Quando um usuário se depara com as maravilhas da realidade virtual, ele costuma pensar em novas formas de se jogar um vídeo game, de assistir a um filme e, bem, em pornografia também.

Mas uma variedade de projetos apresentados com esta tecnologia no Festival de Sundance tem em comum um objetivo mais altruísta: salvar o planeta.

As mudanças climáticas são o foco deste encontro de cineastas independentes e cinéfilos nas montanhas de Utah (oeste dos Estados Unidos) e há várias experiências de realidade virtual (VR, na sigla em inglês), além dos já habituais filmes e documentários.

Um dos mais impressionantes é “Under the Canopy” (Sob as copas das árvores, em tradução literal), sobre a preservação da Amazônia e centrado nas comunidades mais afetadas pelo desmatamento.

Desenvolvido pela ONG Conservation Internacional (CI) e o desenvolvedor de conteúdo Jaunt VR, a produção de 15 minutos conduz o público pela selva, guiado por Kamanja, membro da tribo Trio, do Suriname.

Com um visor especial, é possível ver tudo ao redor, enquanto se ouve a explicação do guia: para cima, a cobertura das árvores na floresta e pelo caminho, preguiças e sucuris, reforçando a importância vital deste hábitat para o futuro da humanidade.

“Nem todo mundo pode ir à Amazônia, é caro, é complicado, e a VR nos dá a oportunidade de levar as pessoas para lá, fazer uma conexão com o povo que está ali”, explicou o chefe de marketing da CI, Jamie Cross, durante uma demonstração da tecnologia.

A Amazônia, a maior floresta do planeta, produz 20% do oxigênio que respiramos e é a casa de 10% das espécies do mundo, sem mencionar os 30 milhões de pessoas que vivem ali.

Contudo, 15.000 km2 – 10 vezes a Cidade do México – são perdidos por ano com a expansão da agricultura, do crescimento urbano e a extração de recursos naturais.

Pesquisadores da Universidade da Geórgia, de Connecticut e Stanford coincidem em que experiências de realidade virtual aproximam as pessoas dos problemas e se tornam mais empáticas.

Outro estúdio de VR focado em desmatamento é o nova-iorquino “Here Be Dragons”, que fez uma imersão na vida total de uma árvore, desde que é plantada até ser cortada pelo homem.

Compaixão

O foco destas produções não é apenas o desmatamento.

Fundado pelo premiado cineasta americano-cingapuriano Danfung Dennis, Condition One desenvolveu “Melting Ice” (Degelo, em tradução literal), que transporta o público às geleiras em risco.

É uma peça complementar na noite de estreia de “An Inconvenient Sequel: Truth to Power” (“Uma sequência inconveniente: verdade ao poder”), do ex-vice-presidente americano Al Gore.

O documentário é a continuação do filme “Uma verdade inconveniente”, documentário ganhador do Oscar em 2016.

De pé sobre uma geleira que desmorona, ao lado de rios revoltos de gelo derretido e sob os efeitos do aumento do nível do mar, os espectadores são testemunha dos sinais do futuro precário da Terra.

Para capturar a paisagem encantadora, porém instável, Denis filmou na Groenlândia usando parafusos de gelo para se prender nas geleiras com sua câmera VR de 360 graus.

“Pela primeira vez somos capazes de capturar essas experiências subjetivas, é um passo para de colocar no lugar do outro”, disse à AFP.

“Com essa habilidade, temos formas poderosas de invocar empatia e compaixão nos outros, que talvez possam ser, inclusive, muito diferentes de nós”, acrescentou.

A VR continua sendo uma novidade, mas seus defensores dizem que a tecnologia avança rapidamente e esperam que 2017 seja um ano crucial.

A taiwanesa HTC concorre com seu dispositivo Vive VR, o PlayStation VR e o Oculus Rift do Facebook. Todos impulsionam seus desenvolvedores a refinar cada vez mais suas plataformas.

Recentemente, a HTC anunciou um fundo de 10 milhões de dólares para criadores de realidade virtual (para qualquer sistema) que destaquem os problemas de sustentabilidade no mundo.

“A VR está em um momento incipiente em sua distribuição, será um desenvolvimento lento, antes de se tornar um mercado de consumo de massa”, disse Dennis.

“Mas vai acontecer, acho que esta é a próxima plataforma informática, o próximo meio de comunicação”, afirmou.