Em qualquer economia civilizada do mundo, uma retração de 10% do PIB ao longo de quase três anos provocaria uma queda generalizada dos preços. Inevitavelmente, as manchetes econômicas seriam sobre a grave deflação que ameaça a geração de empregos. No Brasil, ao contrário, a maior recessão da história veio acompanhada de uma inflação de dois dígitos em 2015 e de quase 6,5% em 2016, patamares inaceitáveis mesmo para mercados emergentes. Felizmente, com uma nova gestão no Banco Central (BC), essa triste página dos preços altos está sendo virada.

O ano de 2017 começou com a menor inflação já registrada em um mês de janeiro desde 1979, uma alta 0,38% do IPCA, o que reforça a convicção da maioria dos economistas de que o centro da meta de 4,5% poderá ser atingido em breve. É verdade que os efeitos da recessão ajudam a explicar uma parte da desaceleração dos preços, mas a história completa requer outros capítulos. Um deles tem o agronegócio como protagonista. A safra de grãos 2016/2017 vai atingir um recorde de 215 milhões de toneladas, alta de 15% em relação à colheita anterior, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

O sucesso decorre dos investimentos no campo, que geram ganhos de produtividade, e de um efeito climático positivo. Ao contrário do ano anterior, em que o fenômeno El Niño foi muito forte, o La Niña deste ano contribuiu para o ótimo resultado dos agricultores. Na prática, gerou deflação em diversos alimentos como feijão, batata, leite e tomate. Outra contribuição para a baixa inflação em janeiro veio do câmbio. O dólar caiu 4%, barateando itens importados, como trigo e produtos industrializados. O IGP-M, que dá um forte peso para os itens no atacado, já aponta para um bom resultado também em fevereiro.

A prévia do mês, divulgada na quinta-feira 9, pela Fundação Getulio Vargas (FGV), foi de apenas 0,10% ante uma expectativa de 0,35% do mercado. “Como o preço de hoje no atacado é repassado, no futuro, para o varejo, esse resultado é muito bom para a inflação oficial”, diz Fabio Romão, economista da LCA Consultores, que elencou alguns riscos inflacionários em 2017 (confira o infográfico acima). Resta ainda um importante capítulo dedicado ao BC. A nova gestão do economista Ilan Goldfajn reconquistou a credibilidade perdida nos últimos cinco anos. O efeito prático foi a ancoragem das expectativas futuras em torno do centro da meta de inflação. Além de possibilitar uma queda mais rápida dos juros – processo já em curso –, essa ancoragem auxilia na desindexação da economia.

Quanto menor a inflação esperada, menos relevantes ficam os mecanismos automáticos de reajustes no ano seguinte. Nos próximos meses, o IPCA acumulado em 12 meses vai cair abaixo dos 4,5%. Esse processo rápido de desinflação vai coincidir com uma importante reunião, em junho, do Conselho Monetário Nacional (CMN), que é formado pelo presidente BC e pelos ministros da Fazenda e do Planejamento. No encontro, será definida a meta de inflação para 2019. “Haverá espaço para reduzi-la para 4,25% ou 4%”, diz Romão, da LCA. A balança dos preços está pesando a favor da autoridade monetária.