Afinal de contas, a Internet grátis é economicamente viável ou não? Seis meses depois do aparecimento dos primeiros provedores gratuitos no Brasil, esta pergunta continua sem resposta. Já é certo que o acesso grátis transformou a demografia e a economia da Internet brasileira. Não se sabe, porém, se ele vai durar. Na semana passada, o portal iG apresentou um argumento de US$ 75 milhões em favor do seu polêmico modelo de negócio. Esse foi o valor que dois fundos de investimento americanos ? o THLi e o UBS Americas ? pagaram por 11,2% do site do cachorrinho. ?Conseguir capital nessa conjuntura foi um feito, uma prova de força?, anunciou Nizan Guanaes, presidente do iG. Mais importante para os donos do portal ? os bancos Garantia e Opportunity, que colocaram outros US$ 25 milhões no negócio, para não diluir sua participação ? foi o fato de a operação projetar um valor total para o iG superior a US$ 600 milhões. Foi um endosso de peso a uma forma de operação que muita gente considera insustentável. Mas não encerrou a polêmica. ?Esse valor é irreal?, afirma Victor Ribeiro, diretor do portal do grupo Universo Online que também oferece acesso grátis à rede, o BOL. ?O NetZero americano, que oferece acesso grátis em um mercado com 100 milhões de usuários, tem um valor em bolsa de US$ 648 milhões. Se o iG vale o mesmo que o NetZero, o UOL deveria valer o que vale a America Online.?

O pano de fundo para essa discussão é a nova circunstância que cerca os investimentos em Internet ? a relativa escassez de capital, que complicou a existência dos portais brasileiros, todos deficitários, que não têm atrás de si grupos internacionais bilionários. Nos últimos 45 dias, desde que o Federal Reserve elevou a taxa de juros nos EUA e derrubou as ações da bolsa de tecnologia, a Nasdaq, os planos de lançamentos de ações nos EUA tiveram de ser adiados. O resultado é que as empresas estão tendo de recorrer a formas alternativas de financiamento, pontes que as levem, em meio a uma dispendiosa guerra de publicidade por audiência, até o desejado IPO. Daí a operação do iG na semana passada. Daí, também, a emissão de notas promissórias no valor de US$ 200 milhões feitas pelo UOL no início deste mês. ?Conseguimos o dinheiro facilmente, sem colocar parte do negócio à venda?, diz Caio Túlio, diretor-geral do maior portal brasileiro, que tem como sócios os grupos Folha e Abril. No início deste ano, o UOL vendeu 12% do seu capital a investidores americanos por US$ 100 milhões. Isso conferiu ao negócio um valor global de US$ 1 bilhão.

No cenário brasileiro da Internet, os dois portais de peso que estão livres do gargalo financeiro são o Terra e o America Online. O primeiro pertence à multibilionária Telefonica, e o outro é parte do maior grupo de comunicação do planeta, a AOL-Time Warner. Apesar disso, ambos cobram acesso de seus usuários. ?A gente não acredita em um modelo baseado apenas em publicidade e comércio eletrônico?, afirma Marcelo Lacerda, diretor do Terra. ?Sem a receita das assinaturas as contas não fecham.? O portal tem 500 mil assinantes e esse número cresce 8% ao mês. Mesmo assim, os executivos da empresa não se arriscam a ter os pés nessa única canoa ? criaram o Terra Livre, que também oferece Internet grátis. ?A gente não quer arriscar perda de tráfego?, diz Lacerda. ?Podemos nos dar ao luxo de fazer isso e esperar que a racionalidade prevaleça no mercado.? Em outras palavras, que a onda de Internet grátis acabe com o esgotamento financeiro dos seus mentores. Instalado na novíssima sede do iG, Guanaes não quer nem ouvir falar disso. ?Temos em caixa US$ 160 milhões, suficientes para dois anos?, diz ele. Essa conta considera que a publicidade e os investimentos em estrutura consomem entre US$ 6 milhões e US$ 7 milhões por mês. Parece muito, e é, mas o presidente do iG se apóia na força da marca e nos 2,4 milhões de usuários registrados para assegurar que a balança vai se equilibrar até 2003. Como? Sobretudo através da venda de publicidade ? o portal espera conseguir US$ 30 milhões este ano ? e das operações de comércio eletrônico. Elas terão, porém, de ser disputadas palmo a palmo com os outros provedores. Logo, a viabilidade econômica desse modelo está por ser provada. Mas a do outro, pago, também.