O crescimento de 1% no PIB do primeiro trimestre, divulgado na quinta-feira 1, mostra uma fotografia do passado. Por esse retrato é possível ver um quadro mais evidente de recuperação, o fim de uma sequência de oito trimestres seguidos de retração da atividade, e uma luz de otimismo sobre o que está por vir. Trata-se de uma confirmação do que os índices de confiança vinham sinalizando e da visão da maior parte dos empresários de que a situação começava a melhorar.

Em condições normais, dada a tendência de queda nos juros e na inflação, seria natural decretar um quadro que veio para ficar, mas o clima passa longe de céu de brigadeiro no Brasil de hoje. Não faltam razões para desconfiar da sustentabilidade da trajetória, deixando viva uma incômoda dúvida no ar: o País saiu da recessão? Tecnicamente, a inversão de sinais poderia ser encarada como o fim da tragédia, como o governo fez questão de enfatizar. “Acabou a recessão”, escreveu o presidente Michel Temer no Twitter após a divulgação do resultado. “O Brasil voltou a crescer e, com as reformas, vai crescer mais.”

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, foi além, ao indicar que, se anualizado, o dado significaria um crescimento de 4% ao ano. Para os economistas mais cautelosos, porém, diante da crise política, é prudente esperar mais para sacramentar o fim do quadro recessivo. A análise começa pelos próprios números do trimestre. Daqui para frente, o impacto esperado da agricultura deve ser menor. Quase todo o crescimento do primeiro trimestre é atribuído ao espetacular resultado do campo. Sem o avanço de 13,4% no setor, a economia teria ficado mais uma vez perto da estabilidade.

A força do campo: crescimento de 13.4% da agricultura puxou forte alta do PIB no primeiro trimestre e compensou desempenho tímidos dos demais setores
A força do campo: crescimento de 13.4% da agricultura puxou forte alta do PIB no primeiro trimestre e compensou desempenho tímidos dos demais setores (Crédito:Divulgação)

A neutralidade em serviços (0%) e no consumo (-0,1%), de maior peso sobre o indicador, traz uma dupla interpretação. De um lado, pararam de piorar, mas, por outro, não devem gerar contribuição para o avanço no ano. Embora tenha crescido 1% no primeiro trimestre, o PIB caiu 0,4% em relação a igual período de 2016. Não é da economia que parte a maior preocupação. A delação da JBS envolvendo Temer reinaugurou a crise política (leia mais aqui), com possibilidade real de queda da atual gestão e acendeu o temor de contágio sobre o cronograma de aprovação de reformas e da atividade econômica como um todo.

Representantes de bancos e empresas já detectam consequências negativas. José Olympio, presidente do Credit Suisse no Brasil, afirmou ter ouvido de varejistas um impacto negativo com o nó político. A mesma visão é compartilhada por outros setores. “A crise política é um balde de água fria para as nossas expectativas”, afirma o presidente da BMW no Brasil, Helder Boavida. “Estávamos começando a ver sinais de recuperação e é evidente que a crise política vem, a nosso entender, atrasar um pouco essa recuperação”

No Fórum de Investimentos Brasil, realizado entre 30 e 31, em São Paulo, DINHEIRO ouviu diversos empresários e investidores estrangeiros e nacionais sobre os possíveis impactos da crise política na economia (confira entrevistas ao final da reportagem). Ninguém se arrisca a avaliar as chances de Temer permanecer. A visão predominante é de que algum contágio haverá, com atrasos no cronograma de reformas e de leilões, além de abalo na confiança. Todos parecem convencidos, porém, de que a agenda de revisões veio para ficar, independentemente do desfecho político, e descartam risco de uma mudança radical de rota.

A política e os juros: na decisão da quarta-feira 31, o Comitê de Política Monetária do BC citou incertezas com a aprovação das reformas e um indicou ritmo mais lento de corte na taxa básica de juros
A política e os juros: na decisão da quarta-feira 31, o Comitê de Política Monetária do BC citou incertezas com a aprovação das reformas e um indicou ritmo mais lento de corte na taxa básica de juros (Crédito:Marcelo Camargo/Agência Brasil)

“Talvez essa incerteza política faça com que haja impacto no PIB, mas é menor do que a gente pudesse imaginar”, afirmou José Berenguer, presidente do JP Morgan no Brasil. Nos corredores, não era raro encontrar debates sobre os caminhos para o comando do País, mas a resposta que mais se ouvia sobre a crise política era a visão de que as reformas passam a ser encaradas como um consenso nacional. “O investimento estrangeiro não quer saber nome e sobrenome no poder”, afirmou Sérgio Brandão, diretor da gestora britânica Actis no Brasil. “Quer saber de que façam as reformas.”

O mais evidente sinal de que a tormenta em Brasília deixa marcas na economia se deu na quarta-feira 31. Ao reduzir a taxa básica de juros em 1 ponto percentual, para 10,25% ao ano, o Banco Central fez referência ao aumento da incerteza sobre a tramitação das reformas e indicou uma redução moderada no ritmo de flexibilização da política monetária. A leitura contrastou com a taxa de desemprego, divulgada na terça-feira 30, que ficou em 13,6% no trimestre (o equivalente a 14 milhões de desempregados), índice melhor do que o esperado pelos analistas.

Na oscilação entre indicadores positivos e negativos, em meio a muita cautela, a percepção de que o Brasil terminará o ano com a economia em terreno positivo ainda é majoritária. Contribuem para essa leitura o momento mais favorável no exterior, com investidores mais dispostos a tomar riscos e uma liquidez sem precedentes, além de avanços em áreas como a balança comercial, que acumula um superávit recorde de US$ 29 bilhões até maio.

Nesse sentido, o dado levemente melhor do que o esperado no PIB do primeiro trimestre contribuiu para sustentar as previsões dos principais analistas. A percepção é de uma perda de fôlego no segundo e no terceiro trimestres, refletindo a crise política, com uma retomada mais forte no fim do ano. “O primeiro trimestre veio muito forte, não é um ritmo que deve se manter, mas há uma recuperação em curso”, afirma Roberto Padovani, economista-chefe do Banco Votorantim, que manteve a previsão de crescimento em 0,7% do PIB. “Vai ser uma retomada paulatina.” Isso se Brasília não atrapalhar. O tempo está correndo.

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“O Brasil é maior do que isso. Já passamos por outras crises”

O ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Blairo Maggi, comenta o PIB do setor e a crise política

Blairo Maggi, ministro da Agricultura
Blairo Maggi, ministro da Agricultura (Crédito:Divulgação)

Como o senhor avalia o desempenho do agronegócio?
Para mim, não é novidade. Faz anos que a agricultura vem puxando a economia brasileira. A agricultura é um setor que, individualmente, representa pouco no PIB. Mas o agronegócio representa 25% do PIB, que mexe até com a fabricação de equipamentos e serviços nas cidades.

E a geração de empregos?
O campo não envolve muita gente, principalmente na agricultura mais tecnificada. Tem diminuído a quantidade de gente e aumentado a exigência da qualidade das pessoas.

O Plano Safra terá juros menores?
A expectativa é de uma queda de 1 ponto percentual em relação ao ano passado. Defendemos uma queda ainda maior, mas entendemos as dificuldades do País.

Existe o risco de o clima político abortar a recuperação econômica?
Não. Eu participei de um jantar do presidente Temer com empresários e todos se manifestaram com uma mensagem de muito otimismo e muita persistência, e que o ambiente político não deve e não pode atrapalhar os negócios. O Brasil é maior do que isso. Já passamos por outras crises.

 


“O tempo joga contra”

O presidente do Citi no Brasil, Hélio Magalhães, alerta para corrida contra o tempo.

Hélio Magalhães, presidente do CIti
Hélio Magalhães, presidente do Citi (Crédito:Divulgação)

Considerando o fato novo da política, como o senhor vê a economia para o resto do ano?
Os fundamentos da economia são sólidos e não parecem que mudem no curtíssimo prazo. Evidente que uma crise política longa impacta a economia, mas a nossa perspectiva é que não vai durar muito e vamos ter um impacto mínimo.

Pode afetar a aprovação das reformas?
Existe um consenso na sociedade, no governo e no Congresso de que essas reformas serão necessárias. Se vai ter um atraso ou não, depende das circunstâncias.

Essa tolerância relativa do mercado tem um prazo de validade?
É difícil dizer, mas o tempo joga contra, vamos ser realistas. O mercado precificou como o Brasil continuando nessa direção. Evidente que não vai ficar precificando nessa direção por nove meses.

Tem uma situação que não está resolvida, que é saber se o presidente fica ou não fica…
Não cabe ao mercado resolver isso. É uma crise política, que vai ser resolvida politicamente.

Vocês chegaram a revisar a previsão de PIB?
Não, estamos olhando o desenrolar, mas não mexemos. Estávamos prevendo 0,7% para este ano e para o ano que vem 3%.

 


“O povo e os empresários têm de tomar posse da agenda de reformas”

O presidente da Siemens no Brasil, Paulo Stark, vê falta de união sobre as reformas.

Paulo Stark, presidente da Siemens no Brasil
Paulo Stark, presidente da Siemens no Brasil (Crédito:Divulgação)

É possível falar em impactos da crise política?
Os clientes acabam esperando o momento certo para tomar uma decisão de investimento. Alguns já estavam esperando antes e acabam esperando um pouquinho mais. Não é nenhuma catástrofe, mas sem dúvida alguns acabam postergando um pouco a sua tomada de posição.

Há risco de interromper a trajetória de retomada?
Depende de como vai desenrolar esse cenário. Vimos mensagens muito claras de um compromisso do governo com as reformas, com uma direção estratégica. Isso tudo é muito positivo. Não há hesitação, isso agora seria fatal.

A dúvida é se esse governo estará aí, se a equipe econômica ficará?
Como foi dito, o que está na pauta hoje transcende o governo. É uma política de Estado. Tem de pertencer à população. O povo, os empresários, os funcionários públicos, têm de tomar posse dessa agenda, isso é que está fazendo um pouco de falta. A agenda é nossa, por isso que temos de pensar e tomar decisões em benefício da coletividade. A hora que o povo toma posse dessa agenda, não faz diferença quem está, que não está.