No ano passado, o executivo Cristiano Hyppolito, diretor de tecnologia do programa de fidelidade Dotz, começou a mudar todos os seus servidores para um data center, grande centro de dados povoado com milhares de computadores. A ideia era adotar o modelo conhecido como computação em nuvem. Em vez de manter os servidores internamente, ele terceiriza essa tarefa para outra empresa. Com isso, deixa de ter um custo fixo e passa a pagar uma assinatura mensal ou anual, ganhando flexibilidade para expandir os serviços, caso a demanda aumente. Depois de muita pesquisa, ele optou pelo Google, que havia inaugurado seu primeiro data center em solo brasileiro. E o motivo pelo qual ele fez essa opção foi, no mínimo, prosaico. “Eles iriam começar a faturar em reais, o que não acontecia com as outras empresas”, afirma Hyppolito. Pode parecer surreal, mas um detalhe aparentemente insignificante foi crucial para a decisão do Dotz, que preferia trabalhar com a moeda local para evitar os riscos cambiais, como o de 2015.

Fazenda de servidores: data center da Microsoft, que começou a atuar no Brasil a partir de 2014. Agora, ela passará a cobrar seus parceiros em reais (Crédito:Divulgação)

Esse é um exemplo da batalha que tem sido travada entre os três principais competidores deste setor em busca do cliente brasileiro. A Amazon, a Microsoft e o Google estão replicando no Brasil um disputa que já ocorre em outros países. A empresa fundada por Jeff Bezos tem ampla vantagem nessa briga até agora. Ela lidera com uma participação mundial de mercado de 47,1%, segundo dados da consultoria americana Gartner. A Microsoft detém uma fatia de 10% e o Google fica com quase 4%. No mundo, eles duelam por um mercado que faturou US$ 260 bilhões, em 2017, de acordo com a Gartner. Em 2020, essa cifra deve aumentar para US$ 411 bilhões. No Brasil, a computação em nuvem movimentou cerca de US$ 1,7 bilhão, número que deve dobrar até 2021, segundo a americana IDC, especializada em pesquisas sobre tecnologia.

A Amazon, dona da marca AWS, é a empresa que atua no mercado brasileiro há mais tempo. Ela abriu seu primeiro data center em 2011. Hoje, conta com três centros de dados. A Microsoft iniciou sua estratégia em 2014. O Google foi o último a chegar. Seu data center foi inaugurado em setembro do ano passado. A localização exata dessas operações é mantida sob sigilo para garantir a segurança dos dados. “Essas empresas estão aproveitando uma mudança no pensamento dos CEOs brasileiros, que é transformar o custo de tecnologia de fixo para variável”, afirma Pietro Delai, gerente de pesquisas da IDC. “Trocar de servidor de nuvem é como trocar de hotel. Basta pegar seus pertences e mudar de quarto. Isso cria uma competição intensa entre as grandes companhias internacionais para oferecer os melhores serviços e as melhores condições.”

João Bolonha, do Google: nova no mercado nacional, a empresa investe em tecnologias como big data e faturamento local para atrair clientes (Crédito:Keiny Andrade /Folhapress)

A chegada do Google ao mercado brasileiro já provocou reações. A Microsoft, por exemplo, passou a faturar em reais as contas de seus parceiros comerciais em fevereiro deste ano. “Estamos muito otimistas com essa mudança”, afirma Roberto Prado, diretor da divisão da plataforma de nuvem da Microsoft Brasil. A AWS, por sua vez, acredita que faturar em moeda local não é tão importante. “Os clientes querem flexibilidade e reduções de custo”, diz José Nilo Cruz Martins, principal executivo da operação local da AWS, que não revela o número de clientes, mas conta com Magazine Luiza, Nubank e Banco Inter em sua carteira. A Dotz, por exemplo, espera reduzir seus custos em 20%, após migrar para a nuvem. As armas do Google não se limitam apenas ao faturamento local. Para conquistar clientes, como a Dotz, a gigante de buscas oferece muito mais. “Temos um posicionamento muito forte em big data”, afirma João Bolonha, diretor de vendas de Google Cloud para América Latina. “Ofertamos essa tecnologia aos clientes e ensinamos como utilizá-la.”

A chegada de Amazon, Google e Microsoft reposicionou também a estratégia das companhias brasileiras, como Tivit, UOL Diveo e Locaweb. Há 10 anos, quando começava a vingar o negócio de data centers no Brasil, essas empresas não enfrentavam forte concorrência. Agora, para sobreviver, elas tornaram-se parceiras desses gigantes internacionais. “O cliente dificilmente estará em uma única nuvem (data center)”, diz Carlos Gazaffi, chefe de operações da Tivit. “Ela tem uma prioritária, mas diversifica de acordo com a necessidade.” Essa é uma batalha que está apenas começando. O certo é que todos querem levar os clientes para as nuvens.