Ser exceção faz parte da trajetória profissional da executiva Tânia Cosentino. Quando universitária, ela era uma das poucas mulheres a cursar a graduação em engenharia elétrica pela Faculdade de Engenharia de São Paulo. O percentual de mulheres em cursos de ciências exatas ainda é inferior a 20%. A passagem da faculdade para o mercado de trabalho não mudou a realidade de Tânia, que continuou num ambiente predominantemente masculino. Sua carreira foi construída na indústria elétrica, sendo os últimos 17 anos na Schneider Electric. Em sua trajetória executiva, Tânia continuou nadando contra a maré e destacou-se em áreas consideradas tabus no universo corporativo.

No fim de setembro deste ano, ela foi a única mulher latino-americana e uma das três mulheres reconhecidas pela Organização das Nações Unidas (ONU) pelo seu trabalho em defesa da sustentabilidade. Todo ano, o Pacto Global da ONU celebra um grupo de líderes de negócios que têm sido exemplo para toda a comunidade por seu trabalho em prol dos avanços dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. “Tânia tem desenvolvido, de maneira impactante, soluções diferenciadas e sustentáveis para a redução da emissão de carbono”, disse Lise Kingo, CEO e diretora executiva do Pacto Global da ONU. “Ela tem sido pioneira no avanço sustentável do gerenciamento de energia.”

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A visão pró-sustentabilidade e inclusiva acompanham Tânia desde sua formação. Ao assumir a presidência da Schneider Electric no Brasil, em 2009 (quatro anos depois ela ascendeu ao principal cargo da América do Sul), a executiva sentiu a falta de mão de obra qualificada no setor de energia. Para colocar em prática projetos mais inovadores, ela identificou que precisaria melhorar a qualificação do mercado de trabalho. Sem perder tempo, criou um projeto, em parceria com o Senai, voltado para a qualificação profissional, que beneficiaria tanto a sua empresa como as concorrentes. Ao longo de quatro anos, o projeto de Tânia ajudou a formar 30 mil jovens no Brasil. Ela percebeu que o sucesso do programa poderia ser revertido para os negócios.

A executiva planejou a expansão da empresa, para outras regiões do País, num modelo de parcerias que poderiam garantir acesso à energia elétrica em lugares afastados, de pouca infraestrutura. Em 2012, por meio da energia solar, ela conseguiu entregar energia elétrica para populações ribeirinhas do Rio Negro, no Amazonas. Antes desse programa, as comunidades tinham apenas quatro horas diárias de eletricidade. Com a iniciativa, as comunidades tiveram acesso a eletrodomésticos, como refrigeradores menos poluentes. “Apresentamos o projeto na reunião do Rio+20, no Rio de Janeiro, e mostramos a realidade de parte da população brasileira”, diz Tânia. “O setor privado nunca vai substituir o governo, mas pode contribuir por meio de ações para liderar e formular políticas públicas para eliminar a pobreza até 2030, como o proposto pela meta da ONU.”

A principal característica de Tânia é a mobilização, tanto de sua própria equipe, como de outras empresas. Ela tem sido uma voz ativa da sustentabilidade e da necessidade do trabalho em conjunto para que o Brasil consiga atingir baixas emissões de carbono. Como exemplo, Tânia utiliza a gestão transformadora que promoveu na Schneider Electric, que tem como principal negócio o gerenciamento de energia elétrica. Ela elaborou um programa de controle para as emissões de CO2 e convenceu sua equipe a trabalhar com afinco para atingir as metas.

Embora existissem projetos da companhia voltados para o controle do efeito estufa no Brasil, os programas socioambientais ganharam impulso com as ações da executiva. “A Tânia é o exemplo de líder que tem uma estratégia, desenvolve e faz com que tudo aconteça dentro da companhia. Ela consegue integrar e fazer com que todos tenham vontade de participar”, diz Reinaldo Bulgarelli, sócio-diretor Txai Consultoria e Educação. “Às vezes, existem presidentes que querem implementar algum projeto, mas os funcionários não aderem. A Tânia tem um cuidado imenso em conseguir integrar todos.” Tânia é pró-ativa no desenvolvimento de projetos, mas também sabe aproveitar os programas implementados pela matriz francesa, que registrou faturamento global de € 24,7 bilhões, em 2016.

Atualmente, existem seis projetos socioambientais e socioeconômicos sendo trabalhados pela subsidiária brasileira. Em alguns casos, o Brasil virou modelo para outros países, como na diversidade de gênero e LGBT para os funcionários. Signatária do Fórum LGBT e do programa HeForShe (ElesPorElas), da ONU, o trabalho de diversidade da Schneider Eletric realizado no País foi copiado nos países vizinhos. Tânia criou uma meta de recrutamento de mulheres e uma meta de equiparação salarial. “Não trabalhávamos o tema de diversidade muito bem no Brasil e na América do Sul”, diz a executiva. “Há quatro anos, eu chamei o pessoal e começamos a desenvolvê-lo. Hoje, o modelo brasileiro serve como espelho para a América do Sul.” Entre as 265 maiores empresas que atuam no País, Tânia é exceção: ela faz parte dos 3% de mulheres presidentes, segundo a consultoria Bain&Company.

Correção: a primeira versão dessa reportagem grafou incorretamente o nome da Schneider Electric. O projeto de qualificação profissional foi desenvolvido pelo Senai e não pelo Sebrae. As informações estão corrigidas


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