O conservadorismo nunca esteve tão presente na França como nessa disputa presidencial, que acontecerá entre 23 de abril e 7 de maio. A cada dia que passa, o Partido Socialista, maior força política do país, perde representatividade, um reflexo da crescente rejeição pelo atual líder François Hollande. Até então favorito a vencer as eleições, François Fillon, do partido Os Republicanos, perdeu apoio nas últimas semanas e dificilmente chegará ao pleito. A campanha do representante conservador afundou após Fillon ter sido ligado a escândalos de corrupção, além de ter sido acusado de criar cargos fantasmas para sua esposa entre 1998 e 2002. Essa reviravolta indica um novo cenário no pleito.

O candidato outsider de centro-direita, Emmanuel Macron, disputa a preferência do eleitor com a candidata de extrema-direita, Marine Le Pen. As últimas pesquisas de intenção de voto indicam que eles estão tecnicamente empatados. “Os escândalos da direita na França terão, sem dúvida, um impacto significativo sobre o resultado da próxima corrida presidencial”, diz o francês Tawfik Jelassi, professor da escola de negócios suíça IMD. “Se Le Pen vencer a eleição, o impacto será enorme no país, na Europa e no mundo. Seu mandato poderia traduzir-se no aumento do protecionismo.”

DIN1009-franca2A derrapada da direita com Fillon abriu espaço para os discursos ultraconservadores da advogada e deputada, filha do controverso político Jean-Marie Le Pen. Assim como aconteceu no Reino Unido, a candidata da Frente Nacional propõe um plebiscito para tirar a França da União Europeia, o chamado “Frexit”. Estimativas do Banco Central Francês indicam que a medida traria um custo de € 30 bilhões ao ano para a França, com aumento de desemprego e alta na inflação, além de fuga de investimento e capital. Os conservadores, porém, adorariam ter o seu “Frexit” para expulsar os muçulmanos não nativos do país, assim como criar regras mais rígidas de comércio, a fim de garantir os empregos.

O país, cujo PIB é avaliado em US$ 2,4 trilhões, cresceu 1,1% em 2016, abaixo das projeções de 1,4%. Enquanto isso, o desemprego bate na casa dos 10% e o público jovem tem um peso importante entre os desocupados: uma em cada quatro pessoas com menos de 25 anos não tem emprego. O resultado é a combinação perfeita para impulsionar os discursos xenófobos. “Desde a crise de 2008, a França perdeu muita competitividade, o desemprego ainda está muito alto e o setor público inflado”, diz Renato Galvão Flôres, diretor do Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional da FGV. Porém, uma guinada francesa à extrema direita colocaria em xeque a soberania do bloco comum europeu, além de colocar em risco a estabilidade da economia global.

A França, segunda maior economia da integração, atrás apenas da Alemanha, é peça chave para as decisões comerciais do bloco, embora a retomada de sua economia esteja mais lenta que o previsto. Isso atrasaria ainda mais o desenrolar do acordo entre a UE e o Mercosul, já que a França é o grande entrave, por conta dos produtos agrícolas.“Marine Le Pen causaria uma grande dor de cabeça para a UE, especialmente nessa altura do campeonato, em que o bloco tem que estar unido durante as negociações com o Reino Unido”, diz Maurits Van Rooijen, reitor da London School of Business and Finance (LSBF). “As organizações europeias não conseguem conter o ceticismo entre a população.” Se a economia da zona do euro ainda está fragilizada, marcada pelo processo de saída do Reino Unido, Le Pen pode provocar um estrago de proporções incalculáveis.