O secretário-executivo do Ministério da Agricultura, Eumar Novacki, preferiu não apontar um culpado no Brasil para a suspensão, pelos EUA, das importações de carne bovina in natura. A medida, anunciada na quinta-feira, 22, pelo secretário do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), Sonny Perdue, afeta 15 frigoríficos brasileiros. Oficialmente, o Ministério da Agricultura brasileiro diz que o problema de abscessos na carne, identificado pelos EUA, é decorrente de problemas da vacinação dos bovinos contra a febre aftosa. A pasta investiga agora por que a imunização provocou os abscessos.

“Tivemos problema semelhante no Chile em novembro e a orientação aos frigoríficos foi de fatiar a carne (ainda no frigorífico, em porções) para resolver”, disse Novacki, em entrevista coletiva nesta tarde de sexta-feira, 23. Com o fatiamento, as partes com abscessos ficam à mostra mais facilmente e são descartadas. “Vamos, porém, investigar as vacinas e avaliar sua conformidade e os procedimentos adequados”, disse. “Temos interesse em reportar todos os problemas de forma transparente. Mesmo no caso do Chile, não havia risco à saúde pública”, disse Novacki, rememorando idêntico problema reportado pelo país latino-americano, em novembro, na carne bovina brasileira.

Em entrevista na quinta-feira ao Broadcast Agro, serviço de notícias em tempo real do Grupo Estado, o presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), Antônio Jorge Camardelli, foi enfático ao afirmar que os frigoríficos e o produtor estão pagando por um problema que não é deles. Ele atribuiu às companhias fabricantes de vacinas o problema, que, mesmo com a situação ocorrida no Chile, não foi corrigido pelos fabricantes.

Questionado por jornalistas se pode ter havido “sabotagem” nas plantas frigoríficas, já que a concorrência com os próprios EUA é grande, Novacki disse que “nenhuma possibilidade está descartada”. “Demoramos 17 anos para acessar o mercado americano. Havia pressão grande nos EUA para o mercado não ser aberto”, pontuou.

Novacki contou que os EUA reportaram oficialmente os problemas na carne bovina brasileira na semana passada. “Verificamos as não-conformidades e suspendemos plantas que exportaram para lá, as cinco maiores. Mas nos causou surpresa que, por decisão do secretário do USDA o mercado foi suspenso para todo o Brasil”, disse. Ele comentou também que já há previsão de reunião entre equipes técnicas do Brasil e dos EUA. “O ministro (da Agricultura) Blairo Maggi também quer ir para os EUA para demonstrar o que fazemos aqui”, disse.

O secretário ressaltou que o mercado norte-americano é importante porque serve de referência para outros países, dada o seu alto grau de exigência quanto aos produtos de origem animal. E lembrou que existe um movimento interno nacionalista nos EUA, reforçado pelos pecuaristas norte-americanos. Ainda assim, segundo ele, o Brasil não trabalha com hipótese de não recuperar mais o mercado do país do Hemisfério Norte.

“Temos consciência de que o produto brasileiro é saudável e de qualidade. O que nos preocupa bastante é a cadeia da agropecuária como um todo”, disse o secretário, para quem a Operação Carne Fraca, deflagrada em 17 de março pela Polícia Federal, trouxe ao País “prejuízos indiscutíveis”. “Tínhamos política de abertura de mercados e, após a Carne Fraca, trabalhamos com a consolidação de mercados já abertos”, afirmou.

Guerra

Novacki afirmou não acreditar que exista uma “guerra” entre fabricantes de vacina e pecuaristas no Brasil. “Estamos caminhando para o Brasil ser declarado no próximo ano país livre de aftosa. E, depois, livre sem vacina. Isso é processo longo”, disse.

“É prematuro antecipar qualquer questão sobre culpa neste momento. A investigação nos dará oportunidade de afirmar o que ocorreu. Podem ter certeza de que agiremos com total transparência”, acrescentou. “A investigação pode se estender. A princípio, ela precisa estar cumprida em 60 dias”, afirmou.

Novacki disse ainda que o ministério não foi informado sobre a presença de bactéria na carne exportada aos EUA. A questão foi levantada hoje, na imprensa. “Estamos investigando”, disse. “Tudo leva a crer que o problema tem relação direta com vacinação. Tudo aquilo colocado no relatório dos EUA será apurado.” Novacki acrescentou que, apesar de os EUA serem forte concorrente do Brasil no setor, no momento não é possível especular. “Temos que acreditar que parceiro age com lealdade. Mas não podemos descartar que haja motivações econômicas no processo.”

O secretário lembrou ainda que, como os EUA passaram a fiscalizar 100% da carne brasileira após a Operação Carne Fraca, “eles identificaram mais incongruências”. Às vezes é o rótulo que não estava no padrão. Nem sempre as incongruências significam problemas”, disse.

De acordo com Novacki, menos de 11% de inconformidades foram encontradas na carne para os EUA. Mas ele concordou que o porcentual é expressivo. Uma das alternativas para resolver o problema, segundo ele, seria o embarque de carne em cortes para os EUA. “A equipe técnica está estudando passar a embarcar a carne cortada para os EUA”, afirmou. “Alguns países recebem o corte inteiro, como os EUA, mas eles nunca reclamaram.”

Frigoríficos

Quinze frigoríficos brasileiros foram afetados pela decisão dos Estados Unidos de suspender as compras de carne bovina in natura do Brasil, entre eles cinco unidades da JBS, quatro da Minerva e quatro da Marfrig, informou o Ministério da Agricultura. Também estão com vendas suspensas ao país frigorífico da Cooperativa dos Produtores de Carne e Derivados de Gurupi, no Tocantins, e a Frisa Frigorífico Rio Doce, em Nanuque (MG).

As unidades da JBS estão em Nova Andradina, Naviraí e Campo Grande, em Mato Grosso do Sul, e em Lins e Andradina, em São Paulo. As unidades da Minerva estão em Barretos (SP), Palmeira de Goiás (GO), Araguaina (TO) e Janaúba (MG). As da Marfrig estão localizadas em São Gabriel (RS), em Paranatinga (MT), em Promissão, interior de São Paulo, e Baraguassu (MS).