Não são todos os artistas que podem se dar ao luxo de ter uma galeria própria e nela expor não só seus trabalhos como também os de outros autores. Mais difícil ainda é fazer com que sua galeria seja considerada uma obra de arte à parte, independente da exposição que esteja acolhendo. Mas o fato é que, com a ebulição do mercado de artes plásticas no Brasil, onde São Paulo figura como principal reduto, as galerias tiveram de ousar para chamar a atenção dos novos consumidores.

No lugar de prédios sem graça, surgem empreendimentos desenhados por arquitetos badalados e até mesmo fachadas servindo de espaço para exposições de arte. É o avesso do que acontece nos descolados bairros SoHo e Chelsea, em Nova York, conhecidos por abrigarem dezenas de galerias umas ao lado das outras. ?Lá, elas são idênticas e, em alguns casos, as pessoas nem percebem que estão passando em frente de uma galeria?, diz Raquel Arnaud, artista e dona da galeria mais antiga de São Paulo, o Gabinete de Arte Raquel Arnaud, criado há 35 anos. Isso, definitivamente, não acontece por aqui.

 

Há cerca de um mês, uma galeria paulistana abriu suas portas apostando na arquitetura como complemento dos trabalhos ali expostos. Trata-se da Galeria Bia Doria, idealizada pela própria artista Bia Doria para expor suas obras, produzidas a partir de madeira morta, raízes, flores e cipós. As esculturas e painéis rústicos contrastam com a modernidade arquitetônica da galeria. Projetada por João Armentano, a fachada foi inspirada em um diamante lapidado. ?Ele via as esculturas e sempre acabava incorporando alguma nos projetos dele.

Também dizia que eu precisava de um espaço para expor meu trabalho?, conta Bia. Quando decidiu criar a galeria, a artista ligou imediatamente para Armentano. ?Ele pensou em algo mais sofisticado para contrastar com as esculturas rústicas?, relembra. Apesar de ter sido projetada especialmente para suas obras, a galeria de Bia também abrigará exposições de outros artistas, como o modernista Orlando Teruz. ?Quero que se torne um espaço cultural?, diz Bia.

 

A relação do artista com a galeria é como uma simbiose, os dois se completam. Por isso, a também paulistana Galeria Vermelho, projetada pelos renomados arquitetos Paulo Mendes da Rocha e José Armínio Cruz, fez questão de transformar a sua fachada em uma espécie de tela ao ar livre. Ou seja, o artista que estiver expondo pode pintar o que bem entender na fachada, usar e abusar da criatividade. ?O grande mérito arquitetônico foi fazer um espaço branco e neutro, que aceite qualquer intervenção?, explica Eliana Finkelstein, proprietária da Galeria Vermelho. A proposta fez tanto sucesso, que muitos artistas querem fazer obras somente para a fachada. Mas Eliana reitera que sempre deve haver uma conexão entre o que está dentro e fora da galeria. ?Tem que ser uma proposta que esteja alinhada com os trabalhos que expomos?, conta. Para a historiadora e crítica de arte Dalva de Abrantes Sério, a ousadia arquitetônica das galerias é um reflexo da diversidade cultural e artística que o Brasil vive atualmente. ?Aqui existe público para todos, principalmente São Paulo, por ser uma cidade cosmopolita que abriga diversas culturas?, afirma. E prossegue. ?Essa diversidade de galerias e espaços pode servir para educar o brasileiro para que ele entenda e aprecie a arte. Quanto mais houver, melhor será.?