Letargia e lentidão. Nos últimos anos, esses são alguns dos termos que pontuam, invariavelmente, os relatórios e comentários de analistas quando se referem à Natura. No centro dessas referências nada positivas, a demora da empresa para ir além do modelo tradicional de vendas diretas, responsável por torná-la uma gigante, mas insuficiente para adequar a operação às novas realidades do mercado. Na manhã da sexta-feira 9, a companhia deu sinais de que está disposta a acelerar o passo para mudar essa história, ao anunciar um acordo de negociação exclusiva para a compra da The Body Shop, marca britânica de cosméticos controlada pela L’Oréal.

Em comunicado, o grupo francês confirmou que recebeu da Natura uma oferta de € 1 bilhão por 100% do negócio. A Natura informou já ter aprovado o financiamento do valor estipulado com bancos brasileiros e estrangeiros. O montante será pago integralmente no fechamento da aquisição, previsto para os próximos meses. O acordo já foi aprovado pelo conselho de administração da L’Oréal e está sujeito agora às aprovações do conselho de funcionários da The Body Shop e de autoridades antitruste no Brasil e nos Estados Unidos.

A transação começou a ser costurada no início do ano, quando a empresa brasileira foi procurada pela L’Oréal. “Estou muito satisfeito em anunciar a Natura como a nova e potencial casa da The Body Shop”, afirmou Jean-Paul Agon, CEO da L’Oréal, em comunicado. “É a melhor alternativa que poderíamos imaginar para alimentar o DNA da nossa marca em torno da sustentabilidade e ética.” Além de ressaltar os valores comuns das duas companhias, João Paulo Ferreira, CEO da Natura, destacou outros pontos inerentes à provável aquisição. “Esse será um passo decisivo para consolidar a Natura como um player global da indústria de cosméticos, com presença em 70 países”, disse o executivo, em teleconferência.

Fundada em 1976, a The Body Shop possui um portfólio de produtos naturais dividido em categorias como perfumaria e cuidados para a pele, além de uma rede de mais de 3 mil lojas – sendo duas mil franquias – em 65 países. Essa fortaleza no varejo é outro fator no radar da Natura. Em 2016, a empresa brasileira começou a investir em lojas físicas. No entanto, com dez unidades inauguradas no período, sua presença ainda é tímida nesse canal. A marca britânica, por sua vez, possui 133 pontos de venda no País. “O acordo, certamente, será um acelerador dessa estratégia”, afirmou Ferreira.

Ana Paula Tozzi, CEO da AGR Consultores, destaca a marca forte e o conhecimento profundo da The Body Shop no varejo. “O acordo é extremamente positivo. Mas a grande questão é saber se a Natura conseguirá absorver e internalizar esse conhecimento”, diz. Em contrapartida, ela também enxerga benefícios para a empresa britânica, cuja operação passa por dificuldades. Em 2016, com o crescimento da concorrência e um desempenho abaixo das expectativas em seu mercado doméstico, a companhia registrou uma queda de 4,9% na receita, para € 920,8 milhões. “A The Body Shop perdeu sua essência sustentável e, sob a influência de fundos, tornou-se uma mega operação capitalista”, afirma. “O resgate desses valores é o melhor que a Natura tem a oferecer.