Habitualmente cuidadoso com as palavras como o cargo requer, Ilan Goldfajn, que preside o Banco Central (BC) desde 9 de junho de 2016, não deixou margem a dúvidas no início da semana. Em uma entrevista na página de internet do próprio BC, Goldfajn foi direto ao ponto. “O que se discute hoje não é mais se a inflação está alta, ou como devemos conduzir a taxa básica de juros da economia, mas a velocidade e a extensão da redução da Selic”, disse ele. Nos pouco mais de 12 meses à frente do BC, Goldfajn patrocinou um corte de quatro pontos percentuais nos juros, de 14,25% para os atuais 10,25% ao ano, e, pelas contas do mercado, deve manter as taxas na descendente até 8,5% ao ano.

Tudo isso só é possível porque a inflação vem desabando. Nos 12 meses findos em maio, a alta acumulada do IPCA, índice que serve como parâmetro para as metas de inflação, caiu para 3,60%. Só para comparar, em junho de 2016, o IPCA acumulado em 12 meses era de 9,32%, quase o dobro dos 4,5% da meta fixada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), que deve fixar a nova meta de inflação ainda em junho (leia mais aqui). Benéfica para a economia, a queda dos índices de preço é devastadora para quem investiu em títulos de renda fixa, públicos ou privados, vinculados aos índices de preço.

Ilan Goldfajn, presidente do BC: “O que se discute hoje não é mais se a inflação está alta, ou como devemos conduzir a taxa básica de juros da economia, mas a velocidade e a extensão da redução da Selic” (Crédito:Wenderson Araujo)

Um bom exemplo são os 476 mil investidores ativos no Tesouro Direto, que vende títulos públicos a pessoas físicas. Campeãs de audiência, as Notas do Tesouro Nacional (NTN) de série B, que pagam juros mais a variação do IPCA, vêm apresentando fortes solavancos. No caso dos papéis mais longos, com vencimentos em 2045 ou em 2050, quem comprou em abril do ano passado chegou a embolsar ganhos superiores a 30%. Para entender o porquê de um ganho tão alto em um papel público, é preciso entender como funciona a remuneração desses títulos.

Antes de Goldfajn assumir a presidência do BC, os títulos mais longos pagavam IPCA – que estava perto de 9% – mais juros acima de 7% ao ano, ou 16% ao ano, sem risco. Na quinta-feira 22, esses papéis rendiam 5,5% ao ano, para uma inflação prevista de 3,8%. Um ganho de 9,3% ao ano. Esses quase sete pontos percentuais a menos na rentabilidade fazem muita diferença. O título comprado no ano passado vale mais. Seu preço é, portanto, maior, e quem o vendeu embolsou um belo lucro. “Essa é uma rentabilidade decorrente de ganho de capital que não vai se repetir”, diz o administrador Mauro Mattes, gerente de investimentos da corretora Concórdia. “Como as expectativas de inflação e de juros devem continuar caindo, o mais provável é que esses ganhos não aconteçam mais.”

Pedro Paulo Silveira, economista-chefe da Nova Futura Corretora: ““Ainda estamos falando de juros reais acima de 4% ao ano para títulos públicos, quando a maioria das economias desenvolvidas pratica taxas ao redor de zero”.” (Crédito:Gustavo Lourencao/ Valor/Folhapress)

O que fazer a partir de agora? Segundo os analistas consultados pela DINHEIRO, ainda há algumas boas oportunidades na renda fixa, mas a estratégia a ser adotada dependerá de uma variável fundamental para o investidor: o tempo. “A resposta à pergunta se os juros estão altos ou baixos depende, fundamentalmente, do prazo”, diz Pedro Paulo Silveira, economista-chefe da Nova Futura Corretora. Para Silveira, apesar da trajetória de queda, as taxas devem continuar elevadas no curto prazo. “Ainda estamos falando de juros reais acima de 4% ao ano para títulos públicos, quando a maioria das economias desenvolvidas pratica taxas ao redor de zero”, diz ele. Na opinião dos gestores, isso ainda proporciona bons ganhos (observe o quadro ao final da reportagem).

Uma conta simples é a que compara títulos públicos prefixados, que pagam uma remuneração pré-determinada e fixa até o vencimento. No caso do Tesouro Direto, as Letras do Tesouro Nacional (LTN) com vencimento no início de 2023, que pagam juros de 10,6% ao ano. Comparando com os 9,3% do papel ligado ao IPCA, é um ganho de mais de um ponto percentual por ano. “Essas taxas deverão diminuir, mas ainda vai demorar um pouco”, diz Silveira. Assim, o investidor que estiver pensando em uma aplicação de até três anos pode optar pela LTN. “Ainda é possível aproveitar a taxa alta”, diz Mattes.

Já quem tem menos pressa e está, por exemplo, se preparando para a aposentadoria, não perde se apostar nos juros de longo prazo. Segundo Mattes, os papéis vinculados ao IPCA com prazos mais longos, como os que vencem em 2045, por exemplo, ainda pagam um prêmio generoso acima dos índices de inflação. “O futuro envolve riscos desconhecidos tanto na economia doméstica quanto na internacional, e isso se reflete em um prêmio pago ao investidor, que é o aumento da rentabilidade”, diz ele. Sempre é bom lembrar que, quanto maior o prazo, maiores os solavancos, mas ainda é possível ganhar dinheiro apostando na inflação.