Uma coisa é nascer startup e se reinventar a todo momento. Outra é ter 80 anos. O maior desafio entre empresas consolidadas é criar – e manter – uma cultura de adaptação e inovação. “Líderes empresariais de todo o mundo estão procurando administrar a incerteza”, afirmou Bill Thomas, chairman global e CEO da KPMG, ao apresentar o estudo 2020 CEO Outlook Covid-19 Special Edition. Ele resumiu cirurgicamente a nova era corporativa: tudo está em transformação, e em altíssima velocidade. O que acaba sendo ainda mais desafiador nas companhias com raízes profundas, que tendem a arriscar menos. No caso do Grupo Mat isso aparentemente nunca foi um problema. “Não se trata de idade. É tudo questão de mentalidade”, afirmou Luiz Fernando Gennari Assaf, diretor-presidente da Mat. E esse espírito versátil e adaptável foi responsável por fazer a empresa crescer dois dígitos em faturamento no ano passado sobre o resultado de 2019. As receitas subiram 29%, para R$ 160 milhões.

Maior fabricante de cilindros das Américas, a companhia tem um portfólio de oito produtos – quatro predominam (Automotivos, Bebidas, Industriais e Medicinais). A performance de nenhum deles foi idêntica em share nos últimos dois anos. Um exemplo resume essas variáveis e o modus operandi da Mat. Entre abril e junho do ano passado, toda a linha destinada ao segmento automotivo desabou em vendas por causa do lockdown. A produção, que no primeiro trimestre de 2020 se aproximou de 6,3 mil unidades (média de 2,1 mil por mês), caiu 79% no segundo trimestre, para 1,3 mil (média mensal de 439 unidades). Em abril, foram míseros 57. A saída para a encrenca? Mudar totalmente o foco. E bombar a oferta do segmento de saúde. “Em maio e junho direcionamos quase 100% da produção para cilindros de oxigênio”, disse Assaf. A regra é simples. O que o mercado demanda, a Mat atende.

E foi assim desde o início, em 1940, no Rio de Janeiro, então capital federal. Fundada pelo alemão Peter Sochaczewski, pai da atriz Renata Sorrah, a empresa nasceu para produzir extintores. Com oito anos de vida decidiu expandir o leque e passou a representar no País veículos e equipamentos de combate a incêndio. Foi pioneira ao trazer para o Brasil o primeiro caminhão de bombeiros equipado com escada Magirus. Mais oito anos e passou também a fabricar cilindros para acondicionar gases sob alta pressão, o que acabou virando o core. A partir daí surgiram as linhas hospitalar, na área da alimentação – Assaf gosta de dizer que “cada vez que você toma um chope tem um cilindro nosso ali” – ou para o clássico kit gás que tomou conta de boa parte das frotas profissionais de veículos no Brasil.

Na companhia hoje sediada na cidade de Jundiaí (SP) existe uma natural vocação para se moldar a diferentes situações e se adaptar a novos mercados. “A Mat não é muito grande [por número de funcionários, 300, ela é de médio porte], mas está entre as poucas de seu tamanho que conseguem sobreviver por tanto tempo”, afirmou Assaf. Ele acredita que essa seja a maior característica da marca. “A capacidade de se reinventar, se recriar e se adaptar a quaisquer situações que se apresentam para nós.” Para tanto, a inovação é a força motriz. Nos últimos cinco anos, os investimentos somaram R$ 18 milhões. E o modelo de produção foi totalmente reestruturado. A empresa adotou o conceito de manufatura enxuta, o Lean Manufacturing – conhecido por Modelo Toyota, baseado em redução de desperdícios. “Nossa produção ficou mais rápida, enxuta, e flexível.” A quantidade de cilindros fabricados cresceu 22% entre 2019 e 2020. Fechou o ano com 242 mil unidades.

O executivo destaca que curiosamente a pressão pela adoção de novos conceitos partiu da área financeira. “É um processo industrial, mas o demandante é o time financeiro”, disse. “Com produção mais acelerada, o dinheiro acaba voltando rapidamente, melhorando o fluxo de caixa.” O que inclui a administração da agenda exportadora – 40% da receita de 2020 saiu do canal de exportação. Por tabela, isso minimiza riscos regionais e sazonais. “Quando você tem um leque de mercados diferentes consegue uma estabilidade muito grande, além de manter parte importante da receita em moeda forte, em dólares ou euros.” Com uma história que migrou de apagar incêndio a colocar pressão, a Mat segue com sua alma adolescente rumo ao centenário.

Luiz Fernando Gennari Assaf é administrador de empresas e preside a Mat há nove anos

Luiz Fernando Gennari Assaf (Crédito:Eduardo Medrano)

A Mat é… uma multinacional brasileira com mais de 80 anos, referência e líder nas Américas na produção de cilindros para gases à alta pressão.

A missão da empresa é… prover soluções de armazenamento para gases.

O próximo passo será… a continuidade do nosso plano de internacionalização e o lançamento de novas linhas de produtos. Temos projetos voltados à área energética, mas ainda aguardando a recuperação da economia.

Nossa meta é… crescer 15% em 2021.

A tecnologia será disruptiva… em processos produtivos e gerenciais, o que permitirá ganhos de produtividade significativos. Com a pandemia, a transformação tecnológica foi muito acelerada. Da noite para o dia, um arcabouço tecnológico teve de ser colocado de pé de maneira muito rápida dentro das empresas. Nada disso será revertido.

A próxima tendência será… uma revolução tecnológica focada em estratégias ESG. Nossa sociedade tem uma enorme dívida ambiental e as soluções futuras buscarão ser cada vez mais sustentáveis.

As palavras que definiram 2020 foram… resiliência e flexibilidade.

A frase que definirá 2021 será…“Já tomou a vacina?”

Seu lema de vida é… deixar um legado positivo.

Como legado você pretende… contrariar os pessimistas.