Assim que subiu ao palco de um velho teatro em San José, no coração do Vale do Silício, na terça-feira 18, o fundador do Facebook, Mark Zuckerberg, vestia seu uniforme habitual, uma calça jeans e uma camiseta cinza. Com se fosse um pop star, ele foi aclamado pela multidão do F8, um evento anual da companhia dedicado aos desenvolvedores. Nos 30 minutos seguintes, o jovem CEO de 32 anos fez uma apresentação que deixou clara sua visão de como ele acredita que evoluirá a sua rede social. E uma tecnologia ganhou todos os holofotes: a realidade aumentada, a mesma interface por trás do popular jogo para smartphones Pokémon Go, um mercado que pode chegar a US$ 85 bilhões em 2025. “A câmera é a primeira plataforma de massa para a realidade aumentada”, disse Zuckerberg. “Por isso, colocamos câmeras em todos os lugares.”

Brincadeira: O Snapchat, de Evan Spiegel (à esqeurda), lançou filtros de realidade aumentada (à direita) no mesmo dia em que o Facebook anunciou sua nova plataforma. A briga entre as duas redes sociais se acirra cada vez mais
Brincadeira: O Snapchat, de Evan Spiegel (à esqeurda), lançou filtros de realidade aumentada (à direita) no mesmo dia em que o Facebook anunciou sua nova plataforma. A briga entre as duas redes sociais se acirra cada vez mais

A frase de Zuckerberg não deixa dúvidas sobre quem ele está mirando quando atribuiu importância para as câmeras dos smartphones: o Snapchat. Desde uma fracassada tentativa de compra da startup fundada pelo empreendedor americano Evan Spiegel, em 2013, o fundador do Facebook lançou-se numa cruzada para neutralizar o aplicativo que tem um fantasma como símbolo e é muito popular entre os jovens. Por trás dessa caçada implacável, vale quase tudo. Nos últimos anos, o Facebook tem sistematicamente copiado os recursos do Snapchat, como a função Stories, no qual a imagem ou o vídeo desaparecem depois de um determinado tempo.

Coincidentemente, Zuckerberg anunciou sua plataforma de realidade aumentada no mesmo dia em que o Snapchat reformulou seus populares filtros. O aplicativo de Spiegel permite agora adicionar uma camada de realidade aumentada em tempo real às fotos ou vídeos. Com a função batizada de World Lenses, os gráficos podem ser misturadas na cena e ficam ancoradas na posição escolhida pelo usuário. DIN1015-face3Não é muito diferente do que Zuckerberg mostrou ao time de desenvolvedores que assistia à sua palestra: dezenas de efeitos, como máscaras, molduras e filtros interativos para aplicar em fotos e vídeos. “As próximas gerações estão sugerindo que o Facebook está ficando velho”, diz Rob Enderle, analista da Enderle Group. “O Snapchat está se transformando em um risco cada vez maior para o Facebook.”

A estratégia de Zuckerberg, pelo menos, por enquanto, parece estar dando certo. Lançado em agosto do ano passado, o Instagram Stories ultrapassou os 200 milhões de pessoas que o utilizam diariamente. O Snapchat conta com 160 milhões. Na visão de Enderle, o Facebook não quer se transformar no próximo MySpace, uma das primeiras redes sociais da história e que sucumbiu devido ao sucesso, exatamente, da plataforma criada por Zuckerberg nos dormitórios de Universidade Harvard, em 2004. Por outro lado, o Snapchat terá de provar que não é um novo Twitter, uma referência à rede do pássaro azul que não conseguiu ainda dar lucro.

Na semana passada, Spiegel contribuiu para a primeira crise de relações públicas. “Não quero expandir para países pobres como a Índia e a Espanha”, teria dito o empreendedor, segundo Anthony Pompliano, um ex-funcionário do Facebook, que trabalhou três meses na startup. O Snap negou a frase, dizendo que ela é “ridícula”. De qualquer maneira, o estrago estava feito e usuários da Índia começaram a boicotar o aplicativo do fantasminha. Ao que tudo indica, a disputa Zuckerberg e Spiegel está apenas começando.