Por qualquer métrica, o império empresarial liderado por Joesley e Wesley Batista não está em seu melhor momento. Desde que a delação premiada dos irmãos tornou-se pública, no dia 17 de março, o mercado vem punindo o grupo. A empresa mais visível, o frigorífico JBS, viu o preço de suas ações cair 22% entre o início da crise e o fim da manhã da sexta-feira 26. Isso fez evaporar quase R$ 6 bilhões de seu valor de mercado. Nas redes sociais começou a circular uma tímida campanha de boicote aos produtos do grupo, de aderência ainda imprevisível (leia reportagem aqui).

Henrique Meirelles: antes de assumir o Ministério da Fazenda, foi o mentor da estratégia do banco
Henrique Meirelles: antes de assumir o Ministério da Fazenda, foi o mentor da estratégia do banco (Crédito:Renato Stockler / Na Lata )

E, para piorar, na noite da quinta-feira 25, circulou a notícia de que alguns ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) poderiam rever os termos da delação premiada, considerada suave demais tanto para com os Batista quanto para com suas empresas. Nesse cenário, a melhor imagem para explicar a situação do Banco Original, instituição financeira ligada ao grupo, é a do copo meio cheio ou meio vazio. Um cético diria que é quase impossível para um banco, cujo principal ativo é a credibilidade, sobreviver incólume a tal provação.

Um otimista poderia argumentar que o Original não foi diretamente citado nas delações, tem caixa, é pouco alavancado, e sua atuação passa longe dos problemas que o grupo terá de enfrentar. No entanto, céticos e otimistas concordariam que o Original está prestes a enfrentar sua mais dura prova. Até o início de 2016, o Original era um ilustre desconhecido. Sua história, porém, remonta a 2007, quando o então frigorífico JBS criou um banco. Quatro anos depois, em 2011, o Banco JBS, focado no financiamento à pecuária de corte, comprou o Matone, tradicional instituição financeira gaúcha que havia se especializada em empréstimos consignados.

O negócio teve a bênção do Fundo Garantidor de Créditos (FGC), que emprestou R$ 1,85 bilhão ao banco por 15 anos, com garantia de ativos do JBS. A ideia inicial era apostar no crédito consignado, algo que não prosperou. “As margens são muito apertadas”, disse, na ocasião, um experiente executivo financeiro contratado pelos Batista para montar uma nova estratégia: o ex-banqueiro e atual ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Meirelles não tinha função executiva direta no banco.

Márcio Linares, CEO: desafio de aumentar a rentabilidade da plataforma digital (foto abaixo)
Márcio Linares, CEO: desafio de aumentar a rentabilidade da plataforma digital (foto abaixo) (Crédito:Silvia Zamboni/Valor)

No entanto, até março de 2016, pouco antes de assumir o Ministério da Fazenda, Meirelles dava expediente no prédio baixo e envidraçado à beira do Rio Tietê, em São Paulo, sede do Original. Ele foi o mentor da aposta multimilionária do banco no mundo das fintechs. No início do ano passado, meses antes dos Jogos Olímpicos do Rio, o Original investiu R$ 600 milhões lançar um banco 100% digital. Desse total, cerca de R$ 140 milhões foram gastos em uma suntuosa campanha publicitária, com a a participação de Usain Bolt, a lenda do atletismo, com três medalhas de ouro olímpicas nos 100 metros rasos.

Prometendo isenção de tarifas – que depois passaram a ser cobradas –, cartões de crédito top de linha e papel zero, o Original ganhou os holofotes. A implantação teve alguns problemas de tecnologia e atendimento, mas, segundo informações do banco, o Original conseguiu captar 100 mil clientes em oito meses, antes da meta prevista de um ano. Atualmente, são 230 mil clientes ativos que, ao lado de pecuaristas, representam o grosso das atividades do Original. No entanto, ao anunciar a conquista, Márcio Linares, presidente do banco, disse que o desafio, dali em diante, seria buscar a rentabilidade.

Essa questão ainda está em aberto no Original. Ao divulgar os resultados de 2016, o banco informou um lucro de R$ 43 milhões. Boa parte desse resultado veio de um evento não-recorrente, a venda da marca Original para os controladores do banco, por R$ 422 milhões. Considerando apenas o resultado operacional, as perdas foram de R$ 278 milhões no ano passado. Segundo o banco, elas decorrem de os investimentos ainda não estarem totalmente maduros. O futuro do Original permanece uma incógnita.

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Segundo os analistas, é uma instituição financeira sólida. O banco tem R$ 8,7 bilhões em ativos totais, e é pouco alavancado. Em um relatório, a agência de classificação de risco Fitch Ratings informou que os R$ 5,7 bilhões em empréstimos, pela posição de 31 de dezembro de 2016, eram de curto prazo, o que favorece o banco. Ainda segundo a agência, as captações com liquidez diária, que poderiam ser resgatadas imediatamente se os investidores resolvessem sair do banco, não chegam a 10%.

A quase totalidade dos empréstimos está coberta por aplicações em Certificados de Depósito Bancário (CDB), Letras de Crédito do Agronegócio (LCA) e Letras de Crédito Imobiliário (LCI). No entanto, para tornar sua estrutura rentável, o banco terá de conquistar mais clientes que paguem tarifas e, principalmente, conceder mais empréstimos, em um cenário adverso para o crédito devido à desaceleração da economia. Depois de crescer com a velocidade de Usain Bolt, o Original terá de demonstrar a resistência de um maratonista. Procurado, o banco não atendeu aos pedidos de entrevista.