Uma caminhada entre o Salão Verde da Câmara dos Deputados e a entrada do Palácio do Planalto, em Brasília, não dura muito mais do que dez minutos. Nos últimos dias, inúmeros parlamentares têm percorrido esse trajeto a convite do presidente Michel Temer, que assumiu, definitivamente, a articulação política para aprovar as grandes reformas. Na noite de 26 abril, o sinal amarelo piscou no gabinete presidencial, apesar de a base governista ter aprovado a reforma trabalhista.

O problema é que foram apenas 296 votos a favor, 12 a menos do que o mínimo necessário para passar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Previdência Social. Embora a greve geral realizada dois dias depois não tenha angariado tanto apoio popular, o governo avaliou que a pressão para que os deputados rejeitem as reformas tenderia a crescer, o que poderia dificultar ainda mais a busca por apoio parlamentar. Naquele momento, Temer decidiu entrar no jogo político com a braçadeira de capitão.

A primeira ação do presidente da República, após as manifestações convocadas pelas centrais sindicais, foi barrar as indicações políticas dos deputados infiéis, que votaram contra as mudanças na legislação trabalhista. “A moeda que o governo tem é cargo”, diz o consultor político Gaudêncio Torquato, um dos conselheiros de Temer. “No presidencialismo de coalizão é assim: quem é governo tem de votar a favor; quem é oposição vota contra.”

Na segunda-feira 1o de maio, Dia do Trabalho, o núcleo político e econômico se reuniu no Palácio da Alvorada para traçar a estratégia em relação à reforma da Previdência, considerada a mais difícil de todas. No estilo casual, sem gravata, o presidente Temer recebeu os ministros da Fazenda, Henrique Meirelles; da Casa Civil, Eliseu Padilha; da Secretaria de Governo, Antônio Imbassahy; da Educação, Mendonça Filho; e da Secretaria Geral da Presidência, Moreira Franco, além do secretário de Previdência do Ministério da Fazenda, Marcelo Caetano, e do porta-voz da Presidência, Alexandre Parola.

Do Congresso Nacional, foram o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ); o líder do governo no Senado, senador Romero Jucá (PMDB-RR); o líder do governo na Câmara, deputado Agnaldo Ribeiro (PP-PB); e o relator da reforma da Previdência, deputado Arthur Oliveira Maia (PPS-BA). Embora tenha 411 deputados em sua base de sustentação legislativa, o governo trabalha com uma meta de angariar 320 votos para colocar a PEC da Previdência Social em votação no plenário da Câmara, no fim de maio ou no começo de junho.

Quatro partidos aliados (PSB, Solidariedade, Pros e PHS) já orientaram suas bancadas contra a proposta. Na noite da quarta-feira 3, após mais de 10 horas de discussões, o texto-base da reforma foi aprovado na comissão especial da Câmara, com 23 votos a favor e 14 contra – eram necessários 19 votos. O presidente da República celebrou o placar e ficou em “estado de graça”, segundo o ministro Imbassahy.

Temer ressaltou a compreensão da população sobre a importância da proposta, que prevê, dentre vários itens, idade mínima para se aposentar de 62 anos para mulheres e 65 anos para homens, além de 25 anos de contribuição. “O número de votos favoráveis recebidos na comissão demonstra o reconhecimento da sociedade brasileira quanto à necessidade e à urgência de reformar o sistema previdenciário no Brasil”, afirmou o porta-voz Parola, logo após a sessão.

A votação de 10 destaques, que podem alterar pontos cruciais da reforma, só ocorrerá na terça-feira 9. “As negociações continuam”, afirma o relator Maia, salientando que os últimos ajustes acontecerão nos próximos dias. Até agora, na avaliação da equipe econômica, as concessões do governo ao texto original já comprometeram 24% da economia prevista para os próximos 10 anos, reduzindo a cifra de R$ 793 bilhões para R$ 604 bilhões. “O projeto como está não pode ser fundamentalmente alterado”, afirmou Meirelles, na quinta-feira 4. Por isso, a ordem de Temer é conter a pressão de grupos de interesse.

Os privilegiados do serviço público não dão trégua e choram cada vez mais alto para, obviamente, continuarem mamando. Na terça-feira 2, agentes penitenciários invadiram o Ministério da Justiça para protestar. A indignação da categoria aumentou no dia seguinte, quando o relator Maia anunciou que os policiais legislativos terão os mesmos benefícios dos policiais federais, que poderão se aposentar aos 55 anos (leia quadro “A regra geral da Previdência Social…”).

Embora o impacto fiscal seja ínfimo – são apenas 500 policiais legislativos –, a nova exceção revoltou os agentes penitenciários, que invadiram a sessão da comissão especial, interrompendo a votação dos destaques. A gritaria mais estridente vem dos servidores públicos, que querem o direito à integralidade (aposentadoria com o mesmo valor do último salário) e à paridade (reajustes das aposentadorias iguais aos concedidos aos funcionário ativos).

CARTAS NA MANGA Com margem mínima para flexibilizar o texto da reforma da Previdência, o governo pode negociar algum benefício na reforma trabalhista, cujo texto já foi aprovado na Câmara dos Deputados e, agora, será debatido no Senado Federal. Um dos itens caros às centrais de trabalhadores é o fim do imposto sindical, que pode virar moeda de troca. “É possível que o presidente Temer possa negociar com as centrais sindicais um período de transição de 4 a 5 anos para o fim da contribuição sindical obrigatória”, diz o consultor Torquato. “Isso pode ser uma carta na manga.”

Outra moeda de troca é a negociação com a bancada ruralista para criar um programa de parcelamento de 15 anos para dívidas em atraso da contribuição ao Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural. O novo Refis, que envolve um passivo de R$ 10 bilhões, teria desconto de juros e das multas. A missão é tão complexa que o próprio PMDB, partido de Temer, tem dissidentes. O caso mais emblemático é o do senador alagoano Renan Calheiros, líder do partido no Senado, que se aliou a petistas para combater as reformas propostas pelo governo.

Na quarta-feira 3, Renan se reuniu com sindicalistas e foi chamado de “o cara” pelo senador Paulo Paim (PT-RS) e ouviu elogios da paranaense Gleisi Hoffmann, líder do PT na Casa. Em entrevista à DINHEIRO, o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, fundador do MDB, em 1966, avalia que o PMDB deveria fechar questão em torno das reformas. “É muito importante que haja, sim, se for o caso, até o fechamento de questão para que a gente possa ter as votações com mais solidez e os parlamentares sintam-se confortáveis para votar um tema que é um pouco complexo”, afirma Padilha.

“Na medida em que o partido tenha fechado questão, o parlamentar tem de seguir o seu partido e aí a gente cria um conforto para o parlamentar e, ao mesmo tempo, dá mais solidez à posição do partido.” Por enquanto, sem essa certeza nem mesmo da sua própria sigla, o PMDB, o presidente da República mandou, na quarta-feira 3, um recado para a base aliada: “Renovem seu empenho com agenda de reforma a fim de que seja garantida a aprovação.” Não é coincidência que a sua agenda oficial estampe, diariamente, encontros com parlamentares. A busca por votos é prioridade absoluta para Temer, o articulador.

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“Os empresários esperam que o Congresso e o Judiciário não fiquem paralisados”

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O presidente da GE do Brasil, Gilberto Peralta, concedeu entrevista à DINHEIRO ao participar de evento do Grupo de Líderes Empresariais (Lide), na capital paulista

O pior da crise já passou?
Acho que o País se estabilizou do ponto de vista econômico. A tendência é que, daqui para frente, os sinais de melhoria apareçam. Não estou ainda com muito otimismo. Para a nossa infelicidade, a influência dos outros fatores em volta é muito grande. A economia não caminha sozinha. Ela caminha acompanhada da política.

E se o ambiente político inviabilizar a aprovação das reformas?
Se as reformas não passarem, atrapalhará muito o quadro econômico.

O que os empresários esperam do Congresso Nacional?
Os empresários esperam que o Congresso e o Judiciário não fiquem paralisados e que façam o trabalho deles. Acho que o Judiciário tem feito um trabalho muito bom. O juiz Sergio Moro é um bom exemplo, mas não pode ser só ele. O Congresso também não pode ficar paralisado. Tem muita coisa para ser feita e o momento exige isso. Um País do nosso tamanho não pode errar.

Como a matriz enxerga o Brasil?
Continuamos confiando que o Brasil é maior do que os seus problemas. Estamos aqui há 96 anos e não vamos sair. Não paramos nenhum investimento previsto antes da crise. É claro que a crise dificulta um pouco a decisão de adicionar investimento.