Uma distância de 13.647 km separa a Rússia da Floresta Amazônica brasileira. Ainda assim, a guerra declarada por Vladimir Putin contra a vizinha Ucrânia pode destruir uma parte do bioma mais diverso do planeta. Com o arrastar do conflito, o abastecimento de 20% dos fertilizantes que o agronegócio nacional importa da Rússia está sob risco – e o presidente Jair Bolsonaro tem usado o fato para sua agenda pessoal. Sob o argumento de que uma mina de potássio localizada no município de Autazes (AM) ajudaria o País a diminuir a dependência externa do insumo, Bolsonaro quer modificar a lei que proíbe mineração em terras indígenas.

O assunto, já controverso diante da crescente preocupação global com o aumento da temperatura do planeta, ganha ares mais complexos pela falta de informações embasadas sobre a relação custo versus benefícios que a exploração da mina significaria para o País. Um estudo divulgado por dois professores da Universidade Federal de Minas Gerais, Raoni Rajão e Bruno Manzolli, por exemplo, indica que a exploração de potássio nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Sergipe seriam suficientes para abastecer a demanda do agro até 2100. Por outro lado, segundo especialista de uma relevante associação do agronegócio ouvido pela Dinheiro, nem mesmo o mapeamento do território nacional para obtenção de detalhes das minas foi feito. E isso por si só exigiria investimentos que o governo não teria como arcar.

Amazônia: ‘ponto de inflexão’ se aproxima mais rápido do que o esperado

De onde, então, vem a informação da mina de Autazes? Vem de uma subsidiária do banco comercial canadense Forbes & Manhattan, a Potássio do Brasil, que em seu site se apresenta como “uma empresa de fertilizantes que vai atuar na extração de sais de potássio, no Amazonas”. Esse mesmo banco é também o dono da Belo Sun Mining que tem como objetivo tornar-se a maior mina de exploração de ouro a céu aberto do Brasil em uma área de 2,4 mil hectares — o que equivaleria a 2,4 mil campos de futebol —, também na floresta. A área a ser explorada está localizada onde se inicia a “volta grande do Xingu”, trecho sinuoso, cheio de cachoeiras do Rio Xingu e que abriga duas Terras Indígenas. Aqui vale um parênteses: a empresa é canadense, país cujo primeiro-ministro Justin Trudeau declarou que os países do G7 devem “agir pela Amazônia” e “agir pelo planeta”.

Tal declaração foi feita pelo premiê canadense em 2019, mesmo ano em que Bolsonaro disse uma das suas mais célebres frases sobre a Amazônia no que deveria ser uma defesa pela soberania nacional contra os países que ofereceram ajuda contra os incêndios na região. “O interesse na Amazônia não é no índio, nem na porra da árvore. É no minério”, afirmou Bolsonaro a um grupo de representantes da Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada na frente do Palácio do Planalto, em 1º de outubro daquele ano. Na ocasião também afirmou repudiar “a forma como o nosso minério é doado para outros países”.

O interesse dos canadenses é nos minérios e eles estão dispostos a obtê-los destruindo o maior patrimônio ambiental brasileiro. É a eles que a legalização da mineração em Terras Indígenas que Bolsonaro tanto defende beneficiará.