De passagem pelo Brasil, o presidente da Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (ICC, em inglês), Alexis Mourre, explicou à DINHEIRO por que o País é o terceiro a receber um escritório da entidade fora de Paris, onde fica sua sede, junto a China e Estados Unidos, e reforçou a posição da Câmara contra o protecionismo.

O FMI fez um apelo aos países para que não tomem atitudes que coloquem em risco o comércio global. Como o senhor avalia a situação atual?
O comércio global está em uma fase mais fraca do que no passado. Se olharmos os últimos 35 anos, as trocas internacionais avançaram, mas agora o crescimento é menor. Essa queda, em sua maior parte, se deve à crise de 2008.

Estamos vendo nas principais economias um forte movimento em direção ao protecionismo. Por que isto está ocorrendo?
Temos dois problemas. O primeiro são as consequências que a crise econômica de 2008 provocou pelo mundo. O segundo é que estes longos períodos de crescimento não levaram suficientemente em conta a necessidade de garantir que todos tivessem uma parte justa da riqueza criada. A base disso é um sentimento legítimo daqueles que estão insatisfeitos, que acreditam que a globalização não foi benéfica para eles. Se quisermos superar este problema, precisaremos encontrar formas sustentáveis de crescimento.

Como reverter essa onda protecionista?
Os líderes precisam estar mais conscientes da necessidade de ter sua população “a bordo” da globalização, convencer que não é uma dádiva para poucos, mas algo que gera ganhos a todos. Vimos na Europa, por muitos anos, os principais partidos tentando culpar a União Europeia e fatores externos por questões que estão sob sua responsabilidade. Precisamos promover uma mensagem positiva, que apresenta a globalização como uma oportunidade, não um risco. Os ganhos com a globalização precisam ser compartilhados.

Como é possível revigorar as negociações de acordos multilaterais?
Infelizmente alguns acertos não devem ser assinados no futuro próximo, como o Tratado Transpacífico (TPP). As consequências disso são mais acordos bilaterais e, do nosso ponto de vista, isso é menos positivo do que os grandes acordos multilaterais, em que mais pessoas são beneficiadas.

Nesse contexto, como as empresas devem atuar?
Uma das ferramentas que podem usar é a arbitragem, indispensável paraquem quer exportar ou investir para crescer.

Por que a ICC escolheu o Brasil para ter a terceira corte arbitral fora de Paris?
O Brasil está numa situação desconfortável, mas é um dos maiores países do continente e um dos mais promissores em termos de crescimento. Temos certeza que irá superar as dificuldades e queremos estar mais próximos.

O Brasil é criticado por ser pouco integrado ao mundo. Qual é a sua visão?
Sinto que o País ainda é muito regulado, muito mais do que deveria ser, mas tenho certeza que a questão deve evoluir no sentido correto. O Brasil deveria se esforçar para tornar o ambiente de negócios mais simples para investidores estrangeiros, mas acredito que está fazendo esforços na direção correta.

Como é possível aumentar a presença de empresas brasileiras no exterior?
Uma vez que o País superar a questão da corrupção, que aqui é muito forte e precisa ser resolvida, será preciso criar um cenário econômico estável e previsível. É preciso ter um governo que esteja aberto ao comércio internacional e seja um consenso dentro da sociedade. Uma sociedade integrada torna a situação para investimentos estrangeiros muito mais simples.

A OMC prevê um crescimento de 2,4% para o comércio mundial em 2017. O senhor concorda com esse número?
É difícil de dizer porque depende de uma série de fatores. O primeiro, sem dúvida, é a evolução das principais taxas de juros, especialmente a dos Estados Unidos. O segundo fator são os preços das commodities. Da perspectiva da ICC, um importante fator é que a gente mantenha as bases para um comércio mais aberto possível, que a gente possa limitar ao máximo as barreiras.

O baixo crescimento global é o “novo normal”?
Eu acredito que os períodos em que o comércio internacional crescia de 5% a 10% acabaram. Grandes economias, como a China, estão muito mais preocupadas em servir as necessidades do mercado doméstico, o que acaba tirando um pouco de força do comércio internacional. Acredito que veremos no futuro balanças comerciais mais equilibradas, mais comércio com emergentes e maior demanda destes grandes mercados, como a China e a Índia. Só a Índia possui 400 milhões de pessoas com idade entre 10 e 24* anos, o que demonstra as possibilidades.