Executivo da Gerdau fala dos investimentos de R$ 6 bilhões para diminuir o impacto do aumento de impostos, que afeta a produtividade no País.

A demora no avanço das reformas, especialmente a tributária, está prejudicando a produtividade das empresas brasileiras e afetando a competitividade em relação ao comércio exterior. A avaliação é de Gustavo Werneck, CEO da gigante do aço Gerdau. Para ele, o País também patina no pacote de concessão de infraestrutura. “É quase inevitável que o Brasil tenha crescimento em infraestrutura nos próximos anos, porque não dá mais para conviver com algumas coisas.

O saneamento é um deles”, disse. E justamente para avançar na questão da produtividade, a Gerdau iniciou um ciclo de investimentos, que vai durar cinco anos, de R$ 6 bilhões para expansão da unidade em Ouro Branco (MG), o maior parque industrial da companhia, e ações na modernização e automação. “Já que não vem reformas no Brasil e há um aumento contínuo de imposto, é muito importante que a gente busque alternativas para poder aumentar nossa produtividade.”

DINHEIRO – A Gerdau fechou o segundo trimestre com lucro de R$ 3,9 bilhões, alta de 1.149% sobre o mesmo período de 2020. Quais fatores explicam esse resultado?
GUSTAVO WERNECK — Entregamos neste trimestre os melhores resultados financeiros da companhia em 120 anos de história. Primeiramente, porque o mercado está nos ajudando. E, em segundo, a gente fez muito bem feito nosso dever de casa e se preparou muito para conseguir ganhar dinheiro em um cenário de crise.

Quando fala em lição de casa, o que foi feito?
Lembro que há cinco anos a gente tomou uma decisão muito corajosa de fazer um plano de desinvestimentos muito robusto. Até então, a história da empresa tinha sido só de comprar, crescer e internacionalizar. Essa decisão de vender operações no Chile, na Índia, em parte dos Estados Unidos, nos possibilitou focar em mercados em que a gente é mais relevante. Ao mesmo tempo, demos uma grande enxugada dentro de casa, reduzindo despesas. Enxugamos quase R$ 1 bilhão. E a empresa ficou pronta para poder continuar entregando resultados melhores. E não esperávamos que a recuperação fosse tão rápida. Os mercados onde a gente atua estão muito fortes.

A retomada econômica já aconteceu?
Aconteceu. E, em alguns casos, voltou melhor do que estava antes da pandemia. O mercado vinha recuperando a demanda por aço no Brasil e nos Estados Unidos. O setor de construção, que é muito forte para nós, está num momento muito positivo, com juros baixos e muitos lançamentos. As pessoas também pararam de viajar e começaram a fazer reformas. Esse é um exemplo de segmento que voltou melhor. O que está com dificuldade hoje é o setor automotivo. Existe uma grande falta de semicondutores no mercado. Há veículos com mais de 200 chips. O segmento está com problemas. Mas esse foi um dos únicos. Nos demais setores, os resultados são positivos.

“A infraestrutura ainda não decolou no Brasil. Hoje há um índice de investimentos baixo em relação ao Produto Interno Bruto (PIB)” (Crédito: Lalo de Almeida)

Como o senhor destaca o desempenho no Brasil e nos Estados Unidos?
As duas operações estão muito bem. Batendo recordes de resultados nos dois países em aços planos e longos. Nos Estados Unidos, a demanda está muito grande, porque todos os setores da economia estão em recuperação. A aprovação do pacote de infraestrutura americana vai gerar uma demanda enorme. A perspectiva é muito positiva. Nossas usinas estão trabalhando cheias. A dificuldade é contratar pessoas. O desafio é como preencher as cerca de 400 posições que temos abertas, em um contingente de 5 mil pessoas. Está difícil achar profissionais e há uma entrada mensal de pedidos como a gente não via há muito tempo.

E no mercado nacional?
No caso do Brasil, a gente entende que política e economia descolam um pouco em alguns segmentos. Independentemente da volatilidade, nossos setores estão muito fortes. Os clientes da área industrial estão com muitas oportunidades de exportação. Os de máquinas agrícolas, bens de consumo, equipamentos estão com carteiras grandes de exportação e com compra recorde de aço.

O pacote de concessão de infraestrutura pode ajudar a aumentar as vendas?
A infraestrutura ainda não decolou no Brasil. Hoje há um índice de investimentos baixo em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). Mas a gente começa a ver um crescimento de pedidos a partir da questão do marco do saneamento, de energias renováveis. Há evolução em investimentos de infraestrutura e a gente acha quase inevitável que o Brasil tenha crescimento em infraestrutura nos próximos anos, porque não dá mais para conviver com algumas coisas. O saneamento é um deles. Não há outro caminho.

A Gerdau anunciou recentemente um plano de investimentos de R$ 6 bilhões. O que está incluído neste ciclo estratégico?
Para uma empresa de 120 anos continuar viva é importante aprender com tudo que aconteceu no passado. Um dos grandes aprendizados foi em relação a períodos de investimentos, quando aumentamos muito o endividamento da empresa. E quando veio a volatilidade do mercado, depois de 2014, a gente atingiu um nível alto de dívida e não quer passar por isso de novo. Os investimentos pela frente terão preocupação muito maior com a alavancagem. Os nossos crescimentos nos próximos anos serão muito mais orgânicos do que em aquisições de empresas. Essa é uma mudança importante. São investimentos debatidos e focados em mercados que trazem rentabilidade diferenciada para a companhia. E esse pacote de R$ 6 bilhões está muito relacionado a isso.

E no que o pacote de investimentos vai ajudar a Gerdau?
Principalmente na automação. A gente não enxerga a questão de aumento da produtividade como algo relacionado ao desligamento de pessoas. O que a gente deseja é requalificar essas pessoas. Hoje temos, por exemplo, vagas em aberto para pilotos de drone. Nossa ideia é retreinar profissionais para fazer outras atividades, e não demitir. A fase de implementação desses novos investimentos vai gerar cerca de 6 mil empregos, relacionados à engenharia, tecnologia e para novas linhas de produção. Hoje temos 28 mil funcionários e vamos passar de 34 mil.

Em que região será investido esse valor?
Está muito relacionado a Minas Gerais, onde está nossa maior operação no mundo. Em Ouro Branco (MG), a gente tem um laminador de bobinas a quente e ele trabalha em capacidade máxima. Então vamos colocar uma capacidade adicional de 250 mil toneladas/ano. Na linha de perfis estruturais, que são usados em pontes, viadutos, construções metálicas, estamos com nossa linha de produção lotada. E a gente vai ampliar a capacidade com mais 500 mil toneladas/ano. São investimentos para também poder ampliar nossa rota de produção. Há ainda linhas de recursos para investir na modernização das operações, evoluir para indústria 4.0 e buscar mais produtividade e tecnologia. São feitos com caixa próprio da companhia.

Nada mais de aquisições?
A gente vai continuar olhando a oportunidade de comprar empresas, mas em casos específicos.

O que significa a parceria com a Shell para a construção de um parque fotovoltaico?
Essa é uma das ações para a gente promover o crescimento de energia renovável no Brasil. Esse investimento tem como objetivo aumentar o porcentual de autogeração de energia para a Gerdau. Buscar uma energia mais limpa nos nossos processos produtivos. Se a gente não tivesse colocado o tema sustentabilidade ao longo dos anos, não teria chegado até aqui. Hoje foi tudo empacotado no que se chama de ESG, mas já está presente aqui há muito tempo. As empresas têm que assumir esses compromissos. E esse assunto é estratégico para a Gerdau.

“Se a gente não tivesse colocado o tema sustentabilidade ao longo dos anos, não teria chegado até aqui. Esse assunto é estratégico” (Crédito:Istock)

O senhor falou em perda de produtividade. O quanto isso tem sido uma preocupação da gestão da empresa?
Quando comparamos nossas operações no Brasil com as americanas, ao longo dos últimos 15 anos, o aumento real de remuneração vem acompanhado do aumento de produtividade. No Brasil isso não acontece. O custo de pessoal vem subindo e nossa produtividade não consegue acompanhar. Já que não vem reformas no Brasil e há um aumento contínuo de imposto, é muito importante que a gente busque alternativas para aumentar nossa produtividade.

A questão tributária então é um problema?
Sim. Tem 15 anos nos Estados Unidos que temos sete pessoas lidando com tributos. No Brasil, todo ano precisamos contratar mais gente, porque só complica. São 122 pessoas trabalhando com tributos aqui. Isso vai tirando a produtividade. E poder melhorar essa questão é fundamental para a gente poder competir globalmente.

Então o senhor não acredita no andamento das reformas no Brasil?
Eu continuo acreditando, mas essa agenda de reformas precisa voltar a ser priorizada. As reformas que foram feitas até então ajudaram empresas exportadoras, como a reforma trabalhista e a de terceirização. Foram muito importantes. Só que tem uma série de reformas que precisam ser feitas, especialmente a tributária. Essa perda de foco está sendo prejudicial. A Gerdau continua acreditando, mas o nosso desejo é que rapidamente os atores envolvidos possam voltar a criar uma agenda positiva de transformação para o Brasil. Está ficando cada vez mais difícil para nós poder competir globalmente.