Basta uma rápida folheada no calendário de 2018 para ter a sensação de que o ano será perdido. Com o carnaval em fevereiro, a Copa do Mundo em junho e julho, e a campanha eleitoral entre agosto e outubro, não haverá tempo para mais nada. Certo? Errado. Apesar de um cenário de recuperação econômica, que vai proporcionar um crescimento anual de 3% do PIB, o Brasil não pode se dar o luxo de cruzar os braços à espera do próximo governo. Ao contrário do setor privado, no qual tempo é dinheiro e o ano começou efetivamente no dia 2 de janeiro, no setor público, a rotina de trabalhos vai sendo retomada lentamente. A boa notícia é que, com um pouquinho de boa vontade, os políticos de Brasília podem ter um ano bem produtivo, legando um ciclo virtuoso para 2018.

Na segunda-feira 5, uma sessão solene vai marcar o início do ano legislativo. Findo o recesso parlamentar, deputados federais e senadores terão pela frente uma extensa e importante lista de votações (leia quadro ao final da reportagem), cuja prioridade do governo é a reforma da Previdência Social. Para que a votação das novas regras das aposentadorias ocorra no dia 19 de fevereiro, como havia previsto o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), é preciso que o relator Arthur Maia (PPS-BA) apresente a versão final do seu texto na terça-feira 6. “O único problema da reforma é o tema da Previdência, que é polêmico”, disse Maia na quinta-feira 1º. “Tem que esclarecer a sociedade.”

Embora reconheça não ter ainda angariado os 308 votos necessários (três quintos dos deputados) para aprovar a reforma, o presidente Michel Temer tem liderado uma frente de comunicação para esclarecer a população sobre as novas regras que não prejudicarão os mais carentes. “Quero registrar muito fortemente que este projeto não alcança os mais pobres, que ganham até um, dois ou três salários mínimos”, afirmou Temer, no domingo 28, em entrevista ao apresentador Silvio Santos, do SBT. No dia seguinte, no programa do Ratinho, da mesma emissora, o emedebista pediu apoio da população ao tema. “Assim, os parlamentares, sentindo o clamor popular, vão se sentir confortáveis em votar a proposta”, disse o presidente. Na avaliação do economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, se a reforma não for aprovada, o caminho será o aumento de impostos. “Nas urnas, a população precisará decidir se quer que o País volte para o buraco ou se prefere um presidente reformista”, diz Vale.

Batalha da comunicação: o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (à esq.), e o presidente do Senado, Eunício Oliveira, dizem que vão votar os projetos de interesse do governo, mas nem sempre demonstram empenho. Enquanto isso, o presidente Temer concede entrevistas a programas populares (Crédito:AFP Photo/Nelson Almeida | Picasa)

Embora a reforma da Previdência Social seja o principal projeto do ponto de vista fiscal (leia reportagem aqui), há outros temas econômicos importantes que dependerão do aval dos parlamentares. Dois deles são ligados à área energética: a reforma do setor elétrico e a privatização da Eletrobras. Os técnicos do Ministério de Minas e Energia devem concluir nas próximas semanas um projeto de lei que terá, dentre vários itens, uma proposta de solução para o risco hidrológico, que hoje representa perdas de R$ 6 bilhões. Antes disso, o governo já encaminhou o projeto de lei de privatização da Eletrobras, que pode render R$ 12 bilhões aos cofres públicos.

O Banco Central (BC) também tem demandas no Congresso Nacional, que incluem a aprovação do cadastro positivo. A ideia é que todos os brasileiros sejam automaticamente inseridos no banco de dados de bons pagadores. Quem não quiser, terá de solicitar a exclusão do seu nome. Aprovado no Senado Federal, o texto aguarda votação na Câmara dos Deputados. Outro item que consta da agenda do BC é a regulamentação da duplicata eletrônica. O mecanismo, quando estiver em vigor, vai evitar que um mesmo bem seja dado como garantia em dois empréstimos diferentes. Isso aumenta a qualidade das garantias e, por tabela, reduz os juros dos financiamentos.

Na construção civil, há uma enorme expectativa sobre a regulamentação da Letra Imobiliária Garantida (LIG), que se tornará mais uma fonte de financiamentos para imóveis. Além disso, os empresários clamam por novas regras para os distratos, que foram o maior problema enfrentado pelas construtoras nos anos de crise. São medidas que tornarão o ano ainda mais promissor para o setor, após longa recessão. “Os lançamentos e as vendas terão crescimento de 10% em 2018”, diz Celso Petrucci, economista-chefe do Secovi-SP. O governo prepara ainda uma Medida Provisória sobre o novo marco legal do saneamento básico, uma Lei Geral para o Licenciamento Ambiental e uma proposta de simplificação tributária, um antigo anseio do empresariado. “Num ano eleitoral, a janela para aprovação de projetos é mais curta”, diz Rafael Cortez, cientista político da Tendências Consultoria. “Não há tempo a perder.”

Entre março e abril, haverá a possibilidade de os parlamentares trocarem de partidos sem perder o mandato. Além disso, ministros sairão do governo para participar das eleições, o que levará o presidente Temer a promover uma reforma ministerial. “Toda essa movimentação vai alterar o tamanho das bancadas”, afirma Cortez. No último bimestre do ano, após as eleições, haverá ainda um pequeno espaço para que o Congresso aprove medidas reformistas. Isso, é claro, se as urnas tiverem escolhido um candidato com esse perfil. De concreto, até agora, há apenas a expectativa de que os parlamentares não resumam o ano ao trinômio Carnaval, Copa e eleições.