O bebê que aparece na foto acima se chama Rodrigo, tem apenas um ano e três meses e é filho do presidente reeleito da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Daqui a duas décadas, quando ele entrar no mercado de trabalho, a situação demográfica do Brasil será bem diferente. Haverá, proporcionalmente, menos jovens em atividade para sustentar a aposentadoria de um número maior de idosos. Imagine, então, daqui a sete décadas, quando ele tiver idade para se aposentar. O Brasil será um país de idosos. Significa, portanto, que o pai dele não pode fracassar na condução e na aprovação de uma reforma da Previdência que garanta os recursos necessários para que a geração de Rodrigo consiga se aposentar – e receber – lá no futuro.

O quadro fiscal é dramático. No ano passado, o déficit primário da União fechou em R$ 155,8 bilhões (2,5% do PIB), o maior da história. Foi o terceiro ano seguido no vermelho, apesar do reforço de peso no lado das receitas, com o programa de repatriação (R$ 46,8 bilhões). Se por um lado os números escancaram a tragédia das contas públicas do País, por outro abrem uma janela de oportunidade para aprovar as reformas estruturais. Ficou mais fácil demonstrar como as distorções nas contas da Previdência sobrecarregam os cofres públicos e flertam com a insolvência, um argumento poderoso no debate a ser inaugurado a partir desta semana, com a retomada dos trabalhos legislativos.

FOCO NO HORIZONTE: em mensagem ao Congresso, Temer destacou desafio de garantir previdência de amanhã. Na foto, em visita a obra no Rio São Francisco, na segunda-feira 30
FOCO NO HORIZONTE: em mensagem ao Congresso, Temer destacou desafio de garantir previdência de amanhã. Na foto, em visita a obra no Rio São Francisco, na segunda-feira 30 (Crédito:Beto Barata/PR)

Em 2016, o pagamento de benefícios do INSS, que inclui as aposentadorias urbanas e rurais, avançou 6,6%, para R$ 516 bilhões, e abocanhou 40% da despesa não financeira da União, que também gastou R$ 407 bilhões com juros da dívida pública. O sistema urbano registrou o primeiro déficit depois de sete anos seguido no azul e ajudou a afundar o tombo geral, tradicionalmente puxado pela fatia rural. No conjunto do INSS, o déficit foi de R$ 151,8 bilhões, o equivalente a 2,4% do PIB, e representou quase a integralidade do vermelho nas contas do setor público.

Nas projeções incluídas no Orçamento deste ano, o governo estimou um novo avanço nas despesas do INSS e um saldo negativo de cerca de R$ 180 bilhões (2,7% do PIB). “Ainda que tenha sido agravada pela conjuntura adversa, a raiz do problema fiscal é estrutural e para isso é fundamental o avanço da agenda de reformas”, afirmam os analistas da Rosenberg Associados, em relatório. Para Rafael Bistafa, economista da consultoria, o ajuste fiscal está apenas começando. “É um sinal de que tudo que foi feito até aqui ainda é insuficiente.”

ALIADO: eleito com folga no Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE) reforçou disposição de contribuir para aprovação das reformas
ALIADO: eleito com folga no Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE) reforçou disposição de contribuir para aprovação das reformas (Crédito:Divulgação)

As eleições no Congresso deram uma indicação positiva ao governo. O Planalto conseguiu emplacar dois aliados fiéis no comando das Casas. Eunício Oliveira (PMDB-CE), no Senado, e Maia, na Câmara, assumiram prometendo esforços pela aprovação dos projetos de revisão na Previdência e nas leis trabalhistas. “Precisamos terminar 2018 com a certeza de que a Câmara comanda a reforma do Estado brasileiro”, afirmou Maia após a vitória. Na cerimônia de comemoração, o deputado lançou um olhar para o futuro, ao erguer seu filho Rodrigo em meio ao Plenário.

Em carta enviada ao Congresso, o presidente Michel Temer classificou as mudanças no sistema de aposentadoria como a mais premente missão do Legislativo. “A reforma é fundamental para garantir as aposentadorias de amanhã”, afirmou.  Os dados de 2016 reforçam o alerta de urgência dos especialistas. Sem a reforma, as despesas saltariam dos cerca de 8% atuais para 17% do PIB em 2060, quando o Brasil terá 44 idosos para cada 100 pessoas em idade ativa, ante o nível atual de 11 para 100. “Precisaríamos de um aumento de carga tributária na faixa de dez pontos percentuais do PIB para manter a Previdência como está”, afirma à DINHEIRO Marcelo Caetano, secretário da Previdência.

A revisão nas regras para aposentadoria institui a idade mínima de 65 anos e endurece o cálculo dos benefícios, com alcance no setor privado e público, em todos os níveis da Federação. O texto é fundamental para que o governo cumpra o teto de gastos, outro mecanismo de contenção de despesas do ajuste fiscal, aprovado no ano passado. Segundo a nova regra, o gasto anual deve ser igual ao do ano anterior corrigido pela inflação. Em seu primeiro ano de vigência, a medida já é vista como um desafio ao Executivo. Considerando as projeções de receita para 2017, haverá necessidade de novos cortes para cumprir a meta.DIN1004-previdencia5

A Rosenberg calcula em R$ 30 bilhões o tamanho da contenção a ser feita. Isso já considerando uma receita extraordinária de quase R$ 40 bilhões com uma nova repatriação, receitas de concessões de infraestrutura e de leilões de petróleo e energia. A Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão recém-criado pelo Senado para acompanhar as contas públicas, estima uma diferença maior, de cerca de R$ 40 bilhões. Mesmo que a reforma da Previdência seja aprovada neste ano, seus impactos positivos sobre a situação fiscal só devem ser observados no médio e no longo prazos. De qual forma, é bom Maia correr, porque a geração do filho Rodrigo tem pressa.