Uma frase atribuída ao físico alemão Albert Einstein diz que “temos o destino que merecemos. O nosso destino está de acordo com os nossos próprios méritos”. Na próxima quarta-feira 24, o ex-presidente Lula terá um encontro com o seu destino no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em Porto Alegre. Mais do que isso: ele saberá se o conjunto de fatos e provas de sua condenação a nove anos e seis meses de prisão, pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex do Guarujá, será suficiente para a segunda instância confirmar a sentença do juiz Sérgio Moro.

O julgamento terá início às 8h30 e deverá se estender até às 15 horas, segundo previsão da assessoria do tribunal. Excepcionalmente, os juízes autorizaram a transmissão ao vivo, por meio do canal do YouTube da Corte. “Houve tantos julgamentos importantes no Brasil nos últimos anos, mas nenhum está sendo tão paralisante e especulativo do que esse processo criminal que pode levar à inelegibilidade do ex-presidente Lula”, diz Carlos Roberto Siqueira Castro, conselheiro federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).

Lula sabe que dificilmente conseguirá reverter a decisão de Moro, mesmo com sua defesa insistindo na tese de que o tríplex tem a OAS como proprietária. Esse é um argumento frágil. Moro reconheceu na sentença que a titularidade do imóvel é da empreiteira e o Ministério Público Federal apontou que essa era uma forma de manter a propriedade oculta, mas que as reformas foram realizadas a pedido da família de Lula como recompensa pelos contratos que a OAS realizou com a Petrobras. Além da fragilidade de sua defesa, Lula estará frente a frente com a 8ª Turma, uma das mais especializadas em direito penal e considerada mais dura que Moro.

Paredão: os desembargadores Leandro Paulsen, João Pedro Gebran Neto e Victor Luiz Lau (da esq. à dir.) serão os responsáveis pela sentença de Lula na segunda instância no caso do tríplex do Guarujá (Crédito:Divulgação)

José Dirceu, um dos líderes petistas, teve sua pena aumentada de 20 anos para 30 anos por decisão da equipe formada pelo presidente Leandro Paulsen e os desembargadores Victor Luiz dos Santos Lau e João Pedro Gebran Neto, que é o relator dos processos da Lava Jato e dará início à seção com a leitura do seu relatório. Dirceu, mesmo condenado, tem sido um dos principais incitadores para que a militância petista esteja presente em Porto Alegre e faça pressão sobre os juízes. Até aqui, a tática de guerrilha não tem surtido efeito. Na semana passada, Gebran Neto negou o pedido feito por Lula para que fosse ouvido novamente antes do julgamento de apelação. “Se o Lula for condenado, ele é o perseguido político. Se for absolvido, fortalece o discurso do golpe contra o PT”, diz Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating. “Em qualquer cenário, em termos políticos, vai ficar cada dia mais difícil para o PT vencer as eleições.”

Os advogados de defesa de Lula vão lutar para que a decisão não seja unânime, o que diminui as possibilidades de recursos. Mas, mesmo com uma derrota por 2 votos a 1, Lula sai menor do que entrou. Para sustentar seu ainda expressivo desempenho nas pesquisas eleitorias, o ex-presidente tem buscado politizar o julgamento e pressionar os desembargadores afirmando que “não quer entrar para a história como um inocente condenado”. Ele tem subido em palanques para dizer que não o querem de volta à presidência.

Lula tem sido Lula e buscado criar a imagem de mártir. Na semana passada, ele afirmou que um parente do presidente do TRF-4, Carlos Eduardo Thompson Flores, teria matado Antônio Conselheiro, líder da revolta de Canudos. “Talvez ele ache que eu seja cidadão de Canudos”, declarou. Para quem desconhece a história, é uma ótima imagem. Mas o parente do presidente do TRF-4, o general Tomás Thompson, morreu em combate três meses antes de Conselheiro. Lula, claro, não quer a verdade histórica.

Ao contrário do que espalha a claque petista, a decisão do TRF-4 será técnica e bastante detalhada. É possível que os desembargadores adotem o conservadorismo e, em caso de condenação, Lula só seja preso após a análise dos recursos e a publicação da decisão final. De qualquer maneira, Lula estará enquadrado na Lei da Ficha Limpa e será, praticamente, carta fora do baralho na corrida presidencial. Mas o PT quer manter Lula vivo o máximo que puder, para transferir os votos em Lula para o Plano B ou C.

Novo encontro: o juiz federal Sérgio Moro começará a ouvir as testemunhas no processo em que Lula é réu pela propriedade do sítio de Atibaia (Crédito:Divulgação)

Os investidores, principalmente os estrangeiros, não contam com o nome do ex-presidente nas urnas, embora saibam que ele será um personagem importante dessa campanha (leia mais aqui). E o risco-Lula depende do teor da nova Carta ao Povo, que o PT promete divulgar após o julgamento do TRF-4 (leia mais aqui). “Esse julgamento é o grande divisor de águas da eleição, que vai dizer para o PT se o Lula pode ou não ser candidato”, afirma Cristiano Noronha, sócio da consultoria Arko Advice. “Ainda não foi medido o real impacto de uma eventual condenação de Lula nos índices de intenção de voto.”

O ex-presidente tem esgotado sua energia no caso do tríplex, mas sua batalha judicial está só no começo. Entre os dias 5 e 7 de fevereiro, Moro ouve as testemunhas do caso do sítio de Atibaia. O processo está em fase final e a expectativa é que a sentença saia ainda em fevereiro, com nova condenação de Lula. Vai chegar um momento em que até Lula precisará assumir o destino que merece.