O apetite dos chineses por artigos e experiências de luxo vem crescendo ano após ano. Somente em 2017, o mercado de alto padrão na China deve movimentar US$ 81 bilhões, segundo estimativas da consultoria Euromonitor. A cifra, no entanto, seria ainda maior se não fosse por um pequeno detalhe: cerca de 40% das compras de luxo dos chineses são feitas fora da China. Um filão e tanto. Não por acaso, empresas da nação da Grande Muralha e de outros países asiáticos estão trilhando caminhos além das fronteiras. E o setor hoteleiro vem sendo o principal alvo de alguns grupos do continente.

É o caso de gigantes como o Swire e o Peninsula, baseados em Hong Kong, além do Shangri-la, de Cingapura. Essas companhias vêm investindo bilhões de dólares não só para hospedar seus conterrâneos em viagens mundo afora, mas para conquistar parte do exigente público da Europa e dos Estados Unidos. As empresas estão seguindo caminho similar ao da rede hoteleira Mandarin Oriental, pioneira na hospedagem de luxo asiática, também de Hong Kong. Dona de um faturamento de US$ 1,3 bilhão por ano, o grupo conta com 30 hotéis, sendo 17 hotéis no exterior, e metade das suas receitas já vem de fora de seu continente.

O empreendimento mais recente dos “tigres asiáticos da hotelaria” é o East Miami, do Grupo Swire, dono de negócios como a companhia aérea Cathay Pacific, empresas de óleo e gás, além de produção e distribuição de produtos de companhias como Coca-Cola e Colgate em parte da China. Esses negócios fizeram o grupo faturar US$ 8 bilhões em 2016. Localizado na região de Brickell City Center, o hotel é um grande exemplo do poderio das empresas chinesas e faz parte de um refinado complexo que possui duas torres, 352 quartos e 89 residências, além de um shopping center com dezenas lojas de grifes como Hugo Boss, Victoria’s Secret e a brasileira Carmen Steffens.

Foram investidos mais de US$ 1 bilhão no projeto. Detalhe: tudo foi pago à vista, com dinheiro do próprio caixa, sem nenhum centavo de financiamento. “As pessoas estão procurando por experiências diferentes e queremos entregar isso para elas”, diz a australiana Chrissie Lincoln, diretora de vendas internacionais da Swire Hotels. A experiência diferenciada, segundo ela, se baseia especialmente na forma que o cliente se relaciona com o estabelecimento. Por isso, a executiva aposta, principalmente, no perfil mais solícito e educado que os orientais possuem em comparação aos americanos e europeus.

miami oriental: o bar Sugar, localizado dentro do East Miami, foi considerado um dos melhores dos Estados Unidos
Miami Oriental: o bar Sugar, localizado dentro do East Miami, foi considerado um dos melhores dos Estados Unidos (Crédito:Michael Weber)

“O nosso estilo de atendimento sempre será voltado ao estilo asiático, que é mais solícito”, diz Graziella Makdissi, gerente de vendas internacionais. Outros elementos do East Miami também são remetidos à cultura asiática. O principal espaço do hotel é o bar Sugar, localizado no quadragésimo andar do complexo. A decoração e o paisagismo têm como objetivo rememorar traços antigos da China. Além disso, chefs de Hong Kong foram contratados para criar pratos típicos do continente. Todos os funcionários do espaço são de algum país da Ásia e passaram por outros hotéis da Swire, fortalecendo o clima oriental.

O bar do hotel, inclusive, já foi eleito um dos dez melhores de todos os EUA pela publicação americana de turismo Condé Nast. Por ser uma cidade que abriga diversas culturas e menos apegada às tradições, Miami costuma receber investimentos hoteleiros de redes do mundo inteiro. O difícil é entrar em mercados mais consolidados, como o europeu, onde residem alguns dos melhores hotéis do mundo. A Peninsula, com receitas de US$ 720 milhões, decidiu arriscar. Os chineses colocaram cerca de US$ 800 milhões para revitalizar o antigo Hotel Majestic, datado de 1908 e patrimônio histórico pela UNESCO.

Com 200 quartos, sendo cinco com visão 360 graus de Paris, o empreendimento inaugurado em 2014 virou uma espécie de ponto de encontro dos abonados chineses na Cidade Luz. A localização também ajuda: está a poucos quarteirões de pontos celebrados como a Champs-Élysées. A abertura ocorreu em 2014, mesmo ano em que o Shangri-la, que fatura US$ 2,2 bilhões, inaugurou seu icônico Hotel at The Shard, em Londres. Com 202 suítes e localizado no edifício mais alto da capital inglesa, o hotel possui uma vista privilegiada para locais turísticos como o Big Ben e a London Eye. Uma diária não custa menos do que R$ 1,5 mil.

O investimento no espaço não foi divulgado. Além da Ásia e da Inglaterra, a empresa conta com hotéis em países como Canadá e França. A julgar pelo volume de investimentos, os chineses estão dispostos a gastar o que for necessário para garantirem um lugar ao sol na hotelaria de alto padrão. “O luxo chinês surgiu de maneira oposta ao europeu, em que a maioria das grifes nasceu pequena”, diz Gabriela Otto, professora de educação executiva da ESPM, especializada em luxo. “Os chineses já surgem grandes por conta do dinheiro.” Com essa quantidade de recursos, será cada vez mais comum observar o sucesso dos asiáticos no mundo do luxo.