A concentração de renda não se trata mais de uma notícia que mereça destaque dada a banalidade. Nos últimos anos, os ranking que catalogam os bilionários têm mostrado que eles estão ficando ainda mais ricos. Esse fato, do ponto de vista jornalístico, não ganha mais as manchetes. No máximo, fica disperso em uma cobertura econômica sem grande realce. Existe lógica por trás dessa decisão. Nas faculdades de jornalismo se repete à exaustão a história do cachorro e do homem. Quando o primeiro morde o segundo, não há nada a ser relatado. O contrário, caso raro e incomum, ganha relevância em uma edição – principalmente se o periódico for de notícias populares.

Mas não me canso de olhar para essas pesquisas e não me surpreender e me indignar. O relatório mais recente foi divulgado na semana passada pela consultoria americana Boston Consulting Group. Ele mostra que as riquezas pessoais do mundo atingiram US$ 201,9 trilhões em 2017, um crescimento de 12%, ritmo mais forte dos últimos cincos anos. Boa notícia? Depende para quem. Metade desse dinheiro está nas mãos de milionários e bilionários. Em 2012, eles detinham “apenas” 45% desse bolo. “Acreditamos que os ricos estejam ficando mais ricos mais rapidamente”, disse Anna Zakrzewski, autora do relatório, em comunicado enviado por e-mail para a agência de notícias Bloomberg. No Brasil, cuja população soma 209 milhões de pessoas, apenas 117 mil pessoas contavam com R$ 1 milhão ou mais em aplicações financeiras no ano passado, segundo a Anbima, associação que representa o mercado financeiro e de capitais. Não custa lembrar que os seis maiores bilionários brasileiros têm mais dinheiro que a metade mais pobre da população, de acordo com pesquisa da ONG britânica Oxfam.

Não tenho nada contra os ricos. Ao contrário. Quem trabalhou duro e conquistou seu dinheiro honestamente tem mais que desfrutar desse justo patrimônio. Mas não posso concordar com esse abismo que separa os ricos dos pobres no Brasil e no mundo. Não consigo entender também porque essa questão não é central no debate das próximas eleições presidenciais. Até agora, temas como corrupção e segurança são os preferidos dos pré-candidatos, na tentativa de surfar na onda da Lava Jato e da violência urbana. Eles são importantes, mas convenhamos. Com exceção dos corruptos, contra a corrupção somos todos nós. Assim como somos a favor da água encanada e da energia elétrica. Combater a iniquidade social deveria ser a maior prioridade de qualquer governante brasileiro. Você pode acabar com a corrupção – algo difícil em qualquer sociedade. Mas, se mantiver a desigualdade, nada muda.

É claro que não se trata de um problema fácil e rápido de ser resolvido. Dados divulgados pelo IBGE, no ano passado, indicam que a desigualdade social, intensificada pela recessão econômica, deve demorar a ser superada no País. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, metade dos trabalhadores tinha renda média inferior a um salário mínimo em 2016. Além disso, a parcela dos 1% com mais rendimentos recebiam 36 vezes mais que os 50% mais pobres. É um fosso de proporções oceânicas. Mas algo precisa ser feito urgentemente para reduzi-lo. As eleições são um caminho para debater como enfrentar esse problema. Não dá mais para manter a desigualdade nossa de cada dia como um fato banal.