Três brasileiros estão na lista de 2017 dos 50 negros mais influentes do mundo, com menos de 40 anos: os atores Taís Araújo e Lázaro Ramos e a empresária Adriana Barbosa, criadora da Feira Preta, o maior evento brasileiro de cultura e empreendedorismo negro. Para participar da homenagem promovida pela organização Mipad (Most Influential People of African Descent), que aconteceu no final de setembro, em Nova York, Adriana deu início a um financiamento coletivo na plataforma Kickante. Preocupado com o sucesso da iniciativa e com a variação dos preços das passagens aéreas e da hospedagem, Theo van der Loo, presidente da multinacional Bayer no Brasil, usou seu cartão de crédito pessoal para garantir a viagem da empreendedora.

“Ele disse que era um adiantamento”, diz ela. “Mas, quando fui devolver, o Theo falou que era uma doação para os meus projetos.” A atitude surpreendeu Adriana, que se aproximou dele pelo LinkedIn. Ela acompanhava os posts dele sobre diversidade de raça e decidiu escrever, não em busca de investimento, mas de mentoria. “O Theo é acessível, compreensivo e um não negro que sabe que não é o protagonista, mas um aliado”, diz ela. “Ele decodifica para o mundo corporativo essa reflexão da diversidade e mostra para conselheiros e gestores que há um valor de competitividade além do impacto social.”

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Van der Loo tem influenciado outros executivos ao participar com frequencia de eventos sobre a diversidade e dividido sua experiência com outras empresas. “Se a diversidade fosse um tema simples, eu não estaria falando sobre ela”, diz ele. O executivo está longe de ser um aventureiro no tema. Ainda no final dos anos 1980, como diretor de marketing da empresa alemã de produtos farmacêuticos Schering AG (adquirida pela Bayer em 2010), ele percebeu que, embora os produtos fossem direcionados à saúde da mulher, toda a equipe de vendas era formada exclusivamente por homens. Van der Loo contratou a primeira vendedora para Minas Gerais. A representante foi um marco. Hoje, mais da metade dos vendedores dos produtos farmacêuticos são mulheres. Da mesma maneira, ele ordenou que as propagandas fossem multiétnicas. “Comecei a trabalhar com o Theo há 13 anos e a primeira revista da comunicação interna que mostrei foi vetada por ele por só ter brancas nas fotos”, afirma o diretor de comunicação Paulo Pereira. “A inclusão sempre foi um tema presente para ele.”

Ao assumir a presidência da Bayer, em 2011, Van der Loo sentiu que precisava colocar a diversidade como um propósito da subsidiária brasileira. Ele trouxe o Blend para o Brasil, uma iniciativa global de inclusão sexual no ambiente de trabalho. O gerente de TI, Douglas Santos, é um integrante do grupo mundial, que tem 300 participantes. Com a matriz alemã, ele explicou que precisava, também, de um projeto de inclusão racial. “Eles não entenderam, pois não tinham essa necessidade lá. Mas não colocaram barreiras”, diz ele, que deu início a encontros com lideranças negras para entender o que era preciso fazer e qual é o limite de interferência de um branco. Com isso, percebeu que ainda existe preconceito com o negro no mercado de trabalho. E começou a promover uma mudança interna, sendo pró-ativo e dando o exemplo. “A Bayer não é um mundo perfeito. É preciso fazer muito mais”, afirma Van der Loo, que tem a meta de ter 20% de afrodescendentes na empresa. Hoje, menos de 5% estão nos escritórios.

A explicação para as atitudes do executivo vem de sua origem. Nascido em São Paulo, o descendente de holandeses Theo van der Loo traz as marcas da II Guerra Mundial na sua formação. São traumas e valores familiares que ele aprendeu com os pais, já falecidos. Theo, o pai, foi preso na Indonésia, pelos japoneses, e passou três anos de escravidão ao ser forçado a construir a ponte sobre o rio Kwai, na Tailândia. A mãe Joana morava em Roterdã e viu a cidade sucumbir a um bombardeio de 15 minutos. No Brasil, passaram a ajudar as pessoas que estavam em dificuldade, independentemente da classe social e da raça. Embora privilegiado, Van der Loo cresceu nesse ambiente de que é preciso olhar as pessoas que estão a sua volta. “Muito do que faço é um processo intuitivo. Sou genuíno e mostro emoção e sentimento”, diz Van der Loo. “Não é preciso coragem. É preciso estar atento à inclusão e apenas fazer o que é certo.”

Van der Loo não é um fenômeno das redes sociais, mas faz barulho com suas publicações. Com pouco menos de 22 mil seguidores no LinkedIn, seu post “Não entrevisto negros”, publicado no final de março deste ano, ultrapassou as 550 mil visualizações. Nele, o presidente da Bayer conta que um conhecido afrodescendente, com boa formação e currículo, foi destratado numa entrevista de emprego por razões étnicas. Ele, então, sugeriu fazer uma denúncia, mas se surpreendeu com a resposta: “Posso queimar minha imagem. Sou de família simples e humilde e custou muito para chegar onde cheguei”. Num País em que mais da metade da população é formada por negros e pardos, Van der Loo usa a sensibilidade para mostrar que ainda é preciso quebrar preconceitos e discutir, com coragem e respeito, a riqueza da diversidade.


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