Um cenário tenebroso começa a afetar toda a economia e a assustar os brasileiros, sem que nada absolutamente esteja sendo planejado, por parte do governo, para conter os seus efeitos. Na combinação explosiva de preços subindo em todas as áreas e uma piora acentuada nas condições de vida, com menos empregos, menos renda e mais miséria, o Brasil caminha rapidamente para o quadro de estagflação, algo que já não se via por aqui fazia mais de três décadas, desde antes do surgimento do Plano Real. A realidade da estagflação se completa quando dois pesados fatores se juntam para travar a roda do desenvolvimento: o da carestia em desabalada subida com o do baixo crescimento. A taxa do PIB do último trimestre já foi minguada e especialistas apontam que não há muito melhor a esperar nesse sentido a partir de 2022. A inflação, por sua vez, está disseminada e em evolução. Ela se espalha por diversos vetores da cadeia produtiva, indiscriminadamente. Uma pesquisa recém-realizada aponta que o chamado índice de difusão inflacionária alcançou a taxa de 68,9% dos itens pesquisados. Isso significa que sete em cada dez produtos avaliados tiveram os preços remarcados. Normalmente, quando esse índice está baixo — recentemente não ultrapassava o nível de 4% —, ele demonstra uma inflação concentrada em poucas mercadorias, permitindo ao consumidor a troca momentânea daqueles que tiveram maiores reajustes. Com o aumento de preços indo de vestuário aos alimentos, dos combustíveis à energia, transporte etc, não sobrou rota de fuga. E é essa realidade que está acelerando o processo de empobrecimento do País. O IPCA já encostou em dois dígitos em 12 meses, muito além do teto da meta prevista pelo Banco Central, e não dá sinais de refluxo. O cálculo mais otimista para o nível da carestia neste ano ronda na casa dos 8,5% segundo os técnicos. Os números nesse sentido estão sendo revistos diariamente para cima. Enquanto isso, uma nova rodada de recálculo do PIB já traz o índice para um número abaixo de 1% em 2022. A MB Associados fala em 0,4% em 2022. Instituições financeiras também seguem na mesma toada e calculam avanços irrisórios, entre 0,5% e 0,8%. É bem aquém do necessário para qualquer projeto de retomada. Diante da apatia generalizada, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tenta tirar mais um coelho da cartola e fala agora em choque de oferta para atacar o dragão dos preços. Aos interlocutores, ele tem dito que fará uma ofensiva “técnica”, promovendo apoio à oferta e à produtividade. Não há exatamente uma estratégia delineada que vá muito além dos habituais incentivos. O que o “Posto Ipiranga” está pretendendo lançar é uma proposta de redução de 10% nas tarifas de importação. Isso de forma linear. Seria um alento, mas o mercado não considera o suficiente. Para tanto existe ainda um grande desafio: a oposição que enfrenta da Argentina, dentro do bloco do Mercosul, no qual precisa tratar e negociar esse modelo de subsídio. Não será fácil. Guedes quer impor na marra a ideia, acenando com a ameaça de o Brasil seguir sozinho daqui para frente nas negociações, caso não consiga o intento. Os demais parceiros ainda não enxergaram benefícios econômicos para uma abertura dessa envergadura em contratos firmados fora do bloco. Está difícil desatar o nó da estagflação por essa via.

Carlos José Marques, diretor editorial