas LGBTI+ ainda sofrem preconceito de grande parte da sociedade, mas já são bem mais aceitas do que num passado recente. O desafio, agora, é levar as empresas a incentivar e fomentar políticas de diversidade e inclusão no Brasil.

Especialmente, diante de uma taxa de desemprego de 12,6% no último trimestre, segundo o IBGE, e do fechamento de quase 5 milhões de postos de trabalho. Com o Dia do Orgulho LGBTI+ celebrado no domingo 28, o debate torna-se ainda mais oportuno. Na opinião de Caio Magri, diretor-presidente do Instituto Ethos, a pandemia deu maior visibilidade à desigualdade no País. “Pessoas vulneráveis são as que mais estão sofrendo durante a crise econômica, social e política que vivemos”, diz Magri. Ele acredita que a sociedade brasileira vai sair desse processo com uma dívida ainda maior do que a que já existe em relação à população negra, das mulheres e do grupo LGBTI+.

“Se a crise leva as empresas a fazer cortes, isso, somado ao racismo e ao preconceito, as tornará mais masculinas e brancas, salvo as que já adotam políticas afirmativas.”

Um estudo realizado pelo Instituto Ethos, analisando o perfil social, racial e de gênero das 500 maiores empresas do Brasil, traz dados interessantes. A pesquisa aponta que a sub-representação e as dificuldades de ascensão na carreira são alguns dos principais problemas enfrentados por grupos como afrodescendentes, mulheres, pessoas com deficiência e o público LGBTI+. “Já houve avanços de inclusão de mulheres e negros, mas com predominância em cargos mais baixos”, diz Magri. Publicado em 2016, o estudo indicou que só havia um conselheiro afrodescendente entre as 500 companhias pesquisadas, enquanto a população brasileira é composta por 54% de negros. “A diversidade da população não se expressa nas empresas”.

CEO da Consultoria de Sustentabilidade e Diversidade Gestão Kairós, Liliane Rocha destaca que as companhias evoluíram muito na comunicação sobre o tema, mostrando seu posicionamento, fazendo palestras e envolvendo as comunidades. Entretanto, ainda têm muito a avançar em seus programas de diversidade. “É necessário construir metas e indicadores a curto, médio e longo prazos para a contratação, retenção e promoção dessas pessoas. Há muitas empresas bem posicionadas e com boas práticas, mas que não apresentam crescimento nos números de mulheres, negros e LGBTI+”, diz. Segundo ela, para que este crescimento ocorra, é necessário fazer censos demográficos internos, criar e escutar os canais de denúncia e colocar metas e indicadores para estabelecer uma curva ascendente. “Esse trabalho não pode parar”.

DIVERSIDADE E INCLUSÃO Embora as previsões para o período pós-pandemia não sejam animadoras, algumas companhias têm se esforçado para colocar em prática a política de inclusão. Uma delas é a Sodexo, que atua na área de serviços de qualidade de vida e montou uma estratégia que engloba cinco áreas: Gênero, Cultura e Origens, Pessoas com Deficiência, Orientação Sexual e Identidade de Gênero e Gerações. Presidente da empresa no Brail, Andreia Dutra afirma que diversidade e inclusão fazem parte do negócio e que isso influencia no crescimento sustentável. “Equipes diversas são mais engajadas, inovadoras, criativas e têm melhor desempenho”, declara. “Trabalhamos para criar uma cultura que englobe as diferenças e celebre ideias, perspectivas e experiências únicas em tudo o que fazemos.” Segundo ela, esses movimentos ajudam a criar uma cultura inclusiva dentro e fora da empresa para que, no futuro, não sejam necessárias políticas afirmativas para garantir a inclusão e a diversidade no mercado de trabalho.

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“A diversidade da população brasileira não se expressa dentro das empresas” Caio Magri, Instituto Ethos.

Na Gerdau, o presidente, Gustavo Werneck, declara-se apaixonado pelo tema diversidade. “O Brasil é muito atrasada e preconceituosa”, afirma. Para ajudar a romper as barreiras em relação ao assunto, ele participa de reuniões com outros executivos, para abordar a questão dentro do programa CEO’s Legacy, da Fundação Dom Cabral, iniciativa que reúne executivos orientados para a construção de legados relevantes e sustentáveis. “Queremos influenciar companhias a criar planos de inclusão. O ideal é que fornecedores e clientes também avancem neste tema”, diz Werneck.

Ele considera que o setor de serviços tem evoluído no assunto. Já o segmento industrial, mais conservador e machista, ainda está muito aquém. “Qualquer empresa que disser que tem dificuldades para evoluir com a questão da diversidade está buscando desculpas para não avançar”. A Cisco é outra companhia que trata do assunto com a importância que ele merece. “Temos trabalhado muito o ambiente, o respeito e a inclusão”, diz o presidente, Laércio Albuquerque. Segundo ele, globalmente, 62% dos executivos da empresa fazem parte de grupos que se enquadram nas políticas de diversidade. “Quando se cria um ambiente genuíno de inclusão dentro da empresa, todos os funcionários ficam felizes e o ambiente de respeito aflora.” Esse conceito é ótimo e parece evidente. Só precisa ser adotado por mais empresas.