Durante anos, a empresa curitibana Positivo liderou o mercado brasileiro de computadores enfrentando gigantes internacionais, como as americanas HP e Dell e a chinesa Lenovo. A desaceleração das vendas de PCs, que estão em queda livre nos últimos tempos, colocou em xeque a estratégia da companhia. No ano passado, por exemplo, foram vendidos 4,5 milhões de desktops e notebooks no Brasil, o pior resultado dos últimos 13 anos. Em vez de esperar um retomada do setor, a Positivo está fazendo uma transição que parecia impensável há dois anos. A fabricante brasileira está em meio a uma estratégia de diversificação para reduzir sua dependência dos computadores.

A primeira aposta foi em celulares, em 2014. Dois anos depois, entrou na área de equipamentos de saúde ao comprar 50% da startup Hi Technologies. “Previmos que o mercado de computadores passaria por uma queda”, diz Hélio Rotenberg, fundador e presidente da companhia. Os primeiros resultados já podem ser comemorados pela Positivo. No primeiro trimestre de 2017, os celulares representaram um terço da receita líquida da companhia, atingindo R$ 147,7 milhões. Individualmente, os smartphones já superaram desktops e notebooks, que ainda estão perdendo mercado (confira quadro “Alô, alô”).

O celular Quantum e o Hilab são dois produtos em que a positivo aposta (Crédito:Divulgação)

As vendas de celulares inteligentes atingiram 357 mil unidades, crescimento de 86% nos três primeiros meses desde ano, quando comparados com o mesmo período do 2016. Com isso, a Positivo chegou a uma fatia de 3,5% de mercado, segundo dados da consultoria paulistana IT Data. Há dois anos, detinha pífios 0,5%. Atualmente, está atrás apenas da coreana Samsung, da chinesa Lenovo/Motorola, da coreana LG e da americana Apple. “Acredito que a Positivo vai mudar o foco dela nos próximos anos”, diz Ivair Rodrigues, diretor de pesquisas da IT Data. Entre os investimentos, destaque para a criação da Quantum, marca que nasceu como uma startup dentro da própria Positivo.

O projeto ganhou vida em 2015, quando dois funcionários, Vinícius Grein e Thiago Miashiro, além de Marcelo Reis, que havia deixado a empresa, se juntaram e apresentaram a ideia do desenvolvimento de uma marca de aparelhos com configurações mais robustas e preços acessíveis para Rotenberg. Com produtos que custam até R$ 1.500, a Quantum consegue disputar mercado com smartphones considerados “intermediários premium” – que em geral saem por volta de R$ 2.500 – de marcas como Samsung, LG, Sony e Apple. Além da Quantum, a Positivo também tem a sua própria marca de smartphones, cujo objetivo é atender o mercado de entrada, com preços que ficam abaixo de R$ 1 mil. A companhia também investe nos chamados features phones, celulares de baixo custo que não possuem acesso à internet.

Seguindo o exemplo das gigantes do Vale do Silício que saem à caça de startups dos mais variados setores, a companhia de Rotenberg adquiriu 50% da startup Hi Technologies, também de Curitiba, que desenvolve dispositivos médicos. No mês passado, a empresa lançou o HiLab, um aparelho portátil que funciona como uma espécie de laboratório ambulante e realiza exames como HIV, dengue, zika, hepatite, entre outros, em questão de minutos e com custo mais baixo. “Havíamos recebido sondagens de outras empresas e tínhamos ofertas, mas a Positivo apresentou um projeto mais interessante e fechamos com eles”, afirma Sérgio Rogal, um dos cofundadores da empresa ao lado de Marcus Figueiredo. “Além dos investimentos, a Positivo nos auxilia muito na parte jurídica, contábil e de recursos humanos.”

Com previsão de distribuir 10 mil unidades do Hilab em consultórios, postos de saúde, farmácias e hospitais até o fim do ano de forma gratuita, a empresa espera realizar cerca de 1 milhão de exames mensalmente. Se atingir esse objetivo, o faturamento mensal é estimado em R$ 10 milhões. A diversificação da Positivo passa também pela sala de estar. Mas, ao contrário de gigantes da tecnologia que estão apostando em alto-falantes inteligentes, como o Echo, da Amazon, ou o Home, do Google, a fabricante de Curitiba aposta em algo mais trivial: conversores de tevê digital. No primeiro trimestre deste ano, os equipamentos foram responsáveis por uma receita bruta de R$ 73 milhões.

Celular: (da esq. à dir.) Vinícius Grein, Thiago Miashiro e Marcelo Reis criaram a Quantum quando trabalhavam na Positivo (Crédito:Fernando Dias)

O próximo mercado em que a Positivo deve apostar é o de segurança particular, como câmeras e alarmes, segundo apurou a DINHEIRO. Questionada sobre possíveis novos investimentos, a Positivo não quis comentar o assunto.
As empresas de tecnologia, há tempos, investem para não depender exclusivamente de um produto. A Apple, que também começou com computadores, hoje conta com quase dois terços de sua receita vindo do iPhone. A Dell, que já foi líder global de PCs, comprou a EMC, por US$ 67 bilhões, para investir em sistemas de armazenamento. A Microsoft joga suas fichas na computação em nuvem, à medida que observa suas receitas com Windows e Office diminuírem. Amazon, Google e Facebook não escondem que apostam em projetos de inteligência artificial, internet das coisas e realidade virtual.

É a velha estratégia de não colocar todos os ovos na mesma cesta para conseguir enfrentar os tempos de vacas magras. A própria Positivo já tentou, no passado, apostar em outros produtos. Um deles foi o leitor de livro digital Alfa, em uma estratégia para competir com o Kindle, da Amazon, mas que não vingou. A companhia também estudou fabricar tevês, mas não levou o projeto adiante – uma decisão que, em retrospectiva, foi acertada, pois muitas empresas abandonaram a área por não conseguir enfrentar Samsung e LG. Os desktops e notebooks ainda são o carro-chefe da companhia. No primeiro trimestre de 2017, eles representaram 50% da receita. Mas se não tivesse apostado em outras áreas, a Positivo seria uma empresa da metade do tamanho atual.