O comunicado da Panini, maior editora nacional de quadrinhos e álbuns auto-colantes, de que iniciaria, a partir do dia 1º de agosto, uma operação própria de distribuição de seus produtos, surpreendeu o mercado editorial brasileiro, ao mesmo tempo em que introduz um novo componente no bilionário mercado logístico do setor, até agora dominado pela gigante Dinap, do grupo Abril.

A decisão da Panini, subsidiária do grupo italiano Panini, começou a ser gestada no início de 2017, sob a batuta do CEO José Eduardo Severo Martins, há 21 anos no comando dos negócios no Brasil.”A Panini está diversificando seus canais de venda e ampliando sua atuação no mercado de varejo e precisava ter maior controle da distribuição dos seus produtos”, afirma. Torcedor fanático do São Paulo, que ultimamente não vem sendo exatamente uma fonte de alegria, Martins lembra que a entrega direta aos distribuidores regionais não é uma novidade no grupo: há alguns anos o modelo  vem sendo empregado  por filiais da Panini, na Espanha e Alemanha. “Nesses mercados verificamos uma performance maior nas vendas quando a entrega dos produtos foi realizadas diretamente pela Panini”, diz.

No caso brasileiro, Martins se ampara no cobiçado portfólio de títulos da Panini, como os gibis da Turma da Mônica, os quadrinhos mais vendidos do País, os super-heróis da Marvel e DC Comics, Vertigo e mangás, além de álbuns de figurinhas e coleções de cards de esporte e entretenimento. “No Brasil, possuímos volume suficiente para justificar a adoção de um processo de entrega direta dos produtos aos distribuidores regionais de bancas”, diz Martins.

O modelo prevê a organização interna da distribuição dos seus títulos — da produção, controle do estoque até a negociação dos contratos com as distribuidoras. Está descartada, porém, a distribuição de produtos de terceiros — a Panini não concorrerá com a antiga fornecedora, a Dinap, por exemplo, e nem cogita fazer pesados investimentos em frota própria. “A Panini não criou uma distribuidora e não está oferecendo serviços de distribuição ao mercado”, sustenta. Entre as distribuidoras regionais, já estão definidas a Infoglobo, no Rio de Janeiro, e a AR, na capital paulista.

Além de possibilitar um contato mais corpo-a-corpo com seus consumidores, Martins prevê, a médio prazo, possíveis ganhos em termos de custos, com a eliminação de um degrau na estrutura de distribuição. “Embora a prioridade no momento seja melhorar a cobertura e o trabalho de promoção e vendas nos pontos de venda, certamente iremos buscar eficiência e redução de custos de logística e distribuição.”

O desembarque da Panini representa, sem dúvida, um revés para a Dinap, que desde 2006 detinha o  monopólio logístico do setor. Naquele ano, como se recorda, a Dinap, que à época detinha uma fatia de 70% do mercado, adquiriu a tradicional Fernando Chináglia, dona dos restantes 30%.

A operação, chegou a ser questionada por entidades como o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), mas acabou recebendo, a despeito do seu gigantismo, as bençãos do Conselho Administrativo de Direito Econômico, para desconforto de muitas empresas concorrentes, como Globo e Três, antigos clientes da Chináglia, obrigadas a confiar a distribuição de suas publicações para uma subsidiária do então maior grupo editorial da América Latina. Detalhe: poucos anos antes, o órgão de regulação da concorrência vetara a compra da Garoto pela Nestlé, por conta de um eventual monopólio no segmento de coberturas de chocolates líquidos.

Onze anos depois, a Abril vive uma das mais agudas crises de sua história, obrigada a submeter-se a um sério regime de enxugamento, desfazendo-se de ativos, em praticamente todas as suas áreas de atuação. Em meio às dificuldades, a Dinap aparecia como uma das mais promissoras fontes de receitas para bancar as operações do grupo e enfrentar os compromissos gerados por seu pesado endividamento. Nesse quadro, a quebra do monopólio, não é precisamente uma boa notícia.