O Mercado Livre é uma ave rara, raríssima, no mercado brasileiro de comércio eletrônico. Desde 2007, quando abriu o capital na bolsa eletrônica Nasdaq, a operação online acumulou, trimestre a trimestre, resultados positivos. Jamais em sua história como empresa de capital aberto apresentou prejuízo. Em 2016, sua receita chegou a US$ 844,3 milhões, alta de 28,2%. O lucro de US$ 136,3 milhões representou um aumento de 28,8%. Por outro lado, os principais varejistas online brasileiros vivem um drama particular há algum tempo. Ano a ano, eles aumentam suas vendas, ampliam a base de consumidores, mas não conseguem tingir de azul seus balanços. São os casos de B2W, Cnova e Netshoes, que, a despeito de terem faturamento muito superior ao do Mercado Livre, são deficitárias.

A fórmula do sucesso do Mercado Livre é o seu e-marketplace, um local em que pessoas físicas ou pequenos e médios negócios anunciam seus produtos. A cada venda, a operação online que nasceu na Argentina e hoje está espalhada por toda a América Latina, ganha uma comissão. A vantagem é que, ao contrário dos varejistas virtuais, o Mercado Livre não precisa comprar produtos e muitos menos deixá-los armazenados em um centro de distribuição. “A tendência é que os e-marketplaces se tornem cada vez mais relevantes”, diz Stelleo Tolda, vice-presidente executivo para a América Latina do Mercado Livre. “Ele é altamente rentável.”

Não há dúvida que os e-marketplaces geram bastante caixa. Os seus dois principais expoentes globais são a americana Amazon, de Jeff Bezos, e o chinês Alibaba, de Jack Ma. Para se ter uma ideia, de cada US$ 1 em receita em 2016, o Alibaba ganhou US$ 0,51 centavos, antes de descontar despesas financeiras e os impostos. O Mercado Livre obteve US$ 0,25. A B2W, cujo modelo predominante é a venda direta, conseguiu apenas R$ 0,08. No ano passado, a gigante do comércio eletrônico comandada por Bezos faturou US$ 16 bilhões com as vendas de seu e-marketplace, resultado superior ao da divisão de computação em nuvem. Mais: 50% dos itens vendidos pela Amazon no primeiro trimestre de 2017 são de outros lojistas.

O Alibaba, de Jack Ma (a esq.), e a Amazon, de Jeff Bezos, são os maiores e-marketplaces do mundo
O Alibaba, de Jack Ma (a esq.), e a Amazon, de Jeff Bezos, são os maiores e-marketplaces do mundo (Crédito:Mark Lennihan e Ted S. Warren)

Fica fácil de entender porque a maioria dos varejistas brasileiros está caminhando na direção de construir e-marketplaces. A lista inclui a B2W, a Cnova, a Netshoes e o Magazine Luiza. Até mesmo o Buscapé, especializado na comparação de preços, está se movimentando para se transformar em um e-marketplace ao estilo do Mercado Livre. Os resultados já começam a aparecer. O B2W Marketplace saltou de 2,5 mil vendedores, em 2015, para 4,5 mil, em 2016. A movimentação financeira passou de R$ 860 milhões para R$ 2,1 bilhões, no mesmo período. A Netshoes, que estreou seu e-marketplace em fevereiro de 2015, movimentou R$ 2,2 bilhões no passado, com as 357 lojas de terceiros. Com menos de um ano de vida, a vitrine virtual do Magazine Luiza fez multiplicar por oito o número de itens vendidos no site, que passou de 30 mil para 250 mil. “É uma forma de ampliar a oferta e atender nosso consumidor”, afirma Eduardo Galenternick, diretor-executivo de e-commerce do Magazine Luiza.

DIN1017-mercadolivre3Esses varejistas virtuais conseguirão competir com o Mercado Livre? Um relatório do Bradesco BBI traça um cenário de que não será fácil enfrentar a empresa fundada pelo argentino Marcos Galperin. “Nossa análise de precificação mostra o quão complexo será mudar da categoria de venda direta para a de terceiros”, escreveu Richard Cathcart, do Bradesco BBI. “O que significa que a transição deverá durar mais tempo do que o esperado.” Como não faz venda direta, o Mercado Livre é imparcial na questão de preço. “Jamais um lojista me verá como um competidor”, diz Tolda. O CEO da consultoria DOM Strategy Partners, Daniel Domeneghetti, concorda. “O valor do Mercado Livre está em ter produtos que você não encontra em lugar nenhum”, diz Domeneguetti.

O segredo do Mercado Livre está também em sua estrutura azeitada. Ele ganha em todas as pontas do varejo online. O Mercado Pago, por exemplo, oferece um meio de pagamento seguro aos lojistas hospedados na plataforma. A companhia está também prestando uma série de serviços, que vai desde um sistema de gestão gratuito até a possibilidade de usar seu centro de distribuição. É verdade que seus concorrentes se movimentam nessa direção. Mas o Mercado Livre tem isso funcionando. Todos querem ser o Mercado Livre. Por enquanto, vão continuar tentando. A única certeza é que a disputa ficará mais acirrada nos próximos anos.