libera auxílio, reduz auxílio, corta auxílio. Essa síntese da trama econômica brasileira no ano passado deverá ganhar, em 2021, nova versão. Por enquanto, os coros mais proeminentes dizem “veta auxílio” e “negocia auxílio”. Nas últimas semanas, o governo deu sinais confusos sobre o que estaria por vir, sensação agravada pela indefinição sobre como serão conduzidas as medidas de combate à pandemia, tanto na economia quanto na saúde. Enquanto Paulo Guedes conta moedas para liberar o benefício, Jair Bolsonaro precisa do programa para tentar recuperar parte do apoio popular. Na saúde, Eduardo Pazuello é investigado por uso indevido de recursos públicos ao mandar para cidades remédios comprovadamente ineficazes no combate à Covid-19. Tudo isso enquanto o mundo comprova que vacinar a população é a melhor forma de ativar a eAconomia e diminuir perdas econômicas.

A decisão sobre o auxílio deve sair na próxima semana, após a escolha dos presidentes da Câmara e do Senado. Em ambas as casas, os candidatos já afirmaram que trarão o tema para pauta. A decisão é delicada tanto para quem espera receber quanto para quem terá, cedo ou tarde, que pagar por ele. A dívida bruta brasileira atualmente é de quase 90% do Produto Interno Bruto (PIB). “Se o governo não agir, haverá uma queda abrupta no consumo, em um cenário no qual o benefício está sendo substituído por um mercado de trabalho enfraquecido”, disse José Roberto Mendonça de Barros, economista e sócio da MB Associados.

Professora do Ibmec RJ, a economista Vivian Almeida entende que o auxílio é fundamental, mas não descarta o risco fiscal embutido. “No atual cenário, a volta do beneficio é a tábua de salvação para o País, especialmente para os mais pobres que dependem de ajuda até para comer”, afirmou. “Porém, a manutenção do programa esbarra no descontrole fiscal e na corrosão das contas públicas.”

É justamente o descontrole de despesas que preocupa o ministro Paulo Guedes. Economista-chefe do Banco Ourinvest, Fernanda Consorte afirmou haver um esforço da parte de Guedes para não romper o teto de gastos. Mas, segundo ela, “o recrudescimento da doença torna o auxílio emergencial essencial.” Por isso mesmo, o ministro sabe que negar o benefício pode gerar desgaste. E até ser em vão. Se o Congresso decidir aprovar o auxílio por mais tempo e para mais gente do que a equipe econômica planeja, a conta será bem maior para os cofres públicos.

Na terça-feira (26), Guedes afirmou que o governo pode retomar o programa se o número de mortes por Covid-19 ficar em um patamar acima de 1 mil por dia e a vacinação fracassar.

Mateus Bonomi

“Precisamos pensar na volta do benefício. Ele faz sentido se o número de mortes subir, ou a vacinação fracassar” Paulo Guedes, Ministro da Economia.

JÁ DEU ERRADO Um estudo encomendado pela Fundação de Pesquisa da Câmara de Comércio Internacional (ICC) estima que a economia global pode perder até US$ 9,2 trilhões se os governos não garantirem o acesso às vacinas. Porém, todo o gasto com a vacinação em massa seria recompensado em uma proporção 166 vezes maior conforme a economia volte a crescer.

Professor de economia e finanças da Universidade de Maryland e um dos autores do estudo, Sebnem Kalemli-Özcan entende que nenhuma economia do mundo irá se recuperar totalmente sem a vacinação em massa. “O caminho em que estamos leva a menos crescimento, mais mortes e a uma recuperação econômica mais longa.” Por aqui, a imunização tem enfrentado mais obstáculos do que se previa. Para Fernanda Consorte, do Ourinvest, “na lentidão que está, a vacina já deu errado para a economia”.

“Alô, caminhoneiro, não para, não”

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Pressionado por motoristas de caminhão, Jair Bolsonaro resolveu fazer um apelo para que os profissionais não levem adiante a ameaça de greve. Segundo a categoria, a alta no preço do diesel inviabiliza a atividade. “Reconhecemos o valor dos caminhoneiros para a economia do Brasil. Apelamos para eles que não façam greve, que todos nós vamos perder. Todos, sem exceção. Agora, a solução não é fácil. Estamos buscando uma maneira de não ter mais este reajuste”, afirmou Bolsonaro ao sair do Ministério da Economia na quarta-feira (27). Na véspera, a Petrobras havia aumentado o preço médio do diesel nas refinarias em 4,4%. A pasta estuda agora formas de reduzir as alíquotas de PIS/Cofins sobre o diesel. Segundo Bolsonaro, os governadores deveriam fazer o mesmo com o ICMS. “Para cada centavo no preço do diesel que porventura nós queremos diminuir, no caso, PIS/Cofins, equivale buscarmos em outro local R$ 800 milhões. Então, não é uma conta fácil de ser feita”, disse Bolsonaro.

Quem também esteve em Brasília para falar sobre benefícios foi o presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci. O objetivo era negociar com o ministro Paulo Guedes a prorrogação da carência para pagar os empréstimos no âmbito do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), criado em meio à pandemia. “Pedimos ajuda com a questão do Simples e a revisão do BEM, que é aquela medida que nos permite reduzir jornada e suspender contrato. Porque, se nós estamos com as portas fechadas, como é que vamos garantir empregos se não há como pagá-los?” Após criticar o fechamento de bares em São Paulo e Minas Gerais, Bolsonaro disse que as medidas serão estudadas e anunciadas em até 15 dias.