Às margens do rio Coatzacoalcos, próximo ao Golfo do México, a brasileira Braskem, maior produtora de resinas termoplásticas das Américas, investiu US$ 5,2 bilhões na construção do Complexo Petroquímico Etileno XXI, um ambicioso projeto em parceria com a mexicana Idesa para a produção de polietileno, um elemento chave para a fabricação de plásticos. Inaugurada em abril de 2016, a unidade foi pensada para suprir a carência de matéria-prima dos mexicanos, que amargam um déficit de US$ 20 bilhões no setor químico.

Mas, como o grande mercado fornecedor sempre foi os Estados Unidos, de onde eles importam dois terços de sua necessidade, a Braskem passou a exportar para outros mercados, como o asiático e o europeu. Nenhum problema existia até Donald Trump chegar à Casa Branca. O cenário, entretanto, mudou. Trump está revendo os acordos de livre-comércio existentes entre os países e impondo sobretaxas de importação. Os mexicanos, que até então só olhavam para cima do Continente, passaram a olhar para baixo. O maior beneficiado deve ser o Brasil, que tem capacidade para exportar tanto a matéria-prima como a tecnologia para ocupar o espaço que será deixado pelos americanos.

“Ainda não está claro para nós como será o desenrolar dessa negociação. Porém, o foco da Braskem continua sendo atender e aumentar a capacidade do mercado local”, diz Cleantho Leite, diretor de relações institucionais da Braskem Idesa. “A meta deste ano é vender até 50% da nossa capacidade produtiva no país. Já nos próximos cinco anos, chegaremos a quase 90%. Uma maior cooperação entre Brasil e México nos beneficiará ainda mais.” Assim como a Braskem, outras empresas brasileiras podem se aproveitar do muro que foi erguido nas relações comerciais entre o México e os Estados Unidos. Especialistas ouvidos pela DINHEIRO avaliam que essa é a grande chance para que os dois países líderes da América Latina finalmente fortaleçam a relação bilateral.

OPORTUNIDADE: com menos de um ano de operação, complexo petroquímico da Braskem Idesa no México tem chances de se beneficiar com o protecionismo americano
OPORTUNIDADE: com menos de um ano de operação, complexo petroquímico da Braskem Idesa no México tem chances de se beneficiar com o protecionismo americano (Crédito:Divulgação)

Os mexicanos ignoravam os países ao Sul. O Nafta (acordo de livre comércio com EUA e Canadá) sempre foi mais vantajoso. De todos os produtos importados, 50% vêm dos Estados Unidos, seguido da China, que desde 2014 conquistou 18% das importações mexicanas. Enquanto isso, os 12 países que formam a Associação Latino-Americana de Integração, juntos, representam apenas 2,4% das importações do país. “Temos muito a ganhar no mercado mexicano, pois competimos com os Estados Unidos em vários produtos como as commodities”, diz Soraya Rosar, gerente-executiva de negociações Internacionais da Confederação Nacional da Indústria (CNI). “Sem a concorrência americana, o Brasil passaria a ser a outra opção competitiva de fornecedor.”

Para reverter esse quadro, entre os dias 6 e 7 de março, uma comitiva de empresários brasileiros será recebida pelo Ministério de Desenvolvimento do México. O objetivo do encontro é estreitar os laços com a classe empresarial brasileira e mostrar que, além dos produtos já comercializados entre os países, como os do setor automotivo, da indústria petroquímica e de plásticos, também podemos fornecer o que eles importam dos Estados Unidos, como açúcar, suco de laranja e carne suína. Uma das principais queixas comerciais dos empresários brasileiros é justamente a distância comercial com o México, segundo pesquisas da CNI. A tentativa de reaproximação entre os países foi iniciada ainda no governo Dilma Rousseff. Em maio de 2015, ela foi ao México estreitar relações com o presidente Enrique Peña Nieto.

À época, Dilma tentou convencer o governo mexicano a diminuir as barreiras tarifárias aos produtos brasileiros assim como elevar o patamar de investimentos mexicanos no País. No setor de agronegócio, a abertura veio com o surto da gripe aviária nos EUA. Maior importador de proteína animal da América Latina e o terceiro maior consumidor do mundo, o México trocou o produto americano pelo brasileiro. A adesão foi tão boa que, entre 2015 e 2016, a exportação de carne de aves mais que dobrou, de 25 mil toneladas para 59 mil toneladas, ao ano. Agora, a expectativa é que esse volume aumente ainda mais.

“Ainda não podemos afirmar quanto será o crescimento, mas em março seremos recebidos pelo Ministério do Desenvolvimento do México, para negociar uma melhor relação na comercialização de produtos do agronegócio”, diz Francisco Turra, ex-ministro da Agricultura e presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal. “Se o México abrir as portas ao Brasil, vamos conquistar espaço, independentemente de Trump mudar sua posição autoritária.” Como os mexicanos estão sendo maltratados pelo presidente americano, o Brasil tem a chance de mostrar que a América é muito maior do que apenas o Norte. Quem sabe, assim, os dois países não deixem de lado pequenas contendas, como não reconhecer a origem da tequila e da cachaça. Quem vai propor o brinde?

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