Thaís Zara, economista-chefe da Rosenberg Associados: “Ninguém esperava que uma crise desse tipo viria”
Thaís Zara, economista-chefe da Rosenberg Associados: “Ninguém esperava que uma crise desse tipo viria” (Crédito:Marco Ankosqui)

No dia 17 de maio, por volta das 18h, quando deixou o escritório da consultoria Rosenberg Associados, na avenida Faria Lima, coração financeiro da capital paulista, a economista-chefe do grupo, Thaís Zara, mal sabia que o expediente estava longe do fim. Foi só ao chegar em casa que tomou conhecimento de que o empresário Joesley Batista, da JBS, havia gravado o presidente Michel Temer, o senador Aécio Neves e firmado um acordo de delação premiada que caiu como uma bomba no País.

De lá mesmo, ela reuniu sua equipe, por telefone, para mapear possíveis impactos na economia, informações que constariam num relatório enviado aos clientes às 20h. O texto alertava para a repercussão na Bolsa e adiantava o debate sobre a sustentação de Temer na Presidência, sem trazer os dados revisados para o ano. Desde então, só ficou mais claro que o cenário mudou. Zara e a maior parte dos analistas iniciaram reavaliações dos números previstos, mas, sem clareza na cena política, não conseguem saber ao certo quando estarão prontos nem como ficarão.

Bruno Rezende, sócio-diretor da 4E Consultoria: “É muito difícil saber até onde a coisa pode ir, por isso falamos para os clientes tomarem cuidado”
Bruno Rezende, sócio-diretor da 4E Consultoria: “É muito difícil saber até onde a coisa pode ir, por isso falamos para os clientes tomarem cuidado” (Crédito:Marco Ankosqui)

Até a divulgação dos áudios, o mercado projetava que o PIB fecharia 2017 com aumento de 0,5%, encerrando dois anos seguidos de recessão. O otimismo estava apoiado na perspectiva de aprovação das reformas, em especial a da Previdência, que reduziria o risco de colapso fiscal, somado a indicadores recentes que reforçavam a percepção de que a retomada havia começado a engrenar. A divulgação dos áudios jogou um balde de água fria nas previsões e criou uma sensação de desnorteamento entre os economistas. “Ninguém esperava que algo do tipo viria”, afirma Zara. “O cenário de retomada estava montado, com inflação caindo e perspectiva de crescimento, até vir a quarta-feira [17 de maio] e enterrar tudo”, afirma Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados.

O risco imediato mais claro é de uma paralisia dos assuntos tratados em Brasília. No Planalto, todo esforço político está voltado a garantir a permanência de Temer e, no Congresso, a articulação se concentra em como conduzir uma cada vez mais provável sucessão (leia reportagem aqui). Embora os trabalhos tenham sido retomados no Legislativo, o clima esquentou e trouxe impactos ao cronograma das principais pautas, incluindo as reformas trabalhista e da Previdência.

Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados : “O cenário de retomada estava montado, até vir a quarta-feira e enterrar tudo”
Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados: “O cenário de retomada estava montado, até vir a quarta-feira e enterrar tudo” (Crédito:Marco Ankosqui)

Como a queda de Temer é apenas uma questão de tempo, segundo os analistas, o quadro que se desenha é inédito: dois presidentes abatidos em apenas um mandato. “Não tem parâmetros para o que fazer numa situação dessas”, diz Vale, da MB Associados. “Tem várias possibilidades e isso que é complicado.” A consultoria trabalhava com um crescimento de 1%, mas o número já está em revisão. Na Rosenberg, a expectativa anterior à crise era de alta de 0,7% do PIB. As reavaliações estão em curso para indicar qual será o novo dado.

Um dos aspectos com que os consultores concordam é que a queda da taxa de juros deve continuar, mas será levemente desacelerada (leia quadro ao final da reportagem). Como a divulgação dos áudios colocou o câmbio em outro patamar e acrescentou uma dose elevada de risco, os analistas já revisaram a perspectiva para a próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), na quarta-feira 31. Se antes o cenário convergia para uma queda de 1,25 ponto percentual, agora está mais próxima de 1 ponto ou menos. “O Comitê de Política Monetária [Copom] ainda tem na mesa um quadro de inflação em queda, de atividade em baixa, o que o permite continuar cortando os juros”, afirma Zara.

Para dar conta das crescentes dúvidas de clientes sobre os possíveis cenários para a economia em meio à crise política, as consultorias recomendam cautela nas decisões. “O que a gente tem batido na tecla é para tomar muito cuidado com o timing de virada da economia, não se alavancar demais e colocar uma trava no câmbio”, diz Bruno Rezende, sócio-diretor da 4E Consultoria. O grupo era um dos mais pessimistas com o quadro econômico antes da crise política e já vinha sinalizando o risco de uma tormenta política pela frente, sobretudo pelas chances limitadas de aprovação das reformas no Congresso.

Agora, a equipe da 4E já trabalha com um recuo de 0,3% do PIB, mais forte do que o 0,1% previsto até então. A consultoria, porém, avalia que cresceu o risco de um cenário alternativo, em que a reforma da Previdência não é aprovada. Neste caso, o PIB cairia 1,1%. “É muito difícil saber até onde a coisa pode ir, então o que a gente tem falado aos clientes é que tomem cuidado.” Com tantas previsões imprevisíveis, é difícil cravar algum cenário.

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