Novas imagens do assassinato do congolês Moïse Kabagambe divulgadas na quarta-feira (9) mostram a discrepância de uma elite economicamente produtiva que discute, por trás das mesas de confortáveis escritórios, temas como diversidade e inclusão de grupos minorizados e a realidade diária dessa população. Vivo, Moïse não recebeu o salário devido no prazo acertado — o que configura escravidão. Morto, brutalmente assassinado após reclamar seu pagamento, ficou estendido por três horas na calçada da barraca Tropicália enquanto outros homens e mulheres consumiam seus refrigerantes e águas de coco.

Moïse agora é estatística. De acordo com o Fórum de Segurança Pública, 76,2% das pessoas assassinadas em 2020 eram negras. Considerando a última década completa, foram quatrocentos e cinco mil oitocentos e onze assassinatos. Sim, 405.811 negros e negras perderam a vida de forma violenta no Brasil. Tente, por um segundo, imaginar essa quantidade de pessoas. A imagem é assustadora. A maioria absoluta brutalmente assassinada sem que isso repercutisse da devida maneira na sociedade.

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Corte para outro grupo minorizado: mulheres. Nos últimos sete dias, a imprensa reportou o feminicídio de três mulheres grávidas. Jéssica Regina estava com 9 meses quando foi morta com um tiro pelo marido, o ex-vereador George Passos. Cícera Raquel da Silva grávida de 7 meses foi morta aos 18 anos com um tiro na cabeça pelo marido, sem nome divulgado. E a grávida Antonielle Nunes Martins perdeu a vida em um crime cujo suspeito seria seu amante Gabriel Henrique Santos Souza. Morreram as mães e os filhos. Além dessas três, a sociedade só conhecerá as outras por números e com certo atraso. Nos dados mais recentes, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostra que entre 2009 e 2019 mais de 50 mil mulheres foram assassinadas, sendo que o número daquelas mortas dentro de casa cresceu 6,1%. Vale lembrar que feminicídio também acontece da porta para fora.

Diante de uma realidade tão brutal, é inevitável a reflexão sobre a maturidade que o Brasil está para entrar com propriedade no debate de boas práticas ESG. A impressão é que o País pulou para o MBA sem ter passado pelo ensino básico. Evidentemente a discussão e os avanços da agenda na esfera empresarial são necessários e precisam continuar. Mas é igualmente inevitável pensar que estamos errando em aspectos primários como garantir o direito à vida aos nossos cidadãos.