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Pela primeira vez em quatro anos, uma auditoria interna com mais de 200 páginas vem à tona e revela o verdadeiro papel que a Previ, o poderoso fundo de pensão do Banco do Brasil, que administra ativos da ordem de R$ 34,5 bilhões, desempenhou no Programa Nacional de Desestatização (PND). DINHEIRO teve acesso, com exclusividade, ao documento que mostra os bastidores das decisões que selaram a sorte dos leilões de venda de algumas das mais importantes empresas deste País, como a Companhia Vale do Rio Doce. O documento aponta um rastro de suspeições nos acertos conduzidos por Jair Bilachi, ex-presidente da Previ, durante a privatização das companhias elétricas. O documento mostra que, ao contrário do que sempre se disse, o governo federal influenciou sim as decisões do maior fundo de pensão do País, que recebeu incentivos para ingressar na disputa de algumas ex-estatais. Também fica claro que diretores da Previ discordaram várias vezes sobre os rumos que o fundo tomou ao longo do PND ? o que levou à abertura da própria investigação, no ano passado, pelo atual presidente, Luiz Tarquínio. Brigas internas, ameaças de demissão, perseguições e até denúncias de alteração de contratos fazem parte do relatório, que envolve ex e atuais diretores da Previ.

O relatório mostra que o governo federal interferiu ativamente na decisão dos fundos de pensão, liderados pela Previ, de ingressarem no Consórcio Brasil, o grande vencedor do leilão de privatização da Vale do Rio Doce, realizado em maio de 1997. A ata da reunião (veja documento) da diretoria da Previ, de 28 de abril daquele ano, traz a informação de que a BNDESPar, a empresa de participações do BNDES, gestor do PND, negociou a troca das ações ordinárias (com direito a voto) que os fundos detinham na Vale por ações ordinárias da Eletrobrás e preferenciais (sem direito a voto) da Petrobras. Está escrito na ata: ?Tal alternativa proporciona um conforto adicional à Previ para sua participação no leilão de privatização da Vale do Rio Doce, pois caso o fundo fique de fora do grupo de controle da CVRD, teria a possibilidade de trocar suas ações ON em condições razoáveis por ações de primeira linha, com liquidez no mercado e bom potencial de valorização?. Essa garantia foi fundamental para que a Previ aceitasse ingressar no Consórcio Brasil, capitaneado pela Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), leia-se Benjamin Steinbruch, que venceu a disputa com o consórcio liderado pelo grupo Votorantim, que tinha à frente o empresário Antonio Ermírio de Moraes. Procurado por DINHEIRO, Steinbruch disse que nunca soube que esse acordo tenha sido feito.

O acordo também desmente o então presidente do BNDES, Luiz Carlos Mendonça de Barros, que sempre negou qualquer suspeita de favorecimento ao Consórcio Brasil. Ele está caracterizado, porém. Na hipótese de derrota do consórcio na batida do martelo, foi assegurado ao fundo que seria possível trocar os 8,06% da ações ordinárias e 5,11% das ações preferenciais que já possuía do capital da Vale. Em outras palavras, no caso de perder o leilão do lado da CSN, a Previ não teria que conviver com Antônio Ermírio. Procurados pela Dinheiro, Mendonça de Barros e José Pio Borges, respectivamente, presidente e diretor da área de privatização do BNDES na época, não foram localizados. A assessoria de imprensa do banco de fomento informou que não foi dada nenhuma garantia específica aos fundos de pensão. A operação de troca foi apenas uma oferta pública, feita em agosto de 1997 ? mas o relatório comprova que havia uma combinação anterior.

Outra história de acordo feito por fora também surge da investigação. Está nas atas de uma reunião da Previ de outubro de 1997 (veja documento), às vésperas da privatização de duas importantes distribuidoras de eletricidade, a CPFL e a CEEE. A reunião terminou em atrito. Dois diretores do fundo, Arlindo Magno de Oliveira e Francisco Teixeira Nobre, protestaram contra o fato de Jair Bilachi, presidente do fundo na época, ter assinado, sem autorização da diretoria, um protocolo de intenções com o grupo VBC Energia para a formação do consórcio que acabou vencendo a disputa pelas duas companhias. A reclamação contra a irregularidade ficou registrada oficialmente. Bilachi não se deu por vencido e disse: ?Lamento a interpretação equivocada dada ao processo pelo diretor Arlindo e a sua falta de empenho e sensibilidade para rediscutir o tema em análise, proposto reiteradas vezes a todos os membros da Diretoria, com o intuito precípuo de aprimorar o conteúdo dos documentos apresentados?. Procurado, Bilachi não quis comentar o assunto.