Cintos de segurança deveriam ser, como o próprio nome diz, a garantia maior de segurança. Infelizmente, a eficiência do equipamento foi posta à prova por um dos automóveis mais vendidos no País, o Corsa. As falhas tiveram consequências trágicas. Os cintos de segurança se romperam em pelo menos 25 acidentes, sendo dois fatais. Este é o número oficial, divulgado pela própria General Motors. A reportagem de DINHEIRO apurou que a Polícia Civil de Minas Gerais trabalha com a hipótese de haver pelo menos mais três mortes, todas no Estado, ligadas ao problema do cinto. Os acidentes ocorreram em março de 2000, em Barbacena, São João Del Rey e Uberlândia, segundo o Instituto de Criminalística da Polícia Civil mineira. Na madrugada da sexta-feira, 20, aconteceu mais um acidente grave. O jovem Ronaldo da Silva Couto envolveu-se em acidente com seu Corsa Sedan na BR-040, indo de Belo Horizonte para o Rio de Janeiro. O cinto não evitou que ele batesse gravemente a cabeça e o tórax. A decisão da General Motors de fazer o recall foi tomada em 29 setembro deste ano e serão convocados 1,3 milhão de consumidores. É o maior recall da indústria nacional.
PINHEIRO NETO E O FORNECEDOR: Justiça pode responsabilizar executivo
da GM. A Keiper faz voto de silêncio

Problema e solução
Entenda como a peça se rompe
e o processo de reparo
Biô Barreira
O suporte do fecho do cinto quebra e faz todo o conjunto de segurança se soltar do banco
Kit é instalado no trilho e abraça o suporte do fecho
Pela primeira vez no Brasil, o recall de uma peça defeituosa de automóvel é feito baseado na constatação, registrada pela própria empresa, de acidentes fatais provocados diretamente pela falha de fabricação. Por trás dos graves defeitos no cinto, transborda uma série de problemas. Por que a GM esperou tanto para oficializar o recall, já que a primeira morte, admitida pela montadora, ocorreu em abril de 1999? A GM afirma que indenizou a família dos mortos, pagando algo em torno de R$ 1 milhão a cada uma. Não há notícia nem confirmação da empresa de que os demais 23 acidentes sem vítimas fatais, por ela conformados, serão alvo de indenização. Entre outras questões controversas do caso está a dos consumidores que pagaram pela troca da peça antes do recall, achando que era problema exclusivo de seus veículos e não uma falha em série. A GM limitou-se a dizer que não vai reembolsá-los. “Não há motivo para isso”, afirma José Carlos Pinheiro Neto, vice-presidente da companhia no Brasil. A outra empresa envolvida no recall é a alemã Keiper, fabricante do sistema do cinto de segurança da GM. Foi escolhida em concorrência mundial, há seis anos, disputando com TRW, Johnson Controls e Lear Corporation. Ficou imcumbida de desenvolver e fornecer o equipamento para as fábricas no Brasil e Europa. A Keiper não comenta o assunto do recall, por orientação da General Motors. “Todas as informações serão dadas pela montadora”, diz Diógenes Cerqueira, diretor comercial da Keiper do Brasil. A matriz alemã. procurada por DINHEIRO, repetiu a informação da filial. “Falem com a GM”, sugeriu Pieter Arndt, gerente do centro tecnológico da Keiper em Kaiserlautern.

Diferente do que se viu na guerra aberta entre Ford e Firestone, nos EUA, o episódio brasileiro prima pela solidariedade entre montadora e fornecedor. Nos EUA, os acidentes fatais derrubaram o presidente da fabricante de pneus, criando jurisprudência para colocar os responsáveis na cadeia por 15 anos. No Ministério Público brasileiro, surge o primeiro sinal de que a lei vai ficar mais dura para os fabricantes de carro. O promotor de Justiça de Defesa do Consumidor em São Paulo, Giovanne Serra Azul Guimarães, diz que a GM pode ser responsabilizada pela omissão de informações. “Os responsáveis pela General Motors do Brasil podem ser condenados pela Justiça a cumprir pena de seis meses a dois anos de detenção”, afirma o procurador Guimarães. E completa: “A montadora deveria ter feito ampla e imediata divulgação. E não foi isso o que ocorreu”. A GM diz que informou ao Ministério da Justiça sobre o recall dentro do prazo legal. O Procon estuda multar em R$ 3,1 milhões à montadora pelo atraso na convocação do recall.

Dentro da montadora, há diferentes versões sobre o caso. Algumas surpreendentes, como culpar o mau estado de conversação das estradas brasileiras pela quebra dos cintos. “Não temos nenhum indicativo de que as peças têm defeito. Elas romperam apenas diante de uma pressão muito acima do normal”, diz Pinheiro Neto. Segundo ele, o recall de 1,060 milhão de carros , além de outros 240 mil exportados, não é a prova de que a montadora cometeu um erro na adoção do sistema de ancoragem dos cintos de segurança. A alguns metros da sala dele, o diretor de Engenharia de produtos da GM, Carlos Buechler, responsável pela linha de montagem do Corsa, admite preocupação. “Toda esta situação nos deixa muito incomodados”, diz. Os engenheiros brasileiros sabem como aconteceu o problema, mas não sabem o por quê. “Estamos frustrados”, revela o executivo. As peças foram enviadas a Alemanha, em meados do ano passado, onde se constataram micro-rachaduras. A decisão de resolver o problema foi tomada em setembro de 1999, um ano antes do anúncio oficial feito pela GM ao governo brasileiro. A primeira solução ? um rebite adicional ? foi implementada em dezembro de 1999 para os carros da linha 2000. Os testes prosseguiram até julho, quando a solução para os veículos que já tinham sido vendidos — um suporte extra com seis peças — entrou em fase de pré-produção. Foram meses de longa agonia.

E AGORA É O PÁLIO
Não é só no campo comercial que GM e Fiat estão unidas. Na crise, também. Na quinta-feira 19, a fábrica italiana anunciou a convocação de todos os proprietários de Palio com motor 1.0 produzidos desde maio de 1998. O motivo é uma possível falha no cinto de segurança. A Fiat vai instalar um parafuso e uma arruela de ferro nos 320 mil veículos da marca para resolver o problema.