A marca HOLANDESA Philips ficou – e ainda é – mundialmente famosa por eletroeletrônicos e lâmpadas. Mas esses negócios estão ficando no passado. Em breve, os únicos produtos a levar a sua marca para casas de todo o planeta estarão relacionados à saúde. A revolução da empresa em direção a esse foco mais restrito pode ser provada por dois movimentos recentes. A companhia adquiriu neste ano a americana Volcano, de San Diego, que produz cateteres inteligentes, que enviam informações pela internet. Também fechou parceira com a Illumina, empresa de sequenciamento de DNA. “Podemos integrar informações genéticas com os exames do paciente para tratar um tumor, por exemplo”, diz Jan Kimpen, principal executivo da área médica da Philips.

A renovação da empresa é completa. A Philips chegou à conclusão que, para ser rentável, precisaria sair de setores em que a concorrência é hiper acirrada, mergulhando em um segmento dominado por apenas três players: GE, Siemens e Toshiba. Por isso, ano após ano, sua marca está mais presente em hospitais e laboratórios – e se tornando mais rara em residências. O processo tem sido gradual. Primeiramente, negociou a sua unidade de televisores com a chinesa TPV, em 2012. Dois anos depois, separou a empresa restante em duas divisões, uma voltada à área de saúde e outra focada em iluminação, a Philips Lighting.

Esta última teve o seu capital aberto no ano passado, sendo avaliada em US$ 3,4 bilhões. Desde então, o desinvestimento continua, com vendas de largas fatias de ações da companhia. Em abril, o grupo se desfez de 15% da Philips Lighting, permanecendo com apenas 41% da companhia. “A minha chegada é uma prova dessa mudança”, disse à DINHEIRO Kimpen, um pesquisador e professor que foi contratado em 2015, quando era presidente do conselho de administração do Centro Médico da Universidade de Utrecht. “Não sou especialista em vender máquinas de radiologia, mas fui pediatra por 20 anos.” Os negócios de saúde já moviment€m € 17,5 bilhões ao ano.

A companhia, dessa forma, se volta cada vez mais para a negociação de aparelhos de tomografia, de radiologia, de ultrassom e de outros exames por imagens, além de escovas dentais elétricas. Mas mesmo o jeito de vender esses produtos está mudando. A ideia é substituir a simples comercialização dos aparelhos por contratos de serviços, numa forma similar ao caminho adotado por gigantes do mundo do software e do hardware, como Microsoft, IBM, HP e EMC. A Philips pretende, como elas, ser uma empresa de tecnologia, que fornece “soluções”, no jargão comum do mercado. A passagem de Kimpen pelo Brasil, no fim de junho, tinha como um dos objetivos se reunir com representantes de hospitais, clientes e parceiros, para divulgar esse posicionamento.

Fora das telas: a produção de tevês ficou para trás. Agora, a Philips só entrará na casa do cliente se for para acompanhar a sua saúde (Crédito:Alberto Cesar Araujo/AE)

O médico e executivo se encontrou com diversos deles e recebeu a DINHEIRO para uma entrevista dentro do Beneficência Portuguesa Mirante, no centro de São Paulo. “Pelas conversas que tive no Brasil, percebi que todos aqui estão falando a mesma língua que se ouve pelo resto do mundo, preocupados com cuidados baseados no valor, integração e uso de dados”, afirmou. Nesse modelo, a Philips proveria, em vez de um equipamento de última geração, o uso de suas máquinas. A cobrança poderia ser uma taxa mensal, de acordo com a quantidade de exames realizados e do volume de documentos e imagens armazenadas. Alguns centros de ponta já fecharam contratos para aderir a esse modelo.

São os casos do Hospital Karolinska, na Suécia, e da rede de hospitais Intermountain, de Utah. Um passo nesse caminho aqui no Brasil é uma parceria público-privada com o governo da Bahia. A Philips, em conjunto com a rede de diagnósticos Alliar e a gestora de hospitais FIDI, se encarregou de equipar centros de imagens em 12 hospitais, que receberão mais de 40 aparelhos como tomógrafos, mamógrafos e de ressonância magnética. O acordo previu a criação de uma joint-venture, com duração de 11 anos, na qual a holandesa possui 19,9% de participação e que exige do Estado arcar com um investimento de R$ 1 bilhão.

A estratégia pode servir ainda para ampliar a oferta de novas tecnologias. Segundo a CNS, existem 6,5 mil hospitais no Brasil, dos quais 2,7 mil são privados. “Desse total, não chega a uma centena os com capacidade de terem as tecnologias mais avançadas”, diz Lucena. “Creio que a proposta é a resposta da indústria para a dificuldade de tantas instituições que não têm como pagar por equipamentos mais modernos.” A expectativa é a de que no futuro as mais novas tecnologias acabem se popularizando. A oferta como serviços parte do princípio que a informação será o petróleo do futuro, lembra Kimpen.

O tratamento médico será constante, não restrito aos hospitais. O prontuário médico eletrônico já ajuda os especialistas a contarem com informações amplas e atualizadas de seus pacientes. Também, sensores e medidores de saúde vão acompanhar as funções vitais e medir constantemente a pressão das pessoas, enviando pela nuvem da internet informações para os médicos, mesmo quando estão em casa. A Philips estima que esse tipo de tecnologia diminua em 30% os atendimentos nos pronto-socorros e em 70% das hospitalizações, causando uma economia de 35% em sistemas de saúde de todo o mundo.