A força das águas dita o ritmo da produção energética no Brasil. Dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) mostram que 60,6% do volume produzido no País são decorrentes das bacias hidrográficas espalhadas de Norte a Sul. O domínio é absoluto. A energia eólica, segunda fonte mais utilizada em território nacional, responde por apenas 9,1%. Mas essa história já está sendo recontada. Especialistas acreditam que, até 2030, a participação hídrica no processo cairá para cerca de 45%, ampliando o espaço para outras energias renováveis – além da proveniente dos ventos, a solar, que hoje representa apenas 1,5% da matriz energética nacional. Essas duas devem atingir 48% do mercado até 2050. De olho nessas estatísticas, a empresa norueguesa Statkraft projeta investimento de R$ 2,5 bilhões na construção do parque eólico Ventos de Santa Eugênia, na Bahia, com obras a ser iniciadas em janeiro de 2021. “O Brasil é rico em recursos renováveis. Temos uma visão de longo prazo muito positiva para o País”, afirmou, à DINHEIRO, o espanhol Fernando de Lapuerta, CEO da Statkraft no País. “Pelo tamanho, pela quantidade de consumidores e pelo esperado crescimento no consumo energético (de 2,2% ao ano até 2040, acima da média global de 1,2% ao ano).”

Líder no setor hidrelétrico e a maior geradora de energia renovável da Europa, a Statkraft produz, além de energia eólica, solar e a gás (em outros países), e fornece aquecimento urbano. No Brasil, o parque eólico na Bahia terá capacidade para produzir 519 megawatts (MW), após a conclusão, em 2023. A companhia mais do que dobrará a capacidade instalada no País, chegando a 967MW – atualmente, o grupo administra 22 ativos de geração renovável, com potencial de 450MW, suficientes para abastecer uma cidade com 1 milhão de residências por um ano.

O parque Ventos de Santa Eugênia, ao lado do Serra de Mangabeira (a ser construído), integra a primeira fase de implantação do Complexo Eólico Ibipeba, com produção estimada de 1,1 gigawatt (GW). Quando essa etapa for finalizada, terá 14 parques onde serão instaladas 91 turbinas de 5,7MW. “Em 2018, definimos uma estratégia de crescimento focada no desenvolvimento, construção e operação de usinas eólicas e solares. E os projetos na Bahia se encaixam muito bem em nossos planos”, disse o executivo.

A aposta em energia solar também está no foco da Statkraft. O recurso renovável é um dos mais competitivos atualmente no País . Para o executivo, o interesse no Brasil aumenta por suas condições naturais muito boas de radiação solar. “O que estamos vendo no mundo é o crescimento dessa fonte energética numa escala nunca antes vista. Temos vários projetos solares e queremos viabilizar a construção desse tipo de usina no País a partir de 2021”, afirmou Lapuerta.

FORÇA NORDESTINA Complexo eólico da Statkraft em Macaúbas, na Bahia. (Crédito:Divulgação)

Globalmente, a meta da companhia é desenvolver 6GW de energia eólica até 2025 para que possa se tornar líder em energia renovável no mundo. No Brasil, são 619 usinas eólicas instaladas com capacidade de 15,4GW, segundo dados da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica). A força de produção está concentrada nas regiões Nordeste e Sul. Apesar de a pandemia ter afetado diversos setores no Brasil, as operações da empresa seguiram, “sempre com respeito aos protocolos de segurança”. A Statkraft soma 247 funcionários no Brasil – são 4 mil no total, em 17 países. Não houve redução salarial nem inadimplência de clientes.

A eficiência nas atividades desempenhadas pela companhia ficou comprovada nos resultados do primeiro semestre. A receita operacional líquida somou R$ 223,8 milhões, aumento de 8% na comparação com o mesmo período de 2019. O lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda na sigla em inglês) totalizou R$ 154,6 milhões, alta de 17,5% em relação ao apurado nos primeiros seis meses do ano passado. E o lucro líquido foi de R$ 69,6 milhões, contra R$ 46,9 milhões em igual época de 2019. A receita operacional líquida de 2019 foi de R$ 438,1 milhões e, segundo Lapuerta, em 2020 vai terminar também “com números positivos.”

Professor de Engenharia do Centro Universitário Salesiano de São Paulo (Unisal), Thiago Averaldo Bimestre aponta vantagens da energia eólica em comparação com as demais fontes: não poluir e possuir equipamentos de longa vida útil, apesar do alto custo de instalação da torre eólica. Mas ele acredita que faltam incentivos por parte do governo federal para a diversificação da matriz energética. “A importância da diversificação é justamente baratear o custo da eletricidade, para que a gente não dependa de apenas uma fonte”, afirmou Bimestre. Ele defende, ainda, a abertura do mercado livre de energia a todos os consumidores, o que, na sua opinião, ajudaria a diminuir o custo. “O cliente teria liberdade para escolher o seu fornecedor e negociaria o preço da sua energia diretamente com os agentes geradores e comercializadores. Isso estimularia a concorrência”, disse.