Ninguém esconde mais, nem dentro do Governo, nem no Congresso, muito menos entre entidades que pressionam por recursos, o movimento para romper o teto de gastos ou simplesmente desconsiderá-lo, frente às despesas correntes em alta por conta da pandemia. É uma temeridade sem precedentes. São inúmeros os representantes do setor público interessados em manobras que driblem essa regra fiscal. Parlamentares, em tempos de eleição, passaram a exigir mais despesas, projetos custosos, para atender suas bases e arrebanhar votos. O Planalto também faz coro à demanda e quase todas as pastas da Esplanada dos Ministérios, idem. Em campanhas nas redes sociais, inúmeras organizações passaram a pedir a elevação de recursos para a área social, alegando dificuldades devido à crise. O risco por trás dessa mobilização é imenso. As chances de aumento da dívida pública, de descontrole da inflação e dos juros crescem na mesma proporção dessa corrida por recursos públicos. Um diretor do Banco Central aponta que estão querendo “abrir a caixa de Pandora e soltar todos os monstros”. Decerto, sem o teto, o desarranjo econômico virá a galope. As agências de risco, que medem o rating para investimentos em cada país já acenderam o sinal amarelo e começam a manifestar clara preocupação com a possível mudança na política de gastos empreendida com sucesso por tantos anos por aqui. Essas agências temem que o Brasil, nesse caminho, perca por completo as rédeas da disciplina fiscal. A Agência Moody”s, uma das mais tradicionais da praça, diz, por exemplo, que sem o mecanismo da âncora o perfil tributário no mercado interno muda e, assim, também a trajetória da dívida pública pode vir a dar saltos incontroláveis, com inevitáveis repercussões na avaliação sobre a saúde da praça para receber os investimentos externos. É possível reclamar como quiser sobre as análises e conceitos dessas agências de risco, mas o fato indiscutível é que os investidores e senhores do capital global seguem as suas orientações como uma bússola a guiar as apostas. Qualquer desconfiança das agências sobre a capacidade de pagamento dos compromissos do Estado pode levar tudo a perder. Seria um “evento negativo”, nas palavras de um analista, do ponto de vista de rating soberano. De qualquer forma, de uma maneira ou de outra, já começa a se verificar uma fuga aguda e consistente de capitais do Brasil. Nesse último semestre já saíram mais de US$ 31,2 bilhões – valores englobando aplicações em ações, fundos de investimento e títulos da dívida pública. Trata-se da mais volumosa retirada de recursos do País nos últimos 26 anos. Se a regra do teto for realmente quebrada, é de se imaginar uma debandada ainda maior. Melhor evitar.

Carlos José Marques, diretor editorial